Autor: José Guilherme Rosa de Souza Soares (*)
A crise econômica que assola o país impõe, para a manutenção das empresas, planejamento das regras tributárias. As diversas atividades do cotidiano empresarial estão sujeitas a tributações, em decorrência da legislação aplicada pelo fisco em decorrência de fatos geradores.
Toda regra tributária tem suas exceções, classificadas dentre imunidades e isenções, acontece que o acesso ao deferimento das isenções nem sempre é um papel simples aos beneficiários, isso decorrente de interpretações protecionistas pelo lado de quem analisa os pedidos feitos pelos interessados.
Dentre os impostos existentes, temos o Imposto de Transmissão de Bens Imóveis, incidindo basicamente na transmissão e cessão da propriedade, do domínio útil e de direitos reais sobre bens imóveis.
O ITBI é inicialmente tratado na Constituição Federal em seu artigo 156, que diz: “Compete aos Municípios instituir impostos sobre: II – transmissão “inter vivos”, a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição”.
Embora seja uma matéria que poderia ser regulamentada pelos próprios municípios, o constituinte optou por bem, garantir algumas isenções, como a prevista no artigo 156, §2º, I: “§ 2º O imposto previsto no inciso II: I – não incide sobre a transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital, nem sobre a transmissão de bens ou direitos decorrente de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica, salvo se, nesses casos, a atividade preponderante do adquirente for a compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil”.
No Código Tributário Brasileiro, a matéria é tratada inicialmente no artigo 35, mas no momento a transcrição que nos interessa é a do artigo 36, com a seguinte redação:
Art. 36. Ressalvado o disposto no artigo seguinte, o imposto não incide sobre a transmissão dos bens ou direitos referidos no artigo anterior:
I – quando efetuada para sua incorporação ao patrimônio de pessoa jurídica em pagamento de capital nela subscrito;
Como visto, a regra é claramente repetida com base na Constituição Federal, não sendo diferente, por exemplo, em Campo Grande. Na capital de Mato Grosso do Sul, a regulamentação é tratada através da Lei 2.592/1989, iniciando a matéria de não incidência em seu artigo 4º:
“Art. 4º da Lei revela que O Imposto não incide sobre a transmissão de bens imóveis, mediante ato oneroso “inter-vivos”, ou direito a eles relativos, quando:
[…]
III – transfere para incorporação ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital”
A fundamentação jurídica que exclui a incidência do ITBI quanto à transferência de imóvel para a integralização do capital social é clara e disciplinada tanto em matéria constitucional bem como infraconstitucional, todavia, é imperiosa a análise de algumas regras para garantir a isenção, como a contida na transcrição do art. 5º da Lei n. 2.592/89 que é fiel ao texto constitucional:
Art. 5º – O disposto no artigo anterior não se aplica quando a pessoa jurídica adquirente tenha como atividade preponderante a compra e venda de imóveis ou direitos a eles relativos, a locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil ou, ainda, a aquisição de direitos relativos a imóveis.
§ 1º – Considera caracterizada a atividade preponderante referida neste artigo, quando mais de 50% da receita operacional da pessoa jurídica adquirente, nos dois anos anteriores e nos dois subsequentes à aquisição, decorrerem de transações mencionadas neste artigo.
§ 2º- Se a pessoa jurídica adquirente iniciar suas atividades após a aquisição onerosa, há menos de dois anos antes dela, apurar- se-á preponderância referida no parágrafo anterior, levando em conta três primeiros anos seguintes à data da aquisição.
§ 3º – Verificada a preponderância referida neste artigo, tornar- se-á devido o imposto, nos termos da lei vigente à data da aquisição, sobre o valor do bem ou direito nesta data.
Nesse ínterim, cabe uma análise crítica acerca da redação inserta no parágrafo 2º. Pela leitura do dispositivo legal, acredita-se que houve um equívoco na redação, porquanto faltou inserir antes da expressão “há menos” a preposição “ou”, pois é essa a redação do CTN e da Constituição de 1988, cuja reprodução fiel foi feita pela Lei Municipal 2.592/1989.
Nota-se que é plenamente possível, iniciar uma nova atividade integralizando ao patrimônio social um imóvel e garantindo ainda a isenção do ITBI como base na exposição acima, cabendo à observância que tal situação impõe à imunidade uma condição resolutiva, garantindo a não incidência do ITBI na integralização de imóveis no capital social da impetrante, até que se cumpra tal requisito.
Assim, deve ser aferida, pelo Fisco, a preponderância da atividade empresarial levando em consideração os três primeiros anos posteriores à data da aquisição do imóvel, e, se após os três primeiros anos da aquisição, a Administração Pública aferir, que a atividade da empresa é predominantemente a venda ou locação de propriedades imobiliárias, aí, então, o lançamento do imposto poderá ser efetuado, por se encaixar na ressalva prevista no artigo 156, parágrafo 2º, da Constituição, ficando ainda a empresa sujeita as penalidades pelo não pagamento do tributo.
Dessa forma, considerando a vinculação do princípio da legalidade aos atos da administração pública (artigo 37), a exigência de requisitos além dos contidos na legislação, torna-se o ato ilegal exposto à impugnação por recurso administrativo ou até mesmo judicial, como o mandado de segurança, a não isenção do ITBI para transferência de imóvel a titulo de integralização de capital social para empresas que iniciam suas atividades após integralização do capital.
Temos exemplo no estado de Mato Grosso do Sul, onde há casos em que a negativa da isenção para novas empresas deu origem a processos judiciais visando assegurar o direito à isenção, que graças à boa atuação dos órgãos integrantes, garantiu aos suplicantes a ordem. Vejamos:
APELAÇAO E REEXAME NECESSÁRIO – MANDADO DE SEGURANÇA – TRIBUTO ITBI – HIPÓTESE DE TRANSMISSAO DE IMÓVEL INCORPORADO À PESSOA JURÍDICA A TÍTULO DE INTEGRALIZAÇAO DO CAPITAL SOCIAL SUBSCRITO – NAO INCIDÊNCIA -APLICAÇAO DO ARTIGO 156, § 2º, INCISO I DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL E LEGISLAÇÃO DO MUNICÍPIO RECORRENTE – RECURSOS CONHECIDOS E IMPROVIDOS (AC 3.553 MS 2012.003553-6 – Des. Marco André Nogueira Hanson – Julgamento 03/04/2012 – 3ª Câmara Cível)
Pelo estudo, podemos concluir ser plenamente possível obter a isenção tributária do ITBI para integralizar o capital social com imóvel, mesmo que a atividade se inicie após a aquisição do imóvel, não sendo legal a exigência de requisitos não definidos em Lei para o deferimento da isenção.
Autor: José Guilherme Rosa de Souza Soares é advogado, pós-graduado em Direito Público, consultor jurídico empresarial e procurador-geral do município de Corguinho (MS).