Autor: Carlos Araujo (*)
Por ocasião do julgamento da ADPF 130, o Supremo Tribunal Federal declarou que a Lei 5.250/67, a chamada Lei de Imprensa, não foi recepcionada pela Constituição de 1988. Ressalvou, porém, expressamente, que a declaração de sua inconstitucionalidade “não implicará supressão de uma importantíssima prerrogativa de que dispõem os jornalistas, consistente no direito de preservação do sigilo da fonte”.
Assim sendo, nenhum jornalista poderá ser constrangido a revelar o nome de seu informante ou a indicar a fonte de suas informações, tampouco poderá sofrer qualquer sanção, direta ou indireta, quando se recusar a quebrar esse sigilo de ordem profissional. Essa prerrogativa profissional qualifica-se como expressiva garantia de ordem jurídica, que se destina, em última análise, a viabilizar, em favor da própria coletividade, a ampla pesquisa de fatos ou eventos cuja revelação se impõe como consequência ditada por razões de estrito interesse público.
Foi por isso que a Carta Política de 1988, ao proclamar a declaração de direitos, previu a explícita referência à indevassabilidade da fonte de informações, qualificando essa prerrogativa de ordem profissional como expressão de um dos direitos fundamentais que limitam a atividade do Poder Público. Mister ressaltar que mais do que simples prerrogativa de caráter individual ou de natureza corporativa a liberdade de informação jornalística desempenha uma relevante função político-social de vez que, em seu processo de evolução histórica, afirmou-se como instrumento realizador do direito da própria coletividade à obtenção da informação.
Vale dizer, a prerrogativa concernente ao sigilo da fonte, longe de qualificar-se corno mero privilégio de ordem pessoal ou estamental configura na realidade, meio essencial de concretização do direito constitucional de informar, revelando-se oponível, em consequência, a quaisquer órgãos ou autoridades do Poder Público, não importando a esfera em que se situe a atuação institucional dos agentes estatais interessados.
Dessa feita, forçoso concluir que o juízo negativo de recepção da Lei de Imprensa proclamado pela STF não afetou a prerrogativa jurídica que assegura ao jornalista o direito de não revelar a fonte de suas informações de vez que esse direito compõe o quadro da própria declaração constitucional de direitos e garantias individuais, não podendo sofrer qualquer tipo de restrição.
Esse direito público subjetivo, revestido de qualificação constitucional, além de inteiramente oponível a qualquer agente, autoridade ou instituição do Estado, propicia, ao jornalista, um campo de proteção e amparo muito mais abrangente. Em suma: a proteção constitucional que confere ao jornalista o direito de não revelar sua fonte de informação desautoriza qualquer medida que vise pressioná-lo ou constrange-lo a indicar a origem das informações a que teve acesso porquanto, ao jornalista, em tema de sigilo da fonte, não se impõem o poder de indagação do Estado ou de seus agentes.
Em seu art. 5º, inciso XIV, a nossa Constituição assegura “o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional”. Esse dispositivo consagra uma garantia que é fundamental ao desenvolvimento da atividade jornalística e, sem ele, não se poderia falar na existência de uma imprensa livre. Diversas declarações internacionais de direitos humanos também trataram de proteger vigorosamente o sigilo das fontes jornalísticas, a exemplo da Convenção Europeia de Direitos Humanos, da Declaração de Chapultepec, e da Carta Africana dos Direitos do Homem e dos Povos.
O arcabouço jurídico constitucional hoje vigente no país garante ao jornalista no uso regular de suas funções a garantia legal de que o sigilo da fonte deve prevalecer, inclusive sobre eventuais ilícitos que tenham sido praticados antes da divulgação da notícia, quando se tratar da divulgação de informações relevantes ao público. Para o jornalista, a proteção constitucional ao sigilo da fonte representa tanto um direito que lhe assegura o livre exercício de sua profissão, como um dever.
Nas palavras de Prof. José Cretella Neto, “se o sigilo de fontes não fosse assegurado, não teriam os profissionais de imprensa acesso à expressivo manancial de informações, pois os detentores destas não iriam arriscar suas vidas ou de seus familiares em troca de indiscrições”.
A Constituição Federal assegura o sigilo da fonte quando necessário ao exercício profissional. Esse dispositivo consagrou uma garantia que é fundamental ao desenvolvimento da atividade jornalística, porquanto não há jornalismo sem proteção ao sigilo da fonte. O sigilo é pressuposto para o pleno exercício do direito à informação, tanto sob a ótica do direito de informar quanto sob a ótica do direito de ser informado.
Enfim, num estado democrático de direito as leis garantem a publicidade dos atos a bem do direito fundamental do cidadão à informação livre e completa como instrumento essencial para o funcionamento e preservação da Democracia.
Autor: Carlos Araujo é advogado, presidente da Comissão de Advocacia Corporativa da OAB-RJ.