É inegável, atualmente, a ingerência da tecnologia da informação no cotidiano e nos negócios das pessoas. Surpreendemo-nos com as repentinas inovações e mutações proporcionadas pela revolução cibernética com reflexos diretos nas relações sociais e jurídicas envolvendo desde usuários da Internet a grandes corporações, exigindo de seus protagonistas uma nova postura em relação a conceitos até então inimagináveis.
Neste diapasão, para elucidar tal assertiva, impossível não falarmos do “Second Life”, pois enquanto ainda não se concebia um conceito suficientemente claro de web 2.0, bem como as modalidades de interação no ciberespaço se limitavam aos tradicionais chats, e-mails e comunicadores, uma autêntica “segunda vida” é concebida no denominado “Second Life”, com o propósito de remodelar o conceito de relações sociais e comerciais em massa.
Estima-se que mais de 5 milhões de personagens, denominados “avatares”, já estejam povoando o mundo eletrônico e se relacionando de alguma forma.
Dado o potencial do ambiente, totalmente 3d, com interatividade plena, incluindo possibilidade de upload de objetos, é mais que explícito o vertiginoso crescimento de empresas reestruturando suas negociações eletrônicas para o padrão “Second Life”, que, sem anfibologias, fomenta, como nenhuma outra ferramenta, o v-business e o marketing eletrônico.
E é neste cenário que chamamos as atenções para uma reflexão jurídica acerca do “Second Life”. Eis que, apesar de se tratar de uma sociedade virtual, é inegável que sua economia é real e que envolve pesados investimentos de empresas e pessoas e, por esta razão, deve-se conjecturar também os conflitos de interesses entre residentes e terceiros.
Neste contexto, deve-se esclarecer que não estamos lidando com um simples jogo ou comunidade, mas com uma ferramenta virtual, onde pessoas se relacionam, relacionamentos estes que geram direitos e obrigações no mundo real, reflexos que deverão ser a tônica dos futuros debates, notoriamente sobre a interferência estatal na vida dos cidadãos digtiais, bem como em relação à produção probatória de fatos jurídicos ocorridos no “Second Life”.
De fato, é fundamental o papel das pessoas físicas que atuam no mundo virtual, através dos seus “avatares”, pois estas assumem responsabilidades com a aceitação dos termos de uso dos serviços prestados e, portanto, serão responsabilizadas por seus atos que, obviamente, terão efeitos no mundo real.
Em síntese, o nível de estabilidade e risco do “Second Life” será, sobretudo, mensurado em relação à postura de seus residentes, condicionada através dos termos de uso dos serviços, decorrendo daí a imprescindível responsabilidade de cada habitante para com a manutenção do sistema, sem agir de forma indevida, denunciando infrações e colaborando com as autoridades constituídas, eis que a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça de direito, esteja ele em que mundo for.
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*Renato Opice Blum é advogado e economista, sócio do escritório Opice Blum Advogados Associados, em São Paulo. Professor coordenador de pós-graduação em direito eletrônico e professor na pós-graduação da Fundação Getúlio Vargas (FGV-RJ/SP), PUC, UNIFECAP, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Universidade Católica de Petrópolis, Universidade Anhembi Morumbi (MBI), BB&G (Faculdades Florianópolis), IBTA/IBMEC (Instituto Brasileiro de Tecnologia Avançada), Escola Superior da Advocacia. Pós-graduado em direito processual civil pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, é presidente do Conselho do Comércio Eletrônico da Federação do Comércio do Estado de São Paulo, árbitro da FGV e da Câmara de Mediação e Arbitragem de São Paulo (FIESP). Além disso é autor e colaborador das obras “Direito eletrônico: a internet e os tribunais”, “Novo Código Civil: questões controvertidas”, “Conflitos sobre nomes de domínios”, “Direito & internet: aspectos jurídicos relevantes”, “Direito da informática: temas polêmicos”, dentre outras.
*Rony Vainzof é advogado em São Paulo. Graduado pela Faculdade de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie, é especialista em direito eletrônico pelo Instituto Paulista de Educação Continuada (IPEC) e pós-graduando em direito processo penal na Universidade Presbiteriana Mackenzie. Vice-coordenador do Comitê de Legislação e membro do Comitê Anti-Fraude da Câmara Brasileira de Comércio Eletrônico é ainda membro do Conselho de Comércio Eletrônico da Federação de Comércio-SP e professor do Instituto Paulista de Educação Continuada, palestrante convidado pela Lex Editora S.A. e Academia de Desenvolvimento Profissional e Organizacional (ADPO)