A necessidade de dinamização do processo produtivo há décadas tem ocasionado o movimento da terceirização de serviços no mundo todo. Por trás dessa tendência, vislumbra-se a produtividade e dinamização da atividade empresarial.
Assim, o movimento de terceirização nas empresas tem como principal foco o desenvolvimento e a produtividade do negócio empresarial, viabilizando que a atenção negocial se dê especialmente em relação ao objeto social da empresa.
Em que pese tratar-se de experiência internacionalmente vivenciada, advinda não de aspectos jurídicos, mas de critérios negociais de administração, o Brasil apresenta legislação esparsa e jurisprudência restritiva a respeito do tema.
Há anos, o entendimento consolidado do Tribunal Superior do Trabalho é dado no sentido restritivo, conforme Súmula no 331, que estabelece limites à terceirização lícita, apontando ilícita a contratação de prestadores de serviços para desenvolvimento da atividade econômica final da empresa, vez que esta forma de contratação visaria dissimular a real contratação empregatícia, fundamentado no risco da atividade econômica assumido pelo empregador.
SÚMULA 331. CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. LEGALIDADE
I — A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário.
II — A contratação irregular de trabalhador, mediante empresa interposta, não gera vínculo de emprego com os órgãos da administração pública direta, indireta ou fundacional (artigo 37, II, da Constituição Federal/1988).
III — Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de vigilância (Lei 7.102, de 20 de junho de 1983) e de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados ligados a atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta.
IV — O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços, quanto àquelas obrigações, inclusive quanto aos órgãos da administração direta, das autarquias, das fundações públicas, das empresas públicas e das sociedades de economia mista, desde que hajam participado da relação processual e constem também do título executivo judicial (artigo 71 da Lei 8.666, de 21 de junho de 1993).
O inciso I da súmula em relevo indica como regra geral a ilicitude de contratação por empresa interposta, entretanto, ressalva a contratação de trabalho temporário, nos parâmetros da legislação específica.
Nota-se, entretanto, que a ilicitude está diretamente relacionada com a intenção do empregador em frustrar a aplicação da legislação trabalhista.
A mesma súmula expõe em seu inciso II sobre as conseqüências da terceirização irregular nas entidades públicas, fazendo diferenciação quanto à iniciativa privada, consubstanciada na legislação própria da Administração Pública.
Há no entendimento consolidado do Tribunal Superior do Trabalho exceção quanto à terceirização de serviços especificados, sendo os de vigilância, conservação e limpeza, pacificamente aceitos para esta forma de subcontratação. É aceita, inclusive, a terceirização “de serviços especializados ligados a atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta”, e é justamente neste ponto que reside a maior dúvida interpretativa dos empresários e administradores quanto às possibilidades de terceirização tidas como lícitas pelo Judiciário.
O que seriam os serviços especializados ligados a atividade-meio do tomador?
A principio devem estar excluídos quaisquer serviços relacionados diretamente com o objetivo principal da atividade empresarial. Um exemplo costumeiro é o da impossibilidade de terceirização da administração empresarial.
Outra forma de interpretação é questionar, juntamente com a análise do objeto principal, se é atividade essencial para a realização da atividade econômica da empresa.
Exemplifica-se: dependendo da atividade da empresa e da finalidade do serviço, a realização de cobrança pode ser acessória ou parte da administração interna. Quando tratamos de cobrança de cheques devolvidos, é possível imaginar que provavelmente estamos tratando de atividade acessória.
Imprescindível, entretanto, que as hipóteses e possibilidades sejam sempre avaliadas caso a caso.
Além das diretrizes de licitude estabelecidas pelo entendimento jurisprudencial consolidado, deverão ser analisados os critérios da relação empregatícia, ou seja, havendo pessoalidade, habitualidade e subordinação, entre a mão-de-obra alocada na prestação de serviços e a empresa tomadora de serviços, restará configurado o real vínculo empregatício, descaracterizando-se a terceirização em razão de fraude.
Necessário se faz esclarecer que a empresa tomadora de serviços é sempre subsidiariamente responsável pelo inadimplemento das obrigações trabalhistas da empresa prestadora de serviços, em relação aos trabalhadores que nela estiverem alocados.
Entende-se que a empresa tomadora de serviços tem o dever de contratar empresa idônea e, ainda, fiscalizar o adimplemento das obrigações trabalhistas da prestadora de serviços. Garantido, porém, o direito de ingressar com ação regressiva à empresa tomadora.
A intenção de redução de custos e otimização produtiva, através da terceirização de serviços, deve cercar-se de medidas preventivas adequadas. Com esse intuito, indica-se a empresa tomadora de serviços, inclusive, que inclua no contrato de prestação de serviços a regular fiscalização de adimplemento das obrigações trabalhistas e previdenciárias da empresa prestadora de serviços em relação a todos os seus empregados que estiverem envolvidos no objeto do contrato.
Especialmente no cenário atual brasileiro, em que se verifica uma forte corrente legislativa contrária a tendência de mercado, é preciso redobrar a atenção quando se tratar de terceirização e interpretação do entendimento jurisprudencial restritivo dado pelo Tribunal Superior do Trabalho.
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Lívia Ribeiro Savastano de Souza é advogada especialista na área trabalhista e ambiental. Membro da Comissão de Estudos em Direito e Processo do Trabalho da OAB-SP desde 2005, é formada e especializada pela PUC-SP