Contrato de locação e a responsabilidade do fiador

Questão de suma importância constantemente presente nos atuais debates jurídicos gira em torno da exoneração do fiador de contrato de locação.

Recente decisão do Supremo Tribunal de Justiça (AgRg no Recurso Especial 833.492 —SP, julgado em 12 de setembro de 2006— Diário de Justiça, 9 de outubro de 2006, p. 354) afirma que o fiador não pode ser responsabilizado pela locação até a efetiva entrega das chaves, mesmo que haja cláusula contratual expressa nesse sentido.

Nessa esteira a ministra Laurita Vaz concluiu que “(…) a prorrogação do pacto locatício por tempo indeterminado, compulsória ou voluntariamente, desobriga o garante que a ela não anuiu” (AgReg no REsp 832.271/SP, julgado em 19 de outubro de 2006, p. 369), ou seja, mesmo que tenha assinado contrato assumindo o compromisso de garantir a locação até a real e efetiva entrega das chaves pelo locatário o fiador não pode, no entendimento dela, ser responsabilizado após o término do prazo originalmente contratado.

Com todo o respeito que os ilustres ministros merecem, mencionadas decisões não possuem razão e não configuram o entendimento da maioria dos julgadores do STJ. Tanto é que, para a tranqüilidade dos locadores, em 22 de novembro de 2006, a Terceira Seção do STJ, que é responsável para decidir acerca dos assuntos de locação, no julgamento dos embargos de divergência no Resp 566.633-CE (registro 2004/0102172-5) determinou que:

“Se o contrato de locação contiver cláusula que obrigue o fiador até a entrega das chaves mesmo na hipótese de prorrogação do contrato revela que tinha plena ciência de que o vínculo poderia avançar a prazo indeterminado, devendo o fiador responder pelos débitos gerados pelo afiançado”.
Vale mencionar que a Terceira Seção do STJ, que proferiu a acertada decisão de que o fiador garante a locação até a entrega de chaves, é hierarquicamente superior às decisões individuais das demais turmas.

Os poucos que defendem que o fiador não deve ser responsabilizado até a entrega das chaves têm como base a Súmula 214, a qual rege que “o fiador não responde por aditamento ao qual não anuiu” e também suposta violação ao artigo 819 do atual Código Civil, que determina que “a fiança dar-se-á por escrito, e não admite interpretação extensiva”.

Com a devida vênia ousamos discordar, primeiramente por não constituir aditamento o simples fato de o inquilino permanecer no imóvel findo o prazo de locação previamente estipulado, mesmo porque todas as cláusulas e condições permanecem as mesmas, nos exatos termos do parágrafo 1º do artigo 46 da Lei do Inquilinato (8.245/91), segundo devido ao fato de que nossa legislação determina que uma Lei especial, no caso a do inquilinato, prevalece sobre lei geral, nesse caso em específico o Código Civil.

Vale ainda lembrar o conteúdo do artigo 39 da lei especial do inquilinato, o qual reza que “salvo disposição contratual em contrário, qualquer das garantias da locação se estende até a efetiva devolução do imóvel” e sendo essa lei uma lei especial, como já explanado, aludido artigo deve prevalecer sobre qualquer outro de lei geral, incluindo-se os artigos do Código Civil.

Para colocar uma pá de cal nessa situação, o próprio Código Civil estipula no seu artigo 2.036 que “a locação de prédio urbano, que esteja sujeita à lei especial, por esta continua a ser regida.

Portanto, não vemos razão para que opiniões em desacordo com nossa legislação prevaleçam em detrimento do bom senso e do cumprimento da lei.

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Donald Donadio Domingues é especializado em direito imobiliário, pós-graduando em processo civil pela PUC-SP, sócio do escritório Donadio Domingues & Advogados Associados e diretor jurídico da administradora Floresta Imóveis

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