O assunto é antigo, mas continua em baila, ocasionando grande parte de impugnações, recursos administrativos e mandados de segurança, efetuados pelos licitantes que questionam as exigências de habilitação e qualificação dos interessados previstas nos editais, onde não cumpridas as referidas exigências estará o licitante alijado do certame.
Chega-se à conclusão que muitas das exigências são inseridas visando garantir a melhor contratação para o Poder Público e decorrem na maioria das vezes de falta de conhecimento das normas legais ou possui interpretação equivocada.
A Constituição Federal no artigo 5º, inciso XIII e 170 parágrafo único, determina que o exercício profissional via de regra é livre, todavia existem profissões que são regulamentadas por lei, como caso da advocacia, arquitetura etc.
Portanto, para estas atividades, as fiscalizações são efetuadas pelas entidades de classe, ou seja, conselhos fiscalizadores das profissões, onde as referidas entidades no poder de polícia, dão concretude às disposições legais, com inscrição dos profissionais, registro das empresas do ramo em seus quadros.
Verificamos que as empresas ou profissionais cuja atividade se encontra destituída de normatização em lei própria, não é legítimo incluir a exigência de registro ou inscrição nos editais de licitação.
Já é cediço pelo colendo Superior Tribunal de Justiça, que o registro ou inscrição devem ser efetuados no conselho competente para fiscalização da atividade básica ou preponderante desenvolvida pela empresa ou profissional.
Podemos observar que nos casos empresas prestadoras de serviços na área de saúde que já possuem credenciamento junto ao CRM, estão sendo coagidas para participarem de processo licitatório de registro no CRA, o qual se torna ilegal devido não ser atividade preponderante da empresa.
Não cabe aos órgãos licitatórios definir em qual conselho profissional deverão estar registrados ou inscritos os licitantes.
Para que a administração pública venha se resguardar de qualquer impugnação, onde não venha incidir uma licitação deserta, deverá antes de instaurar o procedimento efetuar um pesquisa junto os conselhos profissionais e aos licitantes a fim de identificar em qual entidade fiscalizadora deverão estar inscritos ou registrados os interessados, ou deverá inserir no edital exigência genérica como “registro ou inscrição na entidade profissional competente do licitante”.
Convém assinalar, que a pessoa jurídica está sujeita a inscrição em um único conselho profissional, ou seja, aquele que tutela a profissão a que corresponde sua atividade básica ou prestação de serviço a terceiros, ainda que como atividade-meio, pratique atividades próprias de outras profissões. A manutenção de responsável técnico por atividade-meio não determina inscrição da pessoa jurídica no conselho a que está submetido esse profissional.
Se assim não fosse, chegaríamos ao absurdo de empresas de grande porte terem que manter registro em todos os conselhos de fiscalização profissional, pelo fato de empregarem médicos, advogados, engenheiros etc, atividades meramente auxiliares de seu objetivo social.
Outro ponto que merece destaque é a impossibilidade de se exigir que o licitante esteja inscrito no conselho profissional do local em que se realizará a licitação ou local em que será executado o contrato.
Tal ilicitude infringe o princípio da isonomia previsto na constituição brasileira, em virtude de que a qualquer empresa ou profissional brasileiro deve ser permitido participar em regime de igualdade, de procedimentos licitatórios realizados em todo o território nacional.
Também a respectiva restrição ao caráter competitivo infringe o instituído na Lei 8.666/93 no seu artigo 3º, inciso I do parágrafo 1º, efetuar tal exigência é uma discriminação velada ou indireta.
Outra ilegalidade ainda pior diz respeito na apresentação de comprovante de quitação junto à entidade fiscalizadora, não existe qualquer previsão legal para tal imposição, pois as referidas cobranças competem aos conselhos fiscalizadores e não aos órgãos públicos que efetuam o certame.
As entidades de classe para efetuar as respectivas cobranças valem-se de procedimentos administrativos e judiciais cabíveis.
Pelo exposto, colocar exigências impertinentes nos processos licitatórios é uma forma de criar embaraços aos licitantes, sendo um verdadeiro estrabismo público, que as autoridades superiores, principalmente o Judiciário precisam corrigir, para que os burocratas não persistam nas suas distorções rotineiras de complicar aquilo que a legislação já simplificou.
As licitações devem levar em consideração a capacitação dos licitantes e julgamento criterioso das propostas e não exigências descabidas e desnecessárias que nada irá alterar o objeto licitado.
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Gislaine Barbosa de Toledo é advogada do Silveira&Quércia Advogados Associados