Ao contrário dos demais procedimentos médicos, a cirurgia plástica tem obrigação de resultado. Não basta, portanto, que tenham sido usadas a melhores técnicas durante o procedimento, já que o intuito é entregar ao paciente o resultado esperado. E, por ser uma relação em cuja obrigação é de fim, se assemelha às relações de consumo, nas quais o ônus da prova deve ser invertido: cabe ao cirurgião provar que nada do que poderia ter feito apresentaria outro resultado, e não ao paciente comprovar a desídia do cirurgião.
O entendimento foi fixado pela ministra Nancy Andrighi, da 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, em Recurso Especial interposto por homem que ficou insatisfeito com cirurgias plásticas que fez no nariz. Inicialmente, o paciente havia feito uma cirurgia para correção de desvio de septo nasal, e aproveitou para fazer também a correção estética.
Não gostou do que viu no espelho depois de passado o prazo de recuperação. Fez outra cirurgia, que também não trouxe o resultado esperado, e foi à Justiça buscar compensação pelos danos morais e reparação pelos danos materiais. Em primeiro grau, teve o pedido negado. O juiz afirmou que o paciente não conseguiu comprovar a negligência do cirurgião.
O paciente foi ao Tribunal de Justiça de Santa Catarina alegar que as cirurgias estéticas têm obrigação de fim, e portanto o ônus da prova deveria ser invertido. Não seria ele, portanto, quem deveria comprovar a negligência do médico, mas o cirurgião quem deveria comprovar que o nariz de seu paciente não poderia ter saído de outra forma. Não pelo trabalho dele, pelo menos.
No acórdão de segundo grau, o TJ concordou com a tese de que as cirurgias plásticas têm obrigação de resultado, como já havia sido fixado pelo Superior Tribunal de Justiça. Só que a inversão do ônus da prova não caberia no caso, pois avaliar se o resultado obtido foi o esperado seria “muito subjetivo”. E porque em ações de indenização por dano moral, “o ônus da prova incumbe a quem alega”, como dizia o acórdão do TJ catarinense.
A ministra Nancy Andrighi discordou do tribunal. Ela argumentou que, nas obrigações de resultado, “o uso da técnica adequada não é suficiente para isentar o médico da culpa pelo não cumprimento de sua obrigação”. Incumbia ao recorrido, portanto, fazer prova de circunstância capaz de elidir sua responsabilidade pelos danos alegados.
No entanto, a ministra não reformou a decisão do TJ, mas reenviou o caso para a primeira instância, para que seja feita nova instrução. Ela afirmou que, como o TJ reconheceu a obrigação de resultado no caso, seguindo a jurisprudência do STJ, mas não determinou a inversão do ônus da prova, caberia ao STJ determiná-la.
Só que, como ficou definido em Recurso Especial julgado em 2011 pela 2ª Seção, especializada em Direito Privado, a inversão do ônus comprobatório é regra de instrução, não de julgamento. “Assim, considerando a necessidade de se permitir ao recorrido a produção de eventuais provas capazes de ilidir o pleito deduzido pelo recorrente, deverão ser remetidos os autos à instância inicial, a fim de que seja oportunamente prolatada uma nova sentença”, finaliza a ministra Nancy Andrighi.