Autor: Fernando Salzer e Silva (*)
O novo Código de Processo Civil, Lei 13.105/2015, em vigor desde último 18 de março, entre suas inovações, através de seu artigo 183 e parágrafos, abaixo transcritos, concedeu à Advocacia Pública a prerrogativa da intimação pessoal, nas mesmas condições previstas para o Ministério Público[1] e Defensoria Pública[2].
“Art. 183. A União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e suas respectivas autarquias e fundações de direito público gozarão de prazo em dobro para todas as suas manifestações processuais, cuja contagem terá início a partir da intimação pessoal.
§ 1º A intimação pessoal far-se-á por carga, remessa ou meio eletrônico.
§ 2º Não se aplica o benefício da contagem em dobro quando a lei estabelecer, de forma expressa, prazo próprio para o ente público.”
O dispositivo supra, em seu parágrafo 1°, elenca as formas pelas quais poderá ser efetivada a intimação pessoal dos advogados públicos, sendo que as duas primeiras modalidades, carga e remessa, se referem aos processos que tramitam em meio físico e a última, meio eletrônico, em regra, aos que tem seu trâmite pelo ambiente eletrônico.
Ocorre que alguns juízes, em açodada e equivocada interpretação literal da norma, estão entendendo que a modalidade de intimação pessoal por meio eletrônico pode ser efetuada através do Diário da Justiça Eletrônico.
Tal entendimento, com o manejo correto da hermenêutica jurídica, não se sustenta, uma vez que para se aferir o real alcance da expressão “meio eletrônico”, necessário se faz o uso do método da interpretação sistemática, confrontando as normas do Código de Processo Civil com as disposições contidas na Lei Federal 11.419/2006, que dispõe sobre a informatização do processo judicial e dá outras providências, bem como com a Resolução 185/2013 do Conselho Nacional de Justiça, que institui o Sistema Processo Judicial eletrônico.
A parte final do parágrafo 2° do artigo 4° da Lei 11.419/2016, ao determinar expressamente que as publicações veiculadas no Diário de Justiça Eletrônico não podem ser utilizadas nos casos em que a lei prevê a intimação ou vista pessoal, já é o suficiente para derrubar o equivocado entendimento de parte da magistratura.
“Art. 4º Os tribunais poderão criar Diário da Justiça eletrônico, disponibilizado em sítio da rede mundial de computadores, para publicação de atos judiciais e administrativos próprios e dos órgãos a eles subordinados, bem como comunicações em geral.
(…)
§ 2º A publicação eletrônica na forma deste artigo substitui qualquer outro meio e publicação oficial, para quaisquer efeitos legais, à exceção dos casos que, por lei, exigem intimação ou vista pessoal.”
Se isso já não bastasse, a Resolução 185/2013 do CNJ, ao definir, em seu artigo 3°, inciso VI, o sentido da expressão “meio eletrônico”, e mais à frente, no parágrafo 1° do artigo 19, determinar que apenas serão consideradas vista pessoal os atos de comunicação que viabilizem o acesso à integra do processo correspondente, sepulta de vez o entendimento de que as publicações via Diário Judicial Eletrônico estariam abrangidas pela regra contida no parágrafo 1° do artigo 183 da Lei 13.105/2015.
“Art. 3º Para o disposto nesta Resolução, considera-se:
(…)
VI – meio eletrônico: ambiente de armazenamento ou tráfego de informações digitais;”
“Art. 19. No processo eletrônico, todas as citações, intimações e notificações, inclusive da Fazenda Pública, far-se-ão por meio eletrônico, nos termos da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006.
§ 1º As citações, intimações, notificações e remessas que viabilizem o acesso à íntegra do processo correspondente serão consideradas vista pessoal do interessado para todos os efeitos legais, nos termos do § 1º do artigo 9º da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006.”
Oportuno ressaltar que apesar do Diário de Justiça Eletrônico não ser o meio idôneo para realização das intimações ou vistas pessoais, todos os despachos, decisões interlocutórias, dispositivos das sentenças e ementas de acórdãos, ainda que dirigidos à Fazenda Pública, ao Ministério Público e à Defensoria Pública, deverão, em caráter informativo e em respeito ao princípio da publicidade dos atos judicias, continuar a ser normalmente publicados em tal meio, por força do parágrafo terceiro do artigo 205 do Código de Processo Civil.
“Art. 205. Os despachos, as decisões, as sentenças e os acórdãos serão redigidos, datados e assinados pelos juízes.
(…)
§ 3º Os despachos, as decisões interlocutórias, o dispositivo das sentenças e a ementa dos acórdãos serão publicados no Diário de Justiça Eletrônico.”
Demonstrado de forma irrefutável que as publicações veiculadas no Diário de Justiça Eletrônico não estão incluídas no alcance da expressão “meio eletrônico” contida no parágrafo 1° do artigo 183 do Código de Processo Civil, cabe também consignar que a pretensão de algumas serventias judicias, arrimadas na mesma expressão, de realizar as intimações pessoais dos Advogados Públicos via correio eletrônico, deverão, como não poderia ser diferente, observar os requisitos legais[3] e as normas editadas pelo Conselho Nacional de Justiça[4], sob pena das mesmas serem consideradas nulas.
No processo judicial eletrônico as comunicações via correio eletrônico não poderão ter caráter oficial, mas tão somente informativo, conforme previsto no parágrafo 4° do artigo 5° da Lei 11.419/2016.
“Art. 5º As intimações serão feitas por meio eletrônico em portal próprio aos que se cadastrarem na forma do art. 2o desta Lei, dispensando-se a publicação no órgão oficial, inclusive eletrônico.
(…)
§ 4º Em caráter informativo, poderá ser efetivada remessa decorrespondência eletrônica, comunicando o envio da intimação e a abertura automática do prazo processual nos termos do § 3º deste artigo, aos que manifestarem interesse por esse serviço.”
Na tramitação dos processos por meio físico, para a intimação dos advogados públicos, membros do Ministério Público e Defensoria Pública, via correio eletrônico, ser considerada válida, deverão ser observados os seguintes requisitos: a) por força dos artigos 246, parágrafo 1°[5] e 1.050[6], ambos do Código de Processo Civil, serem dirigidas exclusivamente aos endereços eletrônicos cadastrados por cada instituição junto à administração do respectivo Tribunal; b) permitir acesso à íntegra digitalizada do processo correspondente, conforme preceitua o parágrafo 1° do artigo 9°[7] da Lei 11.419/2006.
Em relação a intimação pessoal dos advogados públicos, outro ponto que merece destaque é que além das modalidades carga, remessa ou meio eletrônico, quando frustrada esta última ou nos casos de urgência devidamente fundamentada, tal ato processual também poderá ser realizado por oficial de justiça[8], observada a regra constante no parágrafo 3° do artigo 269 do Código de Processo Civil[9].
Finalmente, é de suma importância apontar que o entendimento até aqui exposto, bem como as regras trazidas pelo artigo 231 e incisos II, III, V, VI e VIII[10] do Código de Processo Civil, por força do artigo 6° da Lei Federal 12.153/2009, abaixo transcrito, também deverão ser observadas e seguidas no rito dos Juizados Especiais da Fazenda Pública, sendo afastada a aplicação de qualquer entendimento que não se coadune com tais disposições, como, por exemplo, o trazido pelo enunciado 13 do Fonaje[11] .
“Art. 6º Quanto às citações e intimações, aplicam-se as disposições contidas na Lei 5.869, de 11 de janeiro de 1973 – Código de Processo Civil.”
Assim, resta agora ao advogados públicos lutarem pela correta aplicação e observância de suas novas prerrogativas trazidas pelo novo Código de Processo Civil e aos juízes, desembargadores e ministros cumprir e fazer cumprir com exatidão as disposições legais[12].
1 Novo CPC – Art. 180. O Ministério Público gozará de prazo em dobro para manifestar-se nos autos, que terá início a partir de sua intimação pessoal, nos termos do art. 183, § 1º.
2 Novo CPC – Art. 186. A Defensoria Pública gozará de prazo em dobro para todas as suas manifestações processuais.
§ 1o O prazo tem início com a intimação pessoal do defensor público, nos termos do art. 183, § 1º.
3 Novo CPC – Art. 270. As intimações realizam-se, sempre que possível, por meio eletrônico, na forma da lei.
4 Novo CPC – Art. 196. Compete ao Conselho Nacional de Justiça e, supletivamente, aos tribunais, regulamentar a prática e a comunicação oficial de atos processuais por meio eletrônico e velar pela compatibilidade dos sistemas, disciplinando a incorporação progressiva de novos avanços tecnológicos e editando, para esse fim, os atos que forem necessários, respeitadas as normas fundamentais deste Código.
5 Novo CPC – Art. 246. A citação será feita:
(…)
§ 1o Com exceção das microempresas e das empresas de pequeno porte, as empresas públicas e privadas são obrigadas a manter cadastro nos sistemas de processo em autos eletrônicos, para efeito de recebimento de citações e intimações, as quais serão efetuadas preferencialmente por esse meio.
6 Novo CPC – Art. 1.050. A União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios, suas respectivas entidades da administração indireta, o Ministério Público, a Defensoria Pública e a Advocacia Pública, no prazo de 30 (trinta) dias a contar da data da entrada em vigor deste Código, deverão se cadastrar perante a administração do tribunal no qual atuem para cumprimento do disposto nos arts. 246, § 2º, e 270, parágrafo único.
7 Lei 11.419/2006 – Art. 9° No processo eletrônico, todas as citações, intimações e notificações, inclusive da Fazenda Pública, serão feitas por meio eletrônico, na forma esta lei.
§1° As citações, intimações, notificações e remessas que viabilizem o acesso à integra do processo correspondente serão consideradas vista pessoal do interessado para todos os efeitos legais.
8 Novo CPC – Art. 275. A intimação será feita por oficial de justiça quando frustrada a realização por meio eletrônico ou pelo correio.
9Novo CPC – Art. 269. Intimação é o ato pelo qual se dá ciência a alguém dos atos e dos termos do processo.
§ 3o A intimação da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e de suas respectivas autarquias e fundações de direito público será realizada perante o órgão de Advocacia Pública responsável por sua representação judicial.
10 Novo CPC – Art. 231. Salvo disposição em sentido diverso, considera-se dia do começo do prazo:
II – a data de juntada aos autos do mandado cumprido, quando a citação ou a intimação for por oficial de justiça;
III – a data de ocorrência da citação ou da intimação, quando ela se der por ato do escrivão ou do chefe de secretaria;
V – o dia útil seguinte à consulta ao teor da citação ou da intimação ou ao término do prazo para que a consulta se dê, quando a citação ou a intimação for eletrônica;
VI – a data de juntada do comunicado de que trata o art. 232 ou, não havendo esse, a data de juntada da carta aos autos de origem devidamente cumprida, quando a citação ou a intimação se realizar em cumprimento de carta;
VIII – o dia da carga, quando a intimação se der por meio da retirada dos autos, em carga, do cartório ou da secretaria.
11 FONAJE – ENUNCIADO 13 – Os prazos processuais nos Juizados Especiais Cíveis, contam-se da data da intimação ou ciência do ato respectivo, e não da juntada do comprovante da intimação, observando-se as regras de contagem do CPC ou do Código Civil, conforme o caso.
12 Lei Complementar 35/1979 – Art. 35 – São deveres do magistrado:
I – Cumprir e fazer cumprir, com independência, serenidade e exatidão, as disposições legais e os atos de ofício;
Autor: Fernando Salzer e Silva é procurador do Estado de Minas Gerais.