Por Marcelo Knopfelmacher
Na qualidade de presidente do Movimento de Defesa da Advocacia (MDA), entidade que, ao lado da Ordem dos Advogados do Brasil, da Associação dos Advogados de São Paulo (Aasp) e demais entidades co-irmãs, tem por escopo a defesa das prerrogativas do Advogado e a sua valorização profissional, temos visto que, passados mais de vinte anos da promulgação da Constituição Cidadã de 1988, muitos abusos ainda são cometidos em face dos advogados em seu exercício profissional.
Tais abusos, normalmente manifestados pela violação das prerrogativas profissionais, encontram sua razão de ser na própria incompreensão, por parte do inconsciente coletivo, acerca do papel do advogado.
É recorrente, a partir da experiência daqueles, como eu, que militam no contencioso administrativo e forense, que o advogado seja visto como um entrave, ou mesmo um mal necessário, no curso do processo administrativo ou judicial.
As causas para tamanha incompreensão muitas vezes têm lugar na vontade coletiva, difundida e instigada exaustivamente pela mídia, de punição a qualquer custo, porque prisão ou punição representam notícia. Soltura ou absolvição, por sua vez, muitas vezes sequer são divulgadas.
E, nessa mistura de coisas, a figura do advogado, inexoravelmente, acaba se confundindo com a do próprio réu ou acusado, alçados ao mesmo patamar de desconfiança e descrédito social.
A advocacia nos tempos atuais, portanto, enfrenta diversos desafios.
É que não obstante ser essa a profissão qualificada como “indispensável à administração da Justiça” pelo artigo 133 da Constituição, além de ser a única a permitir aos cidadãos o restabelecimento da sua dignidade, quando injustamente vilipendiada, e a garantia de seus direitos, é também a profissão que merece resgatar o respeito dos demais operadores do Direito, sejam eles magistrados, procuradores, promotores, agentes policiais ou mesmo do Fisco.
Quando nos deparamos com situações em que, mesmo constituído nos autos por procuração, o Advogado não consegue ter acesso ao processo administrativo fiscal ou ao inquérito policial, a ponto do Supremo Tribunal Federal ter sido instado a proferir uma Súmula Vinculante 14 para garantir esses direitos básicos ao advogado, é sinal de que as coisas não andam bem.
Quando nos deparamos com legislações em matéria fiscal que conferem ao advogado o prazo de apenas cinco minutos para sustentar oralmente suas razões perante os tribunais administrativos, atribuindo ao Fisco prazo ilimitado para expor as suas, fica muito clara a desproporção de forças e o desprezo ao sagrado direito de defesa, manifestado via de regra pelo advogado.
Quando nos deparamos com propostas tendentes a abolir o Exame de Ordem, por entendê-lo como uma exigência inconstitucional, permitindo-se a todo e qualquer bacharel o exercício profissional, inclusive com a prerrogativa de atuar e produzir sustentações orais perante nossos Tribunais Superiores sem nenhuma aferição prévia de seu preparo (ao contrário do que ocorre com todas as demais carreiras jurídicas, que exigem concursos públicos rigorosos), não há mesmo dúvidas de que a advocacia está em xeque.
Temos ciência de que, nos tempos atuais, são muitos os desafios de nossa profissão e não desconhecemos o fato de que a vigilância e a luta pelo resguardo das prerrogativas do advogado devem ser constantes.
Mas, como advogados que escolheram voluntariamente e amam de maneira incondicional essa profissão, jamais poderemos perder de vista que a causa da advocacia merece o mesmo tratamento que todas as demais, como bem anotou Rui Barbosa em seu clássico O Dever do Advogado: “Quando se me impõe a solução de um caso jurídico ou moral, não me detenho em sondar a direção das correntes que me cercam: volto-me para dentro de mim mesmo, e dou livremente a minha opinião, agrade, ou desagrade a minorias, ou maiorias.”
Esse, portanto, é nosso dever.
Marcelo Knopfelmacher é advogado e diretor presidente do Movimento de Defesa da Advocacia (MDA).