Por Des. Alexandre Victor de Carvalho
A princípio, achei consistente o argumento do Supremo Tribunal Federal (STF) para derrubar a exigência do diploma para jornalista, fundamentado no preceito constitucional da “liberdade de expressão”. Mas, foi no Encontro com a Imprensa, realizado pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais no último dia 18 de junho, no dia seguinte ao julgamento do STF, que a minha convicção foi abalada.
A jornalista e professora Maria da Glória Metzker manifestou que a “liberdade de expressão” já está garantida na Imprensa, através dos artigos publicados diariamente, nos cadernos de opinião, editoriais, nos espaços conquistados por colunistas e comentaristas. Disse ainda que o jornalista não pode e nem deve expressar a sua opinião, mas apresentar versões dos fatos para o leitor concluir, traduzindo termos técnicos e tornando mais acessível a linguagem dos especialistas.
As considerações da professora fizeram-me refletir sobre a questão do curso de jornalismo. Neste artigo, vou tentar elencar alguns pontos a serem avaliados. O primeiro deles está relacionado à formação. Realmente, faz sentido estudar técnicas e teorias de comunicação, essenciais ao tratamento da informação, para que cheguem à sociedade notícias de qualidade, aptas a promover a conscientização e desenvolver a capacidade crítica.
Outro aspecto a ser observado diz respeito à profissionalização, à carreira do jornalista. É temeroso que essa abertura do mercado acabe atraindo pessoas formadas nas diversas áreas, sem o devido compromisso com a atuação específica na área de imprensa. Isso sem contar o risco de o jornalismo se transformar em “bico” para diversos profissionais, que irão conciliar as atividades da sua área de formação com as de comunicação, fragilizando esta última função, essencial à democracia e à fome de informação da sociedade contemporânea.
É preciso ainda observar as partes da ação: a decisão do plenário do STF, por 8 votos a 1, foi tomada no julgamento do Recurso Extraordinário 511961, interposto pelo Ministério Público Federal e pelo Sindicato das Empresas de Rádio e Televisão do Estado de São Paulo contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, que afirmou a necessidade do diploma, contrariando uma decisão da Primeira Instância numa ação civil pública. O voto vencido foi do ministro Marco Aurélio Mello. Quanto ao Ministério Público, ele está atuando dentro de suas funções, em defesa da sociedade e das leis. A parte interessada no fim da exigência do diploma é o Sindicato das Empresas de Rádio e TV.
Ainda jovem, antes de optar pelo direito, escolha de que não me arrependo, fiquei em dúvida se faria o curso de jornalismo. É lógico que, hoje, provavelmente, já teria conquistado a minha posição no mercado, e a decisão do Supremo não iria afetar a minha vida profissional. Mas, fico imaginando um universitário que, de repente, recebe a notícia de que ele pode fazer qualquer outro curso e se tornar jornalista. Os depoimentos dos estudantes na Imprensa após a decisão do STF deixaram claro o sentimento de frustração.
Até agora, as ponderações foram a partir da fala da professora Maria da Glória Metzker. Passo, agora, a tecer alguns comentários de um outro ângulo, sopesando tudo o que tenho visto e ouvido a respeito. É certo, por exemplo, que, em vários países, não se exige o diploma para o exercício do jornalismo – os Estados Unidos e Portugal estão entre eles. E, ainda assim, existe imprensa de qualidade.
O diploma, simplesmente, não garante o bom desempenho das atividades. Pode representar um atestado de competência no papel, para quem não pode exercer as funções na prática. E essa é uma constatação possível em várias outras áreas do conhecimento, exceto, talvez, para algumas, em que o conhecimento técnico é tão rigoroso e complexo que inviabiliza os maus profissionais – o exercício da medicina pode ser citado nesse sentido.
Existem também os que defendem a ideia de que o jornalismo deveria ser uma especialização e não um curso universitário. Assim, a pessoa poderia se formar em qualquer área e, depois, especializar-se para as funções de jornalista. Assim, haveria oportunidade para o aprofundamento em um ramo do conhecimento, enquanto os cursos de comunicação são generalistas e pouco profundos.
Oriunda dessa corrente, há a ideia de que as pessoas que dominam certo tipo de informação são mais competentes e mais hábeis para esclarecer sobre o assunto ao qual se debruçaram. Nessa linha de raciocínio, a população, consequentemente, iria ganhar, tendo informações privilegiadas e de fontes autorizadas.
Existem também opiniões favoráveis ao fim da exigência do diploma, embasadas no fato de que em outras carreiras da área de comunicação, como relações públicas e publicidade, não há essa cobrança. E nem por isso essas atividades deixam de ser exercidas com qualidade.
Abro parênteses, para ressaltar a importância do estudo da teoria da comunicação. Quase instantaneamente, é possível obter informações do mundo inteiro. As pessoas são bombardeadas por notícias produzidas pelas mais diferentes mídias. O estudo da comunicação é a alternativa para se repensar no que está sendo produzido. É temerosa a prática sem a necessária análise, pesquisa, estudo e formulação teórica sobre a mesma. Aliás, o aprimoramento do fazer requer o pensamento sobre esse fazer, de forma crítica e aprofundada, e as escolas de comunicação possuem essa atribuição.
Diante de todas essas facetas, avalio que o mais importante é a gente se deter a um ponto crucial: a inegável importância da imprensa para a sociedade e para democracia. Portanto, a necessidade de qualidade nas notícias veiculadas diariamente. Jornalismo sério e ético é fundamental para o aprimoramento da humanidade. Deixo, enfim, para o leitor concluir: o diploma é imprescindível?
* Desembargador Alexandre Victor de Carvalho–Superintendente de Comunicação TJMG