Por Vladimir Passos de Freitas
A EC 01/2004, depois de 13 longos anos de estudos e discussões, introduziu algumas alterações na estrutura do Poder Judiciário brasileiro. Entre elas a mais importante foi a criação do Conselho Nacional de Justiça, conforme a redação dada ao art. 103, “b”, da Constituição. E ela, sem dúvida, trouxe modificações ao sistema judiciário do Brasil.
Os Conselhos de Justiça foram criados na Europa. Não para controlar o Judiciário, mas sim para dar-lhe mais independência, retirando do Executivo, entre outras coisas, o poder de nomear, remover e demitir juízes. Na Itália, a Lei 195/58, criou o Consiglio Superiore della Magistratura. Nele, ainda que presidido pelo Presidente da República (na prática, simbólica) a maioria de seus membros (20) são juízes de carreira. Os Conselhos espalharam-se pela Europa (v.g. Espanha e Portugal) e pela América Latina (v.g. México, Argentina, Peru, Equador, etc.). Poucos países não possuem Conselhos da Magistratura, como o Uruguai, onde a Suprema Corte de Justiça tem a seu cargo toda a política judiciária.
Nos Estados Unidos, por razões diversas, não existe esse tipo de controle. Os juízes, cuja independência é requisito do regime democrático, na esfera estadual são, regra geral, aprovados ou reprovados nas eleições. No âmbito federal, em caso de falta grave podem ser alvo de impeachment.
No Brasil, a gestão administrativa e o controle disciplinar dos magistrados, até a edição da EC 45/04, eram feitos isoladamente por cada Tribunal, cuja autonomia administrativa é prevista no art. 99 da CF. O CNJ foi incluído como órgão do Poder Judiciário (CF, art. 92, I-A) e sob seu controle estão todos os Tribunais e magistrados do país, exceto o STF. Ele tem 15 conselheiros, dos quais 9 são juízes de instâncias e ramos diversos do Judiciário e 6 de origem externa (2 do MP, 2 advogados e 2 indicados pelo Congresso). Sobressaem no CNJ duas importantes frentes de ação: a) a condução da política nacional do Poder Judiciário brasileiro ; b) o controle disciplinar dos magistrados, ainda que esta não seja feita com exclusividade.
Vejamos, agora, como vem se dando a atuação do CNJ.
Na função de comandar a política do Poder Judiciário nacional, o CNJ vem expedindo atos administrativos regulamentando matérias não previstas na Carta Magna ou na desatualizada Lei Orgânica da Magistratura Nacional (LC 35/79), bem como Resoluções (v.g. nº 63, de 16 .12. 2008, que institui o Sistema Nacional de Bens Apreendidos – SNBA) ou Recomendações (v.g. nº 11, de 22.5.2007, que sugere medidas de proteção ambiental).
Na busca de instituir uma política nacional, muitas medidas foram tomadas. A mais importante delas, com grande repercussão nos meios de comunicação, foi o fim do nepotismo no Poder Judiciário. Rompeu-se com séculos de tradição. Até hoje as múltiplas situações que a vida apresenta, ocupam os trabalhos do CNJ (vide pauta da 80ª. sessão ordinária, www.cjn.jus.br).
Outra medida de impacto foi a fixação e a cobrança de cumprimento do teto dos vencimentos do funcionalismo público, agora no limite máximo de Ministro do STF. Nada mais justo. Qualquer país civilizado estabelece um parâmetro entre o mínimo e o máximo que se paga (geralmente 10%). No Brasil tínhamos casos de funcionários recebendo até 100 vezes a mais do que o mínimo. De menor repercussão, mas também importante, a proibição de magistrados presidirem federações de futebol, a instituição de estatísticas do Judiciário e a criação do RENAJUD, sistema on-line que interliga o Judiciário e o Departamento Nacional de Trânsito (Denatran), permitindo a restrição judicial de veículos em tempo real e que em um mês, 66.353 registrou 66.363 casos.
Recentemente, pela primeira vez no Brasil, se institui uma política nacional de acompanhamento de penas de prisão. O projeto de mutirão carcerário vem evitando que condenados permaneçam presos após o término da pena ou que as cumpram em condições sub-humanas. Só o CNJ, com a presidência de um Ministro do STF, tem condições de promover tal iniciativa em âmbito nacional.
Com relação à segunda atribuição do CNJ, qual seja, o controle disciplinar dos magistrados (CF, art. 103, § 4º, incs. III e VI), a Corregedoria-Geral, sob a condução do Ministro Gilson Dipp, vem tomando medidas enérgicas. Correições em Tribunais, com audiências públicas e determinações de providências, vêm se tornando rotina. Se alguém duvida dos resultados, que consulte o site do CNJ e acesse a Corregedoria. Por exemplo, a Inspeção no Judiciário do Estado do Maranhão, iniciada em 23.10.2008, cuja ata está exposta a quem desejar vê-la (Relatório Final da Inspeção nº 02- TJMA).
Contra o CNJ podem ser feitas objeções. Por exemplo, a de que está substituindo o legislador, que se excede nos poderes ao conceder liminares contra decisões judiciais, que dificulta os serviços dos juízes ao fixar prazos para que sejam proferidas sentenças ou votos (os que representam passam à frente dos que apenas aguardam), que se pagam diárias em excesso aos seus Conselheiros e outras assemelhadas. Mas, estas são questões a serem definidas com o tempo, através de provocação ao STF. Ainda que uma ou outra possa ser verdadeira, não retira os muitos pontos positivos do novo órgão.
Em suma, o CNJ é a grande novidade no Judiciário brasileiro, vem exercendo um papel de relevância e veio para ficar. As críticas devem servir para aprimorá-lo, mas não para desqualificá-lo.