Autor: Antonio Roque Citadini (*)
Não passou uma semana do anúncio de que o Governo Paulista iria promover uma série de contratações pelo sistema de Parceria Público-Privada (PPP) para a expansão no Metrô e veio a notícia de que a Linha-6, cujo sistema é uma PPP, está paralisada.
O modelo PPP vem sendo adotado — sem muito cuidado — em todas as áreas da Administração Pública.
Esta modalidade de negócio surgiu com as dificuldades financeiras dos estados. Sem dinheiro para realizar as obras de infraestrutura etc.) o Estado buscou no setor privado o parceiro para realizar os empreendimentos.
Assim, pela lógica original, o setor público entra com algum recurso, o privado, com outros e, após a conclusão da obra, a exploração pelo ente privado trará o retorno do investimento.
Como a regra era de que o serviço seria cobrado, o Estado pagaria através de tarifas, pedágios ou taxas arrecadadas.
Três partes são claras na PPP: o Privado — que entra com algum dinheiro e realiza e explora as obras; o Estado — que faz algum aporte e remunera as empresas de acordo com o risco do negócio; e a população usuária que pagará pelo serviço.
Assim, se o negócio tiver grande risco (como diminuição das tarifas, pedágios, etc.) a remuneração será maior. Se o risco for baixo, a parte que cabe ao ente privado será menor.
Essa é a versão original das PPPs.
O que vem ocorrendo aqui é longe disso.
O setor privado — sempre exaltado — não aporta os recursos próprios, mas “viabiliza” recursos através de bancos públicos. Quase sempre usando a “força política” dos agentes públicos para pressionar órgãos a liberarem dinheiro. Sem a entrada do agente público na briga, fica difícil sair o dinheiro para o ente privado.
Na esmagadora maioria das PPPs, o risco do privado é zero. Como no caso do Metrô — Linha Amarela, onde sua tarifa, fosse 1 ou 1 mil, tanto faz, já que o Estado remunerará os parceiros.
Em muitos casos, não há nem de forma simbólica, a participação do cidadão através da remuneração de serviços. Em alguns Estados — como é o caso de Minas Gerais — tivemos a construção de escolas, que, como sabemos, serão pagas só pelo Tesouro e não pelos alunos. A adoção de PPPs para construção de presídios é outra distorção clara desta modalidade, já que os apenados não pagam a cadeia. Só a Fazenda Pública faz isso, e o risco não existe.
Tão preocupante como estas distorções acima lembradas é o quadro dramático que pode trazer as PPPs: o Estado ficar com uma conta de desembolsos futuros tão alta que passe a comprometer cada vez mais suas receitas futuras para pagar as parcerias realizadas.
Este é o drama de hoje em grande número de países da Europa. Realizaram todo tipo de obra pelo sistema PPPs e hoje vivem para pagar juros e desembolsar dinheiro para os entes privados.
Dizem que no Brasil este risco não existiria, por termos limitações no orçamento, mas, com a queda de receitas dos últimos anos, o alarme já soou e muitos Estados terão dificuldade em pagar os contratos realizados.
O modelo das PPPs é interessante, mas não é o remédio ideal para todos os males. Não existe um Setor Privado cheio de dinheiro e benesses, querendo realizar as obras de infraestrutura. No máximo, são mais eficientes em buscar empréstimos, usando a pressão do Estado, quando não querendo o próprio Estado como avalista.
A retirada de todo risco da PPP desvirtua o modelo e o torna uma mera obra estatal, com todas as garantias a quem realizou.
Igualmente é necessária a participação do contribuinte em taxas, tarifas, pedágios, sob pena de tornar-se uma mera obra realizada com pagamento (caro) e futuro do Estado.
A PPP não é a solução para tudo e deve ser usada com muito cuidado, pois — como na Europa — pode tornar-se uma monstruosa dívida do Estado.
Antonio Roque Citadini é conselheiro-decano do Tribunal de Contas de São Paulo (TCE-SP).