Advogados devem conhecer Regulamento de Arbitragem

Por Marcelo Beltrão da Fonseca e Maria Augusta Paim

A arbitragem é um meio alternativo de solução de disputas em que as partes convencionam que um terceiro, o árbitro, terá poderes para solucionar a disputa, sem a intervenção do Poder Judiciário. No ano passado, a Lei 9.307, de setembro de 1996, que dispõe sobre a arbitragem, completou 15 anos de vigência com um balanço positivo, em razão da aceitação cada vez maior do instituto no Brasil.

Recentemente, a Câmara de Comércio Internacional (CCI), com sede em Paris, instituiu um novo Regulamento de Arbitragem, que entrou em vigor no dia 1º de janeiro de 2012. Passou, então, a ser aplicado a todos os procedimentos arbitrais administrados pela CCI que sejam instaurados a partir dessa data, a não ser que a convenção de arbitragem seja anterior e, ao mesmo tempo, as partes tenham optado expressamente a se submeterem ao Regulamento vigente na data em que a convenção da arbitragem foi assinada.

Com o objetivo de divulgar o novo regulamento aos brasileiros, cujo mercado é um dos que o uso da arbitragem mais cresce, a CCI organizou, no dia 21 de março de 2012, no Rio de Janeiro, o seu primeiro seminário na América Latina sobre o novo regulamento. Na ocasião, foi divulgado que o advogado brasileiro José Emílio Nunes Pinto foi escolhido como um dos vice-presidentes da Corte Internacional de Arbitragem da CCI, o que demonstra o prestígio dos brasileiros junto a tal órgão.

A CCI assumiu rapidamente a liderança na resolução de disputas internacionais de natureza comercial e empresarial. Estima-se que desde a sua fundação, em 1919, a CCI já tenha resolvido mais de 17 mil casos. Tanto por meio de arbitragem quanto de outros mecanismos alternativos de resolução de disputas, como a mediação, os quais compõem os denominados Alternative Dispute Resolution – ADR. A partir da edição do seu primeiro Regulamento de Arbitragem, em 1998, a CCI passou a receber, em média, 500 novos casos por ano. Especificamente no ano de 2010, foram 800 novos casos instaurados, envolvendo 2.145 partes de 140 países diferentes.

O Regulamento de Arbitragem da CCI de 2012 constitui um aprimoramento da versão anterior, em resposta às necessidades da comunidade internacional, cujas relações estão cada vez mais complexas. Envolve múltiplas partes e múltiplos contratos em uma mesma transação econômica, demandando soluções urgentes, e exigindo-se maior controle de custos e prazos na condução do procedimento arbitral.

Em breve análise das novidades trazidas pelo Regulamento de Arbitragem da CCI de 2012, verifica-se que, diferentemente do Regulamento anterior, que exigia apenas uma declaração de independência, pelo novo Regulamento, os árbitros indicados a comporem o tribunal arbitral deverão assinar declaração de aceitação, disponibilidade, imparcialidade e independência. Na prática, a exigência de compromisso com a disponibilidade durante todo o procedimento arbitral é bastante relevante, considerando que os árbitros mais cotados comumente trabalham em várias arbitragens ao mesmo tempo, o que pode comprometer a capacidade de resolverem as disputas de forma célere e eficiente.

Outra novidade importante é a possibilidade de nomeação de um árbitro de emergência, antes de o tribunal arbitral ser constituído, para solucionar medidas urgentes por meio de uma ordem, que poderá ser posteriormente alterada, revogada ou anulada pelo tribunal arbitral, assim que constituído. A possibilidade de nomeação de árbitro de emergência está restrita às disputas relativas a convenções de arbitragem assinadas após a entrada em vigor do novo Regulamento, isto é, de 1º de janeiro de 2012 em diante. Não será aplicável se as partes optarem expressamente pela exclusão das disposições sobre o árbitro de emergência, ou se preferirem a aplicação de outro procedimento pré-arbitral similar, a exemplo do previsto pelo Regulamento de Procedimento Cautelar Pré-Arbitral da própria CCI, editado em 1º de janeiro de 1990. As disposições sobre o árbitro de emergência do novo Regulamento não impedem que as partes requeiram medidas cautelares às autoridades judiciais competentes.

Em relação às disputas que envolvam múltiplas partes e múltiplos contratos, o novo Regulamento ampliou a possibilidade de consolidação de procedimentos, com as seguintes disposições: (i) partes adicionais podem ser integradas ao procedimento, antes da confirmação dos árbitros, ainda que não sejam signatárias da convenção de arbitragem; (ii) em arbitragens com múltiplas partes podem coexistir diversas demandas; (iii) demandas oriundas de múltiplos contratos podem ser resolvidas em uma única arbitragem, independentemente de estarem fundadas em uma ou mais de uma convenção de arbitragem; (iv) a Corte da CCI poderá consolidar duas ou mais arbitragens em um único procedimento se as partes concordarem ou se todas as demandas forem formuladas com base na mesma convenção de arbitragem, ou, caso haja mais de uma convenção de arbitragem, as arbitragens envolvam as mesmas partes, as disputas sejam relacionadas à mesma relação jurídica (i.e. transação econômica) e a Corte entenda que as convenções de arbitragem são compatíveis.

Por fim, merece destaque a determinação de que o tribunal arbitral e as partes deverão envidar todos os esforços para conduzir a arbitragem de forma expedita e menos custosa possível.

Com base nisso, o tribunal arbitral deverá convocar uma conferência para definir o procedimento mais adequado, o que poderá incluir algumas das técnicas de controle de custos e tempo da arbitragem previstas no Apêndice IV do novo Regulamento da CCI. Por exemplo a bifurcação de procedimentos ou a possibilidade de prolação de sentenças arbitrais parciais, a identificação de questões que possam ser resolvidas por acordo entre as partes e as que possam ser resolvidas exclusivamente com base em documentos, dispensando-se a realização de audiência, dentre outras técnicas.

O novo Regulamento da CCI representa uma iniciativa bem-sucedida de adaptação dos mecanismos de resolução de controvérsias às recentes demandas da comunidade empresarial internacional. Afinal, a arbitragem, antes considerada um meio alternativo para dirimir disputas empresariais, tornou-se nos últimos anos o método padrão, a primeira opção dos empresários para a solução de eventuais disputas que surjam sob os seus contratos.

Nesse cenário, recomenda-se que os empresários e advogados que militam na área de solução de disputas conheçam o novo Regulamento de Arbitragem da CCI, que, se escolhido, certamente contribuirá para uma solução de disputas mais ágil e eficaz.

Além disso, espera-se que as inovações trazidas pelo novo Regulamento de Arbitragem da CCI sirvam de inspiração para o aprimoramento dos regulamentos das diversas câmaras de arbitragem brasileiras.

Marcelo Beltrão da Fonseca é sócio do escritório Ulhôa Canto, Rezende e Guerra Advogados

Maria Augusta Paim é sócia do escritório Ulhôa Canto, Rezende e Guerra Advogados

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado.


Você está prestes a ser direcionado à página
Deseja realmente prosseguir?
Atendimento