Renata Giraldi
Repórter da Agência Brasil
Brasília – Em menos de 30 dias, o novo embaixador do Brasil na Líbia, Afonso Carbonar, assume suas funções em Trípoli, a capital, depois de 15 meses de a embaixada brasileira ser fechada no país. Entusiasmado com o desafio de cooperar com o processo de democratização e reconstrução na região, Carbonar reiterou, em entrevista à Agência Brasil (ABr), que brasileiros e líbios “têm muitos aspectos comuns”, inclusive a paixão pelo futebol.
Para o embaixador, a Líbia vive momento histórico graças aos esforços da população e do Conselho Nacional de Transição (CNT): “Tenho enorme admiração pelo povo líbio e pelo trabalho desenvolvido pelo CNT”. Segundo ele, o país terá crescimento econômico superior a 50% até 2012, estimulando assim investimentos estrangeiros.
Agência Brasil – Que orientações o senhor recebeu como prioridades nas relações com a Líbia?
Afonso Carbonar – Há muito interesse de ambos os lados de ampliar o modelo de cooperação, intensificar o diálogo e estabelecer um canal constante de contato. Pode parecer estranho, mas o povo líbio e o povo brasileiro têm muitos aspectos comuns. Os líbios vivem agora um momento extraordinário de democratização e o Brasil passou por um processo de redemocratização, por exemplo. Fora isso, há o futebol e mil e um aspectos.
ABr – Futebol?
Carbonar – Exatamente. Os líbios, como os brasileiros e talvez em algumas situações até mais, têm verdadeira paixão pelo futebol. Há uma proposta brasileira de promover um intercâmbio entre técnicos de futebol brasileiros e estrangeiros. O futebol está na nossa agenda. Vejo muita sinergia nisso.
ABr – E como está o processo de democratização na Líbia?
Carbonar – Tenho enorme admiração pelo povo líbio e pelo trabalho desenvolvido pelo Conselho Nacional de Transição [que conduziu o processo político de destituição do então presidente Muammar Khadafi, em 2011]. O CNT está fazendo um trabalho extraordinário na Líbia ao promover eleições diretas, como as que ocorreram no último fim de semana. Serão eleitos 200 deputados constituintes que vão elaborar a Constituição Nacional. As eleições na Líbia são um marco histórico, um divisor de águas no caminho da democratização.
ABr – Como o Brasil pode ajudar nesse processo de reconstrução política, econômica, social e até mesmo física da Líbia?
Carbonar – O Brasil pode ajudar muito. Em abril, o vice-primeiro-ministro da Líbia, Omar Abdelkarim, conversou com a presidente Dilma Roussef e o ministro das Relações Exteriores, Antonio Patriota, além de deputados, na tentativa de obter apoio para a reconstrução da região. As autoridades brasileiras se colocaram à disposição para cooperar com a Líbia no que for necessário, temos experiência e condições para isso.
ABr – Os empresários se sentem estimulados a investir na Líbia, um país com história recente de conflito intenso e de tensões?
Carbonar – Em um mundo que sofre com os impactos da crise econômica internacional e está encolhendo, a Líbia vive processo inverso. A previsão é que a economia do país cresça cerca de 50% até 2012, em uma média de 10% a 15%. A economia líbia se baseia em petróleo e um patrimônio imenso de derivados. O país é predominantemente importador, envolvendo as mais distintas áreas – construção civil, hidrocarbonetos, hospitalar, alimentos e indústrias em geral. Além da Petrobras, três empresas operavam na Líbia até a eclosão dos conflitos no ano passado – Odebrecht, Andrade Gutierrez e Queiroz Galvão. Todas sinalizam interesse em continuar investindo. Calculo que pelo menos 60 empresas brasileiras de vários setores pretendem investir na Líbia.
ABr – As autoridades líbias já demonstraram algum interesse específico em projetos desenvolvidos no Brasil?
Carbonar – Já fizeram várias indicações. Uma delas é em relação aos programas de transferência de renda existentes aqui [no Brasil] e que podem servir de modelo para a Líbia. Mais de metade dos 6,5 milhões de líbios têm menos de 30 anos, precisam de qualificação e querem trabalhar, assim os projetos desenvolvidos no Brasil são muito úteis também para eles. Uma das preocupações das autoridades líbias é com o fluxo migratório, pois com uma faixa litorânea de 1,7 mil quilômetros quadrados, muitos optam por seguir em direção à Europa, deixando o país.
ABr – Quando se pensa em Líbia logo vem à memória conflitos, tensões e medos. O senhor não teme por sua segurança e de sua família?
Carbonar – A diplomacia exige sacríficios, quem escolhe a profissão sabe disso. Conto com a compreensão da minha mulher, que vai ficar em Roma [Itália], cuja distância de Trípoli não é tão grande assim. Dessa forma, será possível trabalhar bem e com segurança.