Ex-executivos da Siemens AG, gigante alemã da engenharia elétrica e eletrônica, protagonizam, na Justiça dos Estados Unidos, aquele que pode se tornar o maior processo de corrupção envolvendo uma empresa estrangeira no país até o presente momento.
A ação se dá pela jurisdição dos Estados Unidos porque a Siemens tem ações registradas na Comissão de Segurança da Bolsa de Valores do país e estas são negociadas na Bolsa de Valores de Nova York. Além disso, parte do dinheiro do esquema teria sido lavado em bancos americanos.
Em dezembro, foram indiciados oito ex-executivos e funcionários da Siemens pela acusação de suborno de agentes públicos federais da Argentina, com o objetivo de conseguir um contrato de US$ 1 bilhão com o governo do país sul-americano. Quem está com antigos executivos da multinacional na alça da mira é Lanny Breuer, procurador-geral adjunto da Divisão Criminal do Departamento de Justiça dos Estados Unidos. O caso é considerado o mais grave enquadrado até então pela Lei de Práticas de Corrupção por Estrangeiros, Foreign Corrupt Practices Act (FCPA) nos EUA.
De acordo com a publicação The National Law Journal, há três anos, a Siemens já havia desembolsado US$ 800 milhões por conta das mesmas acusações apresentadas pelo Departamento de Justiça e pela Comissão de Segurança da Bolsa de Valores dos EUA. O valor foi pago como parte do acordo para evitar penas ainda maiores contra a pessoa jurídica, no caso. Ainda segundo o NLJ, a Siemens havia pago ainda outros US$ 800 milhões por conta das mesmas acusações, só que na Alemanha, quando encarou a Justiça de seu país de origem.
Desta vez, o Departamento de Justiça se volta para os executivos que trabalhavam para a empresa naquela época. Entre os acusados está Uriel Sharef, antigo membro do Comitê Executivo da empresa. É a primeira vez que um membro do conselho executivo de uma companhia colocada entre as 50 maiores do planeta pela lista global da revista Fortune é processado de acordo com a lei FCPA. O próprio procurador Lanny Breuer define o caso como um “esquema de corrupção em escala colossal”.
De acordo com a equipe de investigação chefiada por Breuer, os então executivos da Siemens haviam se comprometido a pagar US$ 100 milhões em propina para garantir o contrato de US$ 1 bilhão, relativo a uma licitação para se fabricar novos modelos de cartões de identidade nacional na Argentina, a exemplo do nosso novo modelo de RG. Os executivos pretendiam pagar o valor a agentes públicos federais e já teriam falsificado documentos, incluindo notas fiscais falsas e contratos de consultoria com a finalidade de ocultar o pagamento de propina.
Segundo o Departamento de Justiça, o esquema só não aconteceu porque houve mudanças na chefia do órgão que cuidava da licitação. Para tentar reaver US$ 550 milhões referentes aos lucros cessantes e aos custos com a licitação cancelada, a Siemens entrou com uma solicitação de arbitragem no Centro Internacional para Arbitragem de Disputas de Investimento do Banco Mundial.
Para o procurador assistente Lanny Breuer, a fim de ocultar as evidências do pagamento de propinas, os acusados tiveram que comprar o silêncio de funcionários públicos argentinos em 2007, quando a companhia reaveu US$ 218 milhões na decisão favorável do Banco Mundial. Em 2008, a Siemens abriu mão da devolução como parte dos US$ 800 milhões do acordo com o Departamento de Justiça dos EUA.
Na época, a investigação promovida pelo Departamento de Justiça também apurou que subornos foram realizados para vencer licitações semelhantes na Venezuela, no Iraque e em Bangladesh. Apesar da negociação entre o Departamento de Justiça e Siemens ocorrida há alguns anos, os EUA resolveram indiciar agora oito dos ex-executivos da empresa, atuantes na época. O acordo feito envolvia a Siemens como pessoa jurídica e não garantia que os envolvidos não fossem processados individualmente.
O processo agora deve correr na Corte Federal do Distrito de Manhattan. Os réus são acusados de violar a Seção 30ª da Lei de Segurança do Mercado de Valores, de 1934, e as Seções 13(b)(5) da Lei da Bolsa de Valores. As acusações também envolvem fraude financeira e lavagem de dinheiro.
De acordo com o jornal The Washington Post, nenhum dos acusados mora nos Estados Unidos, sendo residentes de países como Argentina, Suíça e Alemanha. A pena prevista é de até 20 anos de reclusão em regime fechado. Segundo o procurador Lanny Breuer, o Departamento de Justiça já está trabalhando para providenciar as extradições em colaboração com governos estrangeiros e contando com o apoio da própria Siemens.