Autoras: Valeria Zotelli e Paola Esotico (*)
Diversas pessoas jurídicas vêm sendo surpreendidas com autuações e protestos visando à cobrança de multas em decorrência da falta de registro eletrônico de documento fiscal no sistema da Nota Fiscal Paulista, o que, por consequência, acarreta o não repasse dos créditos de ICMS aos consumidores.
A partir da edição da Lei Paulista 12.685/2007, os comerciantes estabelecidos no estado de São Paulo passaram a ser obrigados a fornecer a Nota Fiscal Paulista, sempre que solicitada pelo consumidor, com registro do seu CPF ou CNPJ, bem como a enviar o respectivo arquivo eletrônico à Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo.
De acordo com a legislação de regência da matéria, se apesar de a nota fiscal ser emitida, o comerciante não a registrar no sistema da Secretaria da Fazenda dentro do prazo fixado, poderá ser apenado com multa de 100 Ufesps (Unidade Fiscal do estado de São Paulo), que, atualmente, representa R$ 2.355,00 por documento fiscal. Isso porque, sem o lançamento de uma nota no respectivo sistema, o consumidor não consegue ter acesso ao crédito de ICMS gerado pela compra.
As autuações são feitas pelo Procon-SP em parceria com a Secretaria da Fazenda de São Paulo, e têm origem a partir de reclamações dos clientes, adquirentes das mercadorias. Por ser definida em montante fixo e não levar em consideração o valor da operação, referida multa pode ultrapassar em muito o imposto envolvido, razão pela qual diversos contribuintes têm se socorrido do Poder Judiciário para afastá-la.
Multas nesse patamar acabam sendo confiscatórias e desproporcionais à gravidade da infração, dado que, na maioria das vezes, não há que se falar em dolo, fraude, simulação ou qualquer dano ao erário, ao passo que o imposto da operação é regularmente recolhido pelo contribuinte.
Destaca-se que, quando da implantação da nota fiscal paulista, muitos problemas técnicos ocorreram, de modo que, em inúmeros casos, o não registro da nota fiscal se dava por inconsistências do próprio sistema de processamento de dados do Estado.
Apesar de não ter enfrentado especificamente a presente questão, ressalta-se que o Supremo Tribunal Federal, ao analisar a impossibilidade de multas terem caráter confiscatório, já se manifestou no sentido de que aquelas exigidas pelo não recolhimento de tributos não devem ultrapassar o valor de 100% do valor devido na operação.
Em outro caso, o Supremo também entendeu que qualquer penalidade pecuniária oriunda do descumprimento de obrigações tributárias, sejam elas principais ou acessórias, não podem revestir-se de efeito confiscatório, razão pela qual a penalidade foi reduzida para 25% por cento do valor da operação.
Ao analisar uma autuação por falta de registro de documento no sistema da Nota Fiscal Paulista, o Tribunal de Justiça de São Paulo acabou por concluir que, por se tratar de multa aplicada pelo Procon, deveriam ser respeitados os limites previsto pela legislação consumerista à multa combatida.
De acordo com o Código do Consumidor, a multa deve ser graduada de acordo com a gravidade da infração, a vantagem auferida e a condição econômica do fornecedor. Assim, considerando que no caso das multas da Nota Fiscal Paulista não há qualquer vantagem ao fornecedor, tampouco prejuízo ao Fisco, tendo em vista que o ICMS incidente na operação é efetivamente destacado e recolhido, o Tribunal Paulista concluiu pelo cancelamento da autuação.
Em suma, os tribunais têm concluído que as infrações aplicadas pelo Procon são abusivas, uma vez podem chegar a superar 200% do valor do imposto incidente na operação e não levam em consideração a boa-fé do contribuinte, tampouco a ausência de prejuízo ao Fisco, razão pela qual tais multas se mostram desproporcionais e confiscatórias.
Por derradeiro, também é importante notar que a legislação estadual do ICMS possui previsão legal permitindo a redução ou exclusão de multas relativas a este imposto quando o contribuinte tiver agido de boa-fé e a infração não implicar ausência do pagamento do tributo exigido, como é o caso.
Verifica-se, deste modo, que os contribuintes têm inúmeros argumentos de defesa para combater as exigências perpetradas pelo Procon em razão da ausência de registro, ou registro a destempo, do documento fiscal no sistema da Nota Fiscal Paulista.
Autoras: Valeria Zotelli é advogada, sócia do escritório Miguel Neto Advogados, mestre em Direito Tributário pela PUC-SP, professora convidada em cursos de especialização e MBA.
Paola Esotico é advogada do escritório Miguel Neto Advogados.