A dívida atual no pagamento de precatórios é de cerca de R$ 60 bilhões. A inadimplência não é novidade, e os Poderes Legislativo e Judiciário ainda não encontraram uma maneira de obrigar os Estados e municípios a pagarem seus credores, o que faz crescer esta dívida.
Os credores dispõem de três instrumentos para “acelerar” o recebimento desses recursos e amenizar o famoso ditado: “Devo, não nego. Pago quando puder”. São eles: negociação do precatório para uso em compensação tributária; aplicação de multa de 20% sobre o valor do precatório em atraso por descumprimento de decisão judicial; e a possibilidade de seqüestro dos valores decorrentes de precatórios nos casos em que o favorecido demonstra grave estado de saúde.
A multa por descumprimento de decisão judicial foi criada pela Lei nº 10.358, de 2001, que alterou o CPC (Código de Processo Civil) e fixou o valor de 20% como percentual máximo.
Várias decisões, em diversos Estados, já foram proferidas utilizando a aplicação da multa e a possibilidade de seqüestro de bens quando comprovada doença grave. Porém são decisões isoladas e muitas vezes os critérios utilizados pelo juiz são subjetivos. Por exemplo, o critério “doença grave” não é o mesmo utilizado para isenção de imposto de renda e acaba dependendo de interpretação caso a caso.
Com relação à multa, tal tese vinha sendo acolhida pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul e ratificada pelo Superior Tribunal de Justiça, não tendo sido aplicada ainda em São Paulo, que aceita os pedidos de seqüestro apenas nos casos em que fica comprovada a quebra da ordem cronológica dos precatórios.
Em São Paulo, apenas a negociação do precatório para uso em compensação tributária, que depende apenas da vontade das partes, se mostra como uma hipótese absolutamente possível e eficaz.
Agora, o próprio tribunal gaúcho dá sinais de recuo. No último dia 29 de dezembro, a 2ª Câmara Cível do TJ-RS publicou uma decisão confirmando nova posição do tribunal em favor de valores mais baixos.
Aplicando o princípio do “voto médio”, a câmara somou um voto em favor da multa de 20%, um contrário à multa e um pelo valor de 1% e acabou concluindo pelo menor valor. O Judiciário não pode se render ao lobby dos entes públicos. Deve fazer valer a multa máxima, pois este parece ser mecanismo que “preocupa” os governantes.
De modo geral, vêm crescendo e se proliferando as decisões que aplicam sanções e que visam compelir Estados e municípios a pagarem os precatórios, formando, assim, jurisprudência. Embora a jurisprudência não vincule os julgadores em suas decisões, em decorrência do princípio do “livre convencimento do juiz”, acaba por corroborar as teses pelas quais os advogados vêm há anos lutando, com o objetivo de fixar um entendimento pacífico dentro do Judiciário.
Segundo o STF (Supremo Tribunal Federal), Estados e Distrito Federal devem R$ 42 bilhões em precatórios. Do total, R$ 23 bilhões são precatórios alimentares, que envolvem salários, proventos e pensões. Os outros R$ 19 bilhões são precatórios não-alimentares, decorrentes, por exemplo, de desapropriação de terras e imóveis. Os débitos totais de São Paulo e Rio, por exemplo, são de, respectivamente, R$ 12,2 bilhões e R$ 1,3 bilhão. O Estado do Rio Grande do Sul deve R$ 2,6 bilhões.
Porém a única maneira de sanear este “calote público” seria uma intervenção dos Poderes juntos aos inadimplentes. A falta de punição aos governantes é a fonte do crescimento da dívida. Que o Judiciário continue ao lado do credor.
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Daniela Barreiro Barbosa é advogada da área de direito público da Innocenti Advogados Associados (daniela.barbosa@innocenti.com.br)