As práticas da boa gestão vão além de regras jurídicas

Autora: Santamaria Nogueira Silveira  (*)

 

A reputação corporativa decorre das percepções que diferentes públicos têm da organização, importando em credibilidade e confiabilidade. Atualmente, os limites de uma empresa têm obrigatoriamente de incluir a sociedade, sendo que, com acesso maior a uma gama de informações e direitos, os cidadãos ampliaram suas demandas frente às organizações, sejam públicas ou privadas.

O conceito dos stakeholders (Freeman, 1984) explica bem o fenômeno. Originalmente, a palavra inglesa se referia ao indivíduo, no qual se confiava o dinheiro de uma aposta, cabendo a ele definir o vencedor. Aplicado à comunicação, significa um grupo ou uma pessoa que pode influenciar uma organização, assim como pode ser influenciado por ela.

Hoje, nas mãos dos stakeholders pode estar mais do que uma “aposta”, estão a imagem e a reputação das corporações, atualmente expostas à grande visibilidade no mercado e aos humores da opinião pública. Entre osstakeholders não estão apenas o público externo, os membros da comunidade, na qual a empresa está inserida; mas também os públicos internos: acionistas, administradores, fornecedores, colaboradores etc.

Na ponte que liga os stakeholders ao universo jurídico e à mídia, temos no Brasil uma estrada em comum: a Lei Anticorrupção (12.846/2013), que responsabiliza a pessoa jurídica pela conduta ilícita na relação com o ente público, mesmo que o ato de corrupção tenha sido praticado por pessoa física que atue na organização, tendo contrato formal ou não, estando ou não no cumprimento de uma ordem direta de algum diretor ou chefe imediato.

No caso de ser flagrada em atividade ilícita, mesmo que faça acordo de leniência assumindo a culpa e se comprometendo a colaborar com as investigações, os danos à imagem e à reputação da organização serão inevitáveis. E a próxima fase a ser seguida será da exposição pública e de um longo período de administração de crise.

Contudo, há um passo anterior possível para prevenir ou pelo menos minorar esse risco: os programas de compliance. No entanto, as práticas da boa gestão vão além de regras jurídicas, que são importantes, porque delimitam o rito legal, mas é preciso ir mais fundo — envolver o público interno no comprometimento da cultura da boa gestão, da ética e da transparência.

De acordo com pesquisa da auditoria Delloitte , realizada com 103 empresas brasileiras, no ano passado, 65% delas têm programas de compliance para tentar conter ações delitivas. Uma das maiores empresas brasileiras teria sob investigação interna cerca de mil colaboradores. Todo esse esforço está diretamente relacionado à Lei Anticorrupção. No caso de ser flagrada em um ilícito, as ações desenvolvidas para coibir a corrupção será um “ativo” que pode ser utilizado para reduzir a pena no Judiciário, que pode chegar até a 20% do faturamento bruto da companhia, registrado no exercício do ano anterior.

O caminho que vai consolidar essa cultura interna anticorrupção, certamente passa pela comunicação, que é a atividade meio que viabiliza o fim almejado, com planejamento, estratégias, ações e linguagem adequada para se comunicar, da cúpula administrativa ao chão de fábrica, fazendo um trabalho de convencimento e de adesão à ideia-raiz do comprometimento com a ética. Os canais para essa comunicação das boas práticas de gestão, muitas vezes, já estão disponíveis na empresa, como a intranet, que pode ser utilizada para vídeos, animação etc.

Paralelamente é fundamental realizar um trabalho de relações com a mídia para que a percepção da sociedade e dos stakeholders também seja de que a empresa está engajada na luta contra a corrupção. Para tanto, será necessário trabalhar internamente e divulgar externamente a série de ações preventivas que foram realizadas, como treinamento de colaboradores e parceiros, campanhas e atividades ligadas ao seu compromisso com a ética corporativa, sendo que este “ativo” estará definitivamente vinculado à imagem e ao prestígio da empresa.

 

 

Autora: Santamaria Nogueira Silveira  é jornalista, doutora em Comunicação Social pela ECA-USP e coordenou a Assessoria de Imprensa da OAB-SP (1998-2014).

 


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