A recente regra sobre procedimentos administrativos contra juízes do Conselho Nacional de Justiça, na Resolução 135, publicada no mês passado, sofreu um revés no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. Ao decidir se abririam ou não um procedimento administrativo contra um juiz, os desembargadores do Órgão Especial afirmaram que o dispositivo da Resolução que trata da prescrição dos processos disciplinares é inconstitucional. O mesmo entendimento deverá ser aplicado nos próximos julgamentos sobre o tema.
A Resolução 135/11 diz, no artigo 24: “O prazo de prescrição de falta funcional praticada pelo magistrado é de cinco anos, contado a partir da data em que o tribunal tomou conhecimento do fato, salvo quando configurar tipo penal, hipótese em que o prazo prescricional será o do Código Penal”.
O advogado do juiz, Onurb Couto Bruno, sustentou na tribuna que o procedimento já havia prescrito, pois a representação estava há quase um ano parada na Corregedoria do TJ fluminense. Ele disse que o prazo prescricional para a falta atribuída ao juiz — negligência — era de 180 dias.
Inicialmente, o corregedor do Tribunal, desembargador Azevedo Pinto, entendia que não estava prescrito, levando em conta o período de 180 dias. Segundo ele, esse prazo deveria ser contado a partir de momento posterior à instauração da representação. Azevedo Pinto entendeu, posteriormente, pela inconstitucionalidade do artigo 24 da Resolução do Conselho Nacional de Justiça.
Após a manifestação do corregedor, o desembargador Bernardo Garcez levantou a questão de ordem: o Tribunal teria de se manifestar sobre a constitucionalidade da Resolução 135, do CNJ. Para ele, a resposta era clara: Um órgão administrativo não poderia legislar estabelecendo prazo prescricional.
O Ministério Público foi instado a se manifestar no caso. O procurador Antonio José Campos Moreira afirmou que falta ao CNJ competência para legislar sobre prescrição. Ele também disse que cabe ao Legislativo definir qual será a regra. Isso porque o juiz é um agente político. Como a Lei Orgânica da Magistratura não trata dos prazos prescricionais, o que tem sido aplicado é o que está na lei sobre faltas funcionais cometidas por servidores da União.
O desembargador Valmir de Oliveira acrescentou que, ainda que não fosse inconstitucional, a regra não poderia retroagir para atingir o juiz do caso que estava sendo julgado.
Os demais desembargadores acompanharam o voto de Garcez, que disse que o prazo prescricional para o caso começava quando o juiz assumiu a Vara, em 2008. A decisão foi por unanimidade pela extinção do processo sem análise do mérito.
No caso concreto, um juiz estava sendo acusado de negligência. Segundo o advogado, quando ele assumiu a Vara, havia mais de 12 mil processos. O próprio pediu à Corregedoria que fosse feita uma inspeção. Ainda segundo Onurb Bruno, a inspeção da Corregedoria foi feita com juntadas de petição e conclusão de processos, sendo remetidos mais de 600 para o juiz. Posteriormente, ele foi acusado de não despachar nem sentenciar nos processos. “Quiseram jogar nas costas do juiz um atraso de muitos anos”, disse o advogado.
Onurb Bruno, juiz aposentado que atua com frequência na defesa de juízes no Rio, disse que o tema é reiterado: Há atraso por conta do mal funcionamento dos serviços auxiliares e não pela demora do juiz.
O presidente da Associação dos Magistrados do Rio de Janeiro, desembargador Antonio Cesar Siqueira, afirmou que o CNJ não pode, através de uma Resolução, mudar uma lei federal. No caso, aplica-se a Lei 8.112, que trata do Regime Jurídico dos Servidores Públicos Federais.
Regra contestada
No final de julho, a Amaerj enviou requerimento à Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) para que esta estudasse a viabilidade de entrar com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal para contestar a Resolução 135 do CNJ. No dia 16 de agosto, a AMB apresentou a ação, lembrada pelos desembargadores do TJ do Rio. A AMB afirma que o CNJ não tem competência para uniformizar o trâmite de processos administrativos disciplinares contra juízes e as penas previstas para os casos de punição.
A Resolução 135 fixa a competência disciplinar para os tribunais “sem prejuízo da competência do CNJ, o que pressupõe a supremacia da competência do CNJ em detrimento da competência dos tribunais”. Segundo a AMB, “essa redação é inaceitável porque altera radicalmente o texto constitucional. Em termos de técnica legislativa configura hipótese clara de fraude ‘normativa’, pois de forma intencional o órgão a quem incumbe regulamentar ou disciplinar determinado diploma legal, cria dispositivo normativo com sentido oposto ao da lei”.
Em entrevista à ConJur, o conselheiro Marcelo Nobre, disse que não há interferência nos processos disciplinares. “O que o CNJ quer fazer é que todos os tribunais tenham um processo administrativo disciplinar padronizado na sua generalidade, e não na sua especificidade. Cada tribunal irá tocar seus processos, sem interferência. Mas a forma como isso será tocado, o CNJ pode e deve estabelecer”, afirmou.