O Banco de Brasília S. A. (BRB) foi condenado a indenizar a ex-gerente de uma agência que comprovou ter sofrido assédio moral depois de prestar depoimento à Polícia Federal (PF) nas investigações sobre suposto esquema envolvendo políticos do Distrito Federal. A Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho deu provimento a recurso da ex-gerente e condenou o banco a pagar indenização no valor de R$ 250 mil.
Em fevereiro e março de 2003, a bancária, então gerente da Agência JK, em Brasília, foi intimada pela PF para prestar depoimento em inquérito que apurava denúncias de desvio de dinheiro do Instituto Candango de Solidariedade (ICS), por meio de empresas prestadoras de serviços, para campanhas eleitorais. Tanto o ICS quanto as empresas envolvidas – Adler e Linknet – eram correntistas da Agência JK.
Logo depois do segundo depoimento, o jornal O Globo publicou matéria com o título “Parecer de Procurador-Geral deverá ser favorável à cassação de Roriz” (então governador do DF), com informações relativas ao depoimento da gerente à PF sobre a conta da Linknet.
Vazamento
O banco abriu sindicância por entender que a gerente havia vazado informações sigilosas de seus clientes. Na reclamação trabalhista, a bancária afirma que a auditoria interna concluiu que não houve quebra de sigilo bancário, mas, mesmo assim, por determinação direta da Presidência do banco, foi aberto procedimento administrativo disciplinar (PAD).
Em abril de 2003, ela foi afastada da agência e lotada em setor na qual, conforme alegou, “realizava tarefas divorciadas do cargo de gerente e sem contato humano”. Na mesma época, sua candidatura para compor o conselho do Regius, fundo de previdência privada do BRB, foi rejeitada.
O processo administrativo, porém, não foi concluído. Depois de várias licenças médicas para tratamento de depressão decorrente do que definiu como “grave estado de tensão e estresse”, agravado pelo “isolado e hostil ambiente de trabalho” e da falta de informação sobre o PAD, a gerente acabou aderindo a plano de desligamento voluntário (PDV) e, posteriormente, passou em concurso para a Caixa Econômica Federal.
Praxe
O BRB, na contestação da reclamação trabalhista, informou que os dados relativos ao sigilo bancário da empresa cliente foram atribuídos pela imprensa à gerente, no depoimento à PF e ao Ministério Público, circunstância que levou à realização da auditoria interna. Negou, porém, que a auditoria tenha concluído por sua inocência, e sim que seriam necessários mais elementos para a apuração do caso.
Ainda segundo a defesa, a Linknet processou o banco e a gerente pela suposta quebra de sigilo, contribuindo ainda mais para a abertura do PAD. O deslocamento de funções foi classificado pelo banco como praxe, a fim de viabilizar as investigações e preservar a própria trabalhadora. E, sobre a demora na conclusão do processo (que acabou extinto quando a gerente aderiu ao PDV), alegou que este foi sobrestado várias vezes devido às sucessivas licenças médicas e à ausência do seu depoimento à PF, documento que considerou essencial.
A juíza da 10ª Vara do Trabalho de Brasília entendeu configurado o assédio moral e condenou o BRB a pagar indenização no valor de cem vezes a última remuneração da gerente, configurando, à época, o montante de R$ 399 mil. O Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região (DF-TO), porém, reformou a sentença. Para o Regional, a suspeita de vazamento autorizava a instauração do PAD, que, “diante da gravidade da situação, não constituiu conduta abusiva” por parte do banco.
Pressão
O relator do recurso da bancária no TST, ministro Cláudio Brandão, analisou o caso sob dois prismas: a instauração do PAD e a forma como este foi conduzido pelo banco.
No primeiro ponto, ele assinalou que a quebra do sigilo bancário sem autorização judicial, como exige a Lei Complementar 105/2001, constitui crime e sujeita os responsáveis à pena de reclusão e multa, e a possibilidade de que isso tivesse ocorrido justificaria a instauração do PAD. Ele acolheu, porém, os argumentos dos demais ministros, que consideraram a instauração abusiva porque a comissão de auditoria, em apuração prévia, concluiu pela ausência de responsabilidade da gerente na divulgação das informações. Assim, no entendimento da Turma, a instauração de outro procedimento a fim de apurar os mesmos fatos “revelou, na essência, forma de pressão para impedir ou dificultar a efetiva apuração”.
Com relação à condução do PAD, o ministro Cláudio Brandão ressaltou que, segundo o TRT, embora o banco alegasse ser essencial a cópia dos depoimentos à PF para a sua conclusão, “a prova revelou que tal órgão jamais fora oficiado”. Assim, ainda que tivesse sido lícito na origem, o procedimento acabou se revelando abusivo, porque o banco “não adotou a diligência necessária no sentido de impulsionar o andamento do processo e concluí-lo; ao contrário, prolongou-o sem justo motivo”.
Por unanimidade, a Turma deu provimento ao recurso e fixou a indenização em R$ 250 mil. “A quantia permitirá à trabalhadora adquirir bens e contratar serviços aptos a melhorar sua qualidade de vida e, com isso, auxiliar na superação do dano imaterial sofrido em decorrência do assédio moral vivenciado”, afirmou o relator.
A Turma ainda determinou que o Ministério Público do Trabalho e o do Distrito Federal sejam oficiados “para que se discuta, enfim, a licitude do comportamento adotado pelo presidente do banco, em razão da pressão havida no sentido de não facilitar o trabalho de investigação”.