ECA deve acolher monitoramento de adolescentes por tornozeleira eletrônica

Autores:  Ivana David e João José da Fonseca (*)

 

Como é de conhecimento geral, a Câmara de Deputados analisa o Projeto de Lei 7.306/2014, que estabelece o uso de Monitoramento Eletrônico no regime de semiliberdade e internação com atividades externas como meio de fiscalizar o cumprimento das medidas socioeducativas que obrigam o adolescente infrator.

Segundo o próprio autor do projeto, deputado João Campos (PRB-GO), o escopo da alteração legislativa é o de aumentar o leque de medidas alternativas à internação do menor infrator, que só deve ser determinada em ultimo caso.

No caso do Estatuto da Criança e Adolescente em vigor, em seu artigo 112 e seus incisos e parágrafos, são elencadas as medidas cabíveis ao menor infrator a serem impostas pela autoridade competente, as quais, anote-se, guardam semelhança ao estatuto repressivo. E na lição de Valter Kenji Ishida,  por cuidar-se de rol taxativo não caberia a sua ampliação.

Não obstante isso, apenas com o advento do referido projeto de lei em trâmite, no nosso sentir, é que se possibilitará ao Poder Judiciário a aplicação e fiscalização da mencionada medida socioeducativa com a utilização da monitoração eletrônica.

Registre-se que atualmente, a Lei 12.403/2011, que deu nova redação ao artigo 319, inciso IX, do Código de Processo Penal,  apenas prevê a hipótese de utilização de tornozeleira eletrônica quando da substituição de prisão ao então preso cautelar. No mesmo sentido, a Lei 12.258/2010 autorizou o uso de monitoração eletrônica na fase de execução da pena em casos específicos; entretanto, quedaram-se as referidas leis inertes no que pertine à sua eventual aplicação aos menores infratores.

Destarte, em nosso entendimento, possível a ampliação das hipóteses de imposição de medidas ao adolescente infrator previstas no artigo 112 do ECA  pois,  ao contrário, do que por exemplo, adotam outros países, os quais indicam elevado grau de contentamento na reeducação e reintegração dos menores infratores, em nosso ordenamento jurídico a monitoração eletrônica de menores encontra-se ainda em conflito com a Lei, e não resta indicada expressamente como meio de fiscalização de cumprimento de medida judicial.

Ademais, trago à colação a bem lançada indicação do d. Promotor de Justiça do estado do Paraná – Dr. Murillo José Digiácomo ao defender a utilização da tornozeleira eletrônica em menores infratores em seu artigo denominado – A importância do controle das medidas socioeducativas e o monitoramento eletrônico de adolescentes: “A introdução do monitoramento eletrônico no Âmbito do Sistema Socioeducativo permitirá a ampliação do ‘leque’ de atividades passiveis de serem desempenhados pelos adolescentes em cumprimento de medida privativa de liberdade, tornando possível o redirecionamento do trabalho dos educadores sociais, que poderiam, eventualmente, passar a atuar com maior intensidade junto às famílias dos socioeducandos.

Isto não significa que os educadores sociais não mais irão acompanhar as atividades dos adolescentes que estiverem sendo monitorados eletronicamente, pois continuará sendo necessário avaliar permanentemente o desempenho  e aproveitamento dessas atividades relacionadas  no Plano individual de Atendimento (algo que não é possível através do simples monitoramento eletrônico, que se limita a registrar  a frequência e local da atividade), dentre intervenções que reclamam o contato pessoal com o socioeducando, mas com certeza o tempo necessário para tanto será ampliado, otimizando assim o atendimento prestado”(2)

Diante desse contexto, cabe trabalharmos para a efetiva alteração legislativa, instituindo o monitoramento eletrônico como mais um mecanismo de fiscalização das medidas sócio-educativas aos menores infratores, ampliando o rol do artigo 112 e acrescendo à Lei 8.069/90 o artigo 125-A, o qual se transcreve a seguir:

“O Juiz da Infância e da Juventude poderá definir a fiscalização por meio de monitoração eletrônica quando determinar o regime de semi-liberdade ou a internação com atividades externas.

Parágrafo 1º: O adolescente será instruído acerca dos cuidados que deverá adotar com  o equipamento eletrônico e dos seguintes deveres:

  • Receber visitas do servidor responsável  pela monitoração eletrônica, responder aos seus contatos e cumprir suas orientações;
  • Abster-se de remover, de violar, de modificar, de danificar de qualquer forma o dispositivo de monitoração eletrônica ou de permitir que outrem o faça.

Parágrafo 2º: A violação comprovada dos deveres previstos no parágrafo anterior poderá acarretar, a critério do Juiz da Infância e da Juventude, ouvindo o Ministério Público, advertência, por escrito.”

Disciplinando assim com maior detalhamento a forma de vigilância da conduta do menor, a garantir a efetiva aplicação e eficácia da lei especial.

 

 

 

Autores:  Ivana David é juíza substituta em 2º grau na Seção de Direito Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.

 João José da Fonseca é advogado e membro da Comissão de Discussão do Projeto de Lei das Execuções Penais da OAB-SP.


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