O ente público, embora conduza seus atos administrativos em consonância com os princípios preconizados no artigo 37 da Constituição, não está imune às repercussões de sua atuação na esfera privada das relações de emprego. Assim, se contratar sob o regime jurídico de emprego, agindo como particular, deve sujeitar-se às regras, normas e princípios do Direito do Trabalho.
Adotando esse entendimento, a 10ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (Rio Grande do Sul) manteve sentença que reconheceu a legitimidade de um consórcio de municípios para figurar como empregador numa reclamatória trabalhista. Como a demanda foi julgada procedente, o ente público responderá pelos créditos reconhecidos à parte autora na origem.
A relatora do recurso na corte, desembargadora Denise Pacheco, definiu o conceito de consórcios públicos nas palavras do doutrinador Celso Antonio Bandeira de Mello: ‘‘contratos realizados entre as pessoas de Direito Público de capacidade política, isto é, entre a União, estados, Distrito Federal e municípios, em vista da realização de atividades públicas de interesse comum, e dos quais resultará uma pessoa jurídica que os congregará’’.
Para a desembargadora, os autos revelam que foi o consórcio quem realmente admitiu e remunerou a reclamante enquanto durou a relação de trabalho. Cópias das anotações na Carteira de Trabalho e os contracheques emitidos pela ré corroboram a tese de reconhecimento de vínculo.
‘‘Diante dos elementos probatórios, inclusive da prova documental juntada com a defesa do reclamado, que retrata o contrato de trabalho havido entre as partes, resta inegável a legitimidade passiva ad causam do consórcio-réu e a sua condição de empregador’’, definiu a relatora. O acórdão foi lavrado na sessão do dia 20 de março.
O caso
A autora disse que trabalhou para o Consórcio Público da Associação dos Municípios do Litoral Norte como técnica de enfermagem, no período de 14 de novembro de 2008 a 3 de janeiro de 2011. Como não recebeu o que entendia de direito, ajuizou reclamatória com diversos pedidos, dentre os quais: pagamento de diferenças salariais, horas extras, diferenças de adicional noturno, diferenças de insalubridade, férias em dobro e multa pelo atraso nos salários, entre outros.
O consórcio contestou, negando o vínculo empregatício. Alegou que é um ente público com status de autarquia, sem fins lucrativos. Logo, não pode responder sozinho pelos créditos decorrentes do contrato de trabalho da reclamante, tampouco pelos direitos previstos em acordos coletivos de trabalho, por não ter sido signatário de tais instrumentos, assim como os municípios que o integram.
A juíza Silvana Martinez de Medeiros, da Vara do Trabalho de Osório, não acolheu o argumento de ilegitimidade passiva, esgrimido pela parte ré, julgando procedente a reclamatória. Para ela, a legitimidade ficou evidenciada pelos documentos anexados aos autos pelo próprio demandado, em que este figura como empregador.