Defensoria, restabelecendo a verdade

Em face do artigo publicado em data de 31/10/06, sob o título “Defensoria Pública – Crise Institucional! Será?”, algumas considerações devem ser feitas.

Tentou-se plantar a ignóbil idéia de que se trata de uma disputa entre o bem e o mal, dividindo a Defensoria Pública do Estado em duas categorias, o que é lamentável, isto porque, os opositores ao projeto sempre consideraram os Defensores Públicos como cidadãos do bem, independentemente da classe funcional a que pertençam, ao contrário daquela articulista.

Ademais, não se discute a competência administrativa dos Defensores Públicos do Estado, até mesmo porque, para isso ter-se-ia que analisar, inclusive, a capacidade administrativa de quem já ocupou a chefia da Instituição, o que não se faz por inoportuno e por questão de ética.

A articulista não abordou a patente inconstitucionalidade do Projeto de Emenda Constitucional, que trata da escolha do Defensor Público-Geral do Estado, certamente por falecer-lhe argumentos razoáveis, no entanto, cumpre-nos discutir a matéria.

A Constituição do Estado, com a emenda nº 29/05 editada há menos de um ano e após a Reforma do Judiciário, dispõe que a Defensoria Pública tem por chefe o Defensor Público-Geral, nomeado pelo Governador do Estado dentre os integrantes do último grau da carreira, escolhido em lista tríplice elaborada pela votação de todos os Defensores Públicos.

Essa exigência atende aos princípios da hierarquia administrativa e funcional, bem assim da progressão gradativa do membro da Defensoria Pública que se inicia no cargo de Defensor Público Substituto para culminar no de Defensor Público de Segunda Instância.

O argumento de que não há hierarquia funcional entre os membros da Defensoria Pública é equivocado.

A Constituição do Estado prevê como órgãos de administração superior da Defensoria Pública: “a) Defensoria Pública-Geral do Estado; b) Primeira Subdefensoria Pública-Geral; c) Segunda Subdefensoria Pública-Geral; d) Conselho Superior da Defensoria Pública; e) Corregedoria-Geral da Defensoria Pública; f) Subcorregedoria-Geral da Defensoria Pública; g) Colégio de Defensores Públicos de 2ª Instância”.

Atendendo aos princípios da hierarquia administrativa e funcional e da progressão gradativa do membro da Defensoria Pública, as normas de regência determinaram que todos os ocupantes de cargos dos órgãos de administração superior, sem exceção, sejam integrantes do último grau da carreira.

O projeto, além de violar o princípio da hierarquia administrativa e funcional e a progressão gradativa do membro da Defensoria Pública, inverte toda a ordem lógica da estrutura organizacional da Instituição e fere o princípio constitucional da razoabilidade.

A título de ilustração, cite-se os exemplos: Na hipótese em que seja conduzido ao cargo de Defensor Público-Geral do Estado um Defensor Público de Primeira Entrância, o que se admite no projeto, e um Defensor Público de quaisquer das classes da carreira estiver sendo processado pela prática de infração disciplinar. A Comissão processante obrigatoriamente deve ser presidida pelo Corregedor-Geral (último grau da carreira) e integrada por membros de igual ou superior classe do processado.

Ora, se para o processo disciplinar é necessário que os integrantes da comissão sejam de classe superior ou no mínimo igual ao processado, como admitir-se que aquele que o julgará seja de classe inferior?

Como mais um equívoco da articulista quanto à inexistência de hierarquia funcional, é de se destacar que os Defensores Públicos de Segunda Instância (último grau da carreira) possuem sim a atribuição de fiscalização sobre os demais, como determina a Lei Complementar nº 111/05.

E mais, admitindo-se aprovado o projeto e vindo a ocupar o cargo de Defensor Público-Geral do Estado um membro da Instituição que não seja da classe final, poderá ele concorrer à promoção por merecimento para a classe imediatamente superior a que pertença.

As leis orgânicas determinam que as promoções pelo critério de merecimento se darão por escolha do Defensor Público-Geral dentre os que integrarem a lista tríplice votada pelo Conselho Superior, que, para tanto, analisará a vida funcional do candidato, incluindo as inspeções elaboradas pelos Defensores Públicos de Segunda Instância. Assim, o Conselho Superior poderá eleger três nomes que reúnam mais méritos do que o próprio Defensor Público-Geral na qualidade de simples candidato, acarretando a impossibilidade de sua promoção, o que trará a este constrangimento, retirando-lhe legitimidade para a direção da Instituição.

Na ótica daquela articulista, é de se admitir que um Juiz de Direito de 1ª Entrância (início da carreira) possa ser nomeado Presidente do Tribunal de Justiça, o que se afigura, sem entrar aqui na análise da competência profissional, um absurdo.

Vê-se que o projeto é indiscutivelmente inadequado para a estrutura administrativa e funcional da Defensoria Pública e que contraria os princípios da legalidade, moralidade, eficiência e razoabilidade, além da hierarquia administrativa e funcional e da progressão gradativa de seus membros e, em especial a autonomia outorgada às Defensorias Públicas dos Estados na Reforma do Judiciário.

Finalmente, causa surpresa a afirmação de que o projeto é democrático, já que não foi debatido na classe como sempre aconteceu com relação aos demais. E mais, o seu encaminhamento à Assembléia Legislativa, sem a ciência da Administração Superior da Defensoria Pública, traduz total desrespeito à chefia da Instituição e aos Defensores Públicos, bem assim pouco apego aos princípios norteadores do Estado Democrático de Direito.

Darcy Terra Fernandes, Defensora Pública-Geral do Estado de MS e mais 34 Defensores Públicos

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