Por JULIETA DE OLIVEIRA ANDRADE
Mais uma vez as cenas se repetem. As cenas de uma peça exaustivamente encenada por protagonistas que, fechadas as cortinas, comprazendo-se com as luzes dos holofotes a eles, tão somente a eles voltadas põem-se a rir dos coadjuvantes. Esse teatro deliberadamente escolhido pela OAB – Ordem dos Advogados do Brasil – já virou rotina no País onde, segundo a Constituição Federal, todos são iguais. Ordem?
Não envolve aqui uma ironia? Afinal o que significa ordem a não ser o cumprimento da Constituição Federal? Continuemos. Os dignos doutores escolhidos para representar a Ordem dos Advogados do Brasil, em sua pretensa onipotência, ao publicarem os resultados das provas obrigatórias para que os bacharéis em Direito conquistem o direito de exercerem a profissão, promovem um alarido capaz de fazer inveja a um afinado bando de gralhas.
Comédia ou tragédia? Até isso fica difícil determinar diante da publicação dos resultados pífios das últimas provas, pois como a flauta que usa o sopro do flautista, esses protagonistas põem-se a entoar uma ode conhecida: os candidatos não sabem ler, não saber interpretar, não têm conteúdo. Provocam perplexidade. São uns despreparados saídos de cursos reprováveis, mas autorizados pelo MEC que, além de não avaliar aqueles já existentes, continua a conceder autorização para o funcionamento de uma infindável catarata de outros.
E mais, magnânima que é, a OAB, sob o manto diáfano da justiça, – quanta pretensão! – argumenta que o grau de dificuldade proposto nas referidas provas é condizente e se justifica pela proteção que ela, por meio de provas de conhecimento, confere à sociedade contra os maus profissionais. Isso mesmo, proteção a uma sociedade amedrontada pelos privilégios dos bandidos à solta nas ruas; pela impunidade daqueles que assaltam o poder público, descaradamente; proteção a uma sociedade que transita à mercê da sorte. Por sua vez, o MEC dispara justificativas a respeito do empenho e zelo no quesito fiscalização dos cursos já existentes, bem como rigor na autorização para funcionamento de outros novos. Rebate as acusações lançadas pela Ordem com invejáveis discursos, cujo mote sistemático são as suas modernas políticas educacionais.
Simultaneamente a essa luta entre elefantes – paráfrase de um conhecido provérbio africano -, o capim vai morrendo a cada nova prova. Em consequência, não fica difícil depreender que esses gênios – não poderia ser diferente – façam parte não apenas do poder, mas de um deserto de homens e ideias. Afinal, por que a OAB não volta as suas preocupações para a educação-base, aquela que será o alicerce do indivíduo por toda a sua vida; não volta as suas ideias à elaboração de projetos capazes de preparar melhor os professores, reavaliar os programas da falida educação brasileira? Não seria proveitoso ouvir a sociedade – ela tem idéias, sim -, oferecendo-lhe oportunidades de uma participação maior? Não seria adequada uma revisão nas grades dos cursos de Direito que, ao envolverem todos os seus ramos, exige que o acadêmico e futuro operador do Direito seja um polivalente nato? Evidentemente não descartamos a prática de um conhecimento geral do mundo afeito ao Direito, todavia, entendemos que ao acadêmico deva ser dada a oportunidade de, no decorrer do curso, fazer a sua opção pelo ramo desejado; opção essa que, além de eficaz na formação de profissionais especializados pouparia tempo do acadêmico, a exemplo daquele que, mesmo odiando Direito Penal vê-se obrigado a chafurdar no Código Penal em detrimento do ramo por ele escolhido, tão somente para prestar a referida prova e, depois fechá-lo para sempre.
Só não enxerga a obviedade da questão aqui discutida aqueles que permanecem deitados em berço esplêndido. Outrossim, vale ainda lembrar aos donos da verdade, sim, aqueles mesmos que propõem questões erradas e depois passam pelo constrangimento – ficariam eles constrangidos? – da anulação das mesmas que, críticas desacompanhadas de sugestões ou solução não merecem credibilidade, não têm eco. Isso posto, faz-se mister lembrar à ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL que os bacharéis em Direito não são analfabetos funcionais como sugere, mas vítimas das deficiências, em especial, do ensino do primeiro grau, bem como da incompetência velada daqueles que detêm o poder com o qual se deliciam.
Afora tantos descalabros, cabe-nos esclarecer não sermos contrários às provas da OAB, mas à prepotência dessa instituição; à sua inércia diante de fatos estapafúrdios que atormentam a sociedade. Somos contrários às críticas depreciativas desferidas aos candidatos. Somos contrários às regras definidas para a realização de referidas provas, a exemplo a obrigação de refazer a primeira fase em caso de reprovação na segunda. O cerne dessa exigência, a nosso ver injusta, provavelmente resida no pagamento da taxa de inscrição que, consequentemente, seria reduzida à metade. Por fim, diante de fatos tão contraditórios, só nos resta aplaudir o Tiririca, membro da Comissão de Educação do Congresso e que, como é sabido, precisou tão somente de uma provinha – sem segunda fase e sem taxa de inscrição -, para conquistar o direito de assumir uma cadeira no Congresso Nacional, bem como registrar que a autora deste texto – acadêmica de Direito -, caso não obtenha aprovação nos exames a serem prestados, será mais uma a juntar-se à legião de bacharéis burros, analfabetos e despreparados para o exercício do Direito, ao tempo que os detentores do poder continuarão a assimilar o anomismo egônomo do rei Luís XVI e a exercitar a sua célebre frase: L’Etat c’est moi! Aplausos para Tiririca. Fechem-se as cortinas e até o próximo ato.
Maringá, 15 de julho de 2011
julietandrade@hotmail.com