Supremo rejeita preliminares e decide analisar mérito da ação da OAB contra a Lei da Anistia

Por 8 votos a 1, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu analisar o mérito da Arguição de Preceito Fundamental (ADPF 153) ajuizada pela OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) contra o artigo 1º da Lei 6.683/79, conhecida como Lei da Anistia. O posicionamento da Corte foi tomado nesta quarta-feira (28), antes de o relator do processo, ministro Eros Grau, passar a analisar o mérito do processo.

Ao todo, os ministros votaram sobre cinco preliminares apresentadas pela Advocacia Geral da União (AGU), pelo Senado Federal e pelo Ministério da Defesa. Todas foram rejeitadas pela maioria do Plenário.

Dos nove ministros que participam do julgamento – o ministro Dias Toffoli atuava como advogado-geral da União quando a ação foi ajuizada e, por isso, está impedido de julgar o caso, e o ministro Joaquim Barbosa está de licença médica –, somente o ministro Marco Aurélio concluiu pela inadequação do instrumento processual (a ADPF) para contestar a norma.

“Não tenho como assentar a existência, hoje, passado esse período substancial de 30 anos, a partir da lei atacada, a concretude de um pronunciamento do Supremo”, disse o ministro ao se referir à prescrição dos crimes e aos prazos processuais para pedir indenizações na Justiça.

Preliminares

A primeira preliminar apresentada pelo ministro Eros Grau foi suscitada pela AGU. Nela, apontou-se a ausência de comprovação de controvérsia constitucional ou judicial com relação à Lei da Anistia. A necessidade dessa controvérsia é um dos requisitos para ajuizamento de ADPF.

Segundo explicou Eros Grau, a norma que regulamenta a ADPF (Lei 9.882/99) prevê o cabimento desse tipo de ação quando o fundamento da controvérsia constitucional sobre a lei questionada for relevante.

“É desnecessária a comprovação da existência de controvérsia judicial atinente à aplicação do preceito constitucional. Basta a demonstração de controvérsia jurídica em qualquer sede sobre a validade da norma questionada ou de sua interpretação”, disse o ministro. E, para ele, está “satisfatoriamente” comprovada a existência de polêmica quanto à validade constitucional da anistia dada aos agentes públicos que praticaram delitos quando vigorava a repressão à dissidência política na época da ditadura militar.

“A divergência sobre a anistia penal é notória mesmo no seio do poder Executivo federal, tendo sido apontados aos autos notas técnicas que a comprovam”, afirmou. Ainda segundo Eros Grau, o próprio Supremo diagnosticou a presença de controvérsia sobre a correta interpretação a ser dada à anistia prevista na Lei 6.683/79 ao julgar e autorizar o pedido de Extradição (EXT 974) do major uruguaio Manuel Juan Cordeiro Piacentini, acusado de participar da Operação Condor, formada nos anos 70 para reprimir a oposição a regimes militares da América do Sul. “Isso é suficiente para que resulte demonstrada a controvérsia instaurada.”

EC 26/85

A AGU e o Senado Federal também apontaram como impedimento para julgar a ADPF o fato de a OAB não ter contestado todas as normas relacionadas ao tema, citando expressamente o parágrafo 1º do artigo 4ª da EC (Emenda Constitucional) 26, de 1985. A emenda reafirmou de forma genérica a anistia instituída em 1979. Ao rejeitar essa preliminar, o ministro Eros Grau afirmou que ela se confunde com o mérito da ação da OAB e “será a seu tempo examinada”.

A terceira preliminar examinada no Plenário apontou que a ação seria incabível porque a lei se volta contra atos cujos efeitos se esgotaram na data da sua edição. Sobre isso, Eros Grau foi taxativo: “nada impede que leis temporárias sejam questionadas mediante ADPF”.

As duas últimas preliminares analisadas foram propostas pelo Ministério da Defesa. A primeira alega falta de indicação das autoridades responsáveis pelos atos concretos de descumprimento de preceitos fundamentais. Ao votar sobre isso, o ministro Eros Grau acolheu trechos do parecer do Ministério Público Federal (MPF), segundo o qual “em precedentes, o STF, ao julgar procedente a alegação de descumprimento de preceitos fundamentais, aceitou os efeitos genéricos naturais ao controle objetivo de constitucionalidade”.

Por fim, o Ministério da Defesa apontou a “inutilidade” de uma eventual decisão que acolha o pedido da OAB, já que os crimes, ainda que não anistiados, estariam prescritos. Ou seja, da decisão não resultaria qualquer efeito prático.

Nesse ponto, o ministro Eros Grau disse que a eventual prescrição dos crimes deverá ser analisada caso a caso. Por isso, a apreciação do mérito da ação não estaria prejudicada.

Ao votar, o presidente do Supremo, ministro Cezar Peluso, rejeitou várias preliminares em conjunto, de forma sucinta. Ele afirmou que a ação da OAB propõe que a Corte analise a compatibilidade ou não de uma determinada norma chamada de pré-constitucional com a Constituição de 1988.

Por isso, disse ele, não se pode exigir, no caso, a existência de controvérsia judicial relevante, “tampouco a descrição de fatos, porque não há fatos a serem discutidos”. “Tampouco exige identificação prévia dos autores ou de autoridades responsáveis por atos concretos porque, na verdade, aqui, em caso de procedência da ação, ou em caso de improcedência, os destinatários serão os juízes e as demais autoridades e órgãos que venham a ser chamados para aplicar ou deixar de aplicar a norma”, afirmou.

Sobre a prescrição, Peluso disse que ela fica prejudicada diante da própria anistia dada aos agentes políticos. “Uma vez eventualmente reconhecida a validez e a compatibilidade da norma com a Constituição em vigor, estarão, portanto, reconhecidos os efeitos da anistia e, por seguinte, a inexistência de fato criminoso a cujo respeito se pudesse cogitar de prescrição”, disse.

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