Autor: Sergio Pinto Martins (*)
Habitualmente é observado na imprensa o discurso no sentido de que há déficit do sistema de Previdência Social. O objetivo é, pela reiteração e insistência, tentar fazer com que as pessoas acreditem que de fato isso existe. Na Segunda Guerra Mundial, a propaganda nazista, atribuída a Paul Joseph Goebbels, era no sentido de que a mentira afirmada repetidamente acabaria convencendo e se tornaria verdade. Não se pode ter essa concepção.
A reforma é necessária pelo aspecto que o homem vive mais tempo em razão dos progressos da medicina, a mulher tem um número menor de filhos, o desemprego e a informalidade fazem com que um menor número de pessoas contribua para o sistema e da diminuição da relação de ativos custeando os inativos.
Faz referência a Constituição a diversas fontes de custeio da Seguridade Social: I- do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, incidentes sobre: a- a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício; b- o faturamento, que são duas as contribuições: a COFINS (Lei Complementar 70/91) e PIS (Lei Complementar 7/70); c- o lucro (Lei 7.689/88); II- do trabalhador e dos demais segurados da previdência social, não incidindo contribuição sobre aposentadoria e pensão concedidas pelo regime geral de previdência social; III- sobre a receita dos concursos de prognósticos; IV- do importador de bens ou serviços do exterior ou de quem a lei a ele equiparar (artigo 195).
São, ainda, receitas da Seguridade Social: I – as multas, a atualização monetária e os juros moratórios; II – a remuneração recebida por serviços de arrecadação, fiscalização e cobrança prestados a terceiros; III – as receitas provenientes de prestação de outros serviços e de fornecimento ou arrendamento de bens; IV – as demais receitas patrimoniais, industriais e financeiras; V – as doações, legados, subvenções e outras receitas eventuais; VI – 50% dos valores recuperados a título de tráfico de entorpecentes; VII – 40% do resultado dos leilões dos bens apreendidos pelo Departamento da Receita Federal; VIII – outras receitas previstas em legislação específica (artigo 27 da Lei 8.212). Cinquenta por cento do prêmio do seguro obrigatório de veículos automotores de vias terrestres deve ser destinado ao Sistema Único de Saúde (SUS), para custeio da assistência médico-hospitalar dos segurados vitimados em acidentes de trânsito.
Os dados apresentados na imprensa indicam, porém, todas as despesas, mas não incluem todas as receitas, especialmente da Cofins, da contribuição sobre o lucro e do PIS/Pasep.
Existe fundamento constitucional no artigo 76 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias para a transferência de recursos da Seguridade Social para outros fins. Ele foi acrescentado pela Emenda Constitucional 27, de 22 de março de 2000, que estabeleceu que no período entre 2000 a 2003 20% da arrecadação de contribuições sociais da União, já instituídos ou que vierem a ser criados no referido período, seus adicionais e respectivos acréscimos legais, seria desvinculado de órgão, fundo ou despesa. A Emenda Constitucional 42/2003 prorrogou o período de 2003 a 2007. A Emenda Constitucional 93/16 ampliou o porcentual de desvinculação de recursos da União (DRU), passando a prever que são desvinculados de órgão, fundo ou despesa, até 31 de dezembro de 2023, 30% da arrecadação das contribuições sociais da União. Agora, o porcentual não é de 20, mas de 30%. Entretanto, isso não pode ser uma regra permanente. Deveria ser uma regra constitucional transitória, mas vai se prolongando no tempo.
Nota-se, portanto, ser contraditória a afirmação de que não há recursos suficientes ou existe déficit do sistema, mas 30% das contribuições da Seguridade Social são usadas para pagar outras contas do Estado e não os benefícios da Seguridade Social.
No ano 2000, a arrecadação da contribuição sobre o lucro foi de R$ 8,665 bilhões e somente R$ 4,441 bilhões foram destinados à Seguridade Social. A Cofins no de 2000 arrecadou R$ 38,634 bilhões, sendo que R$ 21,553 bilhões foram destinados para outros fins, mas não para a Seguridade Social.[1] A CPMF arrecadou em 2000 R$ 14,397 bilhões, mas só foram destinados R$ 11,753 bilhões para a Saúde.
Foi feito repasse no ano de 2001 de R$ 31,5 bilhões para o Orçamento Fiscal da União, mas a arrecadação de contribuições sociais foi de R$ 136,879 bilhões. O objetivo parece ter sido gerar superávit primário.
Informou o Ministério do Planejamento que em 2013 o déficit do sistema seria de R$ 83,66 bilhões. Em 2015, o déficit do sistema teria sido de R$ 86 bilhões em 2015.
De acordo com dados da Anfip e da Fundação Anfip, em 2005 o sistema teve superávit de R$ 73,5 bilhões; em 2006, R$ 60,2 bilhões; em 2007, R$ 72,9 bilhões; em 2008, R$ 64,9 bilhões; em 2009, R$ 33,1 bilhões; em 2010, R$ 55,5 bilhões; 2011, R$ 76,6 bilhões; em 2011, R$ 76,6 bilhões; em 2012, R$ 81,4 bilhões; em 2013, R$ 78,6 bilhões, em 2014, R$ 53,8 bilhões.
Não acredito em déficit da Previdência Social. Logo, por esse motivo não era o caso de se falar em reforma da Previdência Social.
Há outras formas de aumentar a arrecadação da contribuição previdenciária, como de er feita maior fiscalização nos empregadores e cobrança da dívida ativa da Seguridade Social em relação às empresas. Na prática, a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional não consegue cobrar 1% da Dívida Ativa da União, seja porque as empresas desapareceram, porque não há bens a penhorar, porque os sócios não têm patrimônio, etc.
Têm sido obtidos resultados positivos com o recadastramento dos aposentados e pensionistas, evitando que pessoas falecidas continuem recebendo benefícios. Meu pai, por exemplo, faleceu em São Paulo, em 2002, e, no mesmo dia, sua aposentadoria foi cancelada. Não é possível que em certos locais pessoas mortas continuam recebendo benefícios, se há necessidade de comunicação do falecimento da pessoa pelo Cartório ao INSS.
Por outro lado, é necessário fazer a economia voltar a funcionar normalmente. As empresas, assim, poderiam voltar a produzir na capacidade que tinham anteriormente. Os trabalhadores poderão ter renda para comprar os produtos e, assim, serão criados empregos e as empresas poderão crescer. Era a hipótese de se adotar os fundamentos do New Deal, de Roosevelt, no sentido de que o governo deve promover políticas públicas e obras públicas para impulsionar a economia. Estando os trabalhadores empregados ou prestando serviços, haverá maior arrecadação da contribuição previdenciária e, por esse ângulo, não será necessária reforma previdenciária.
Autor: Sergio Pinto Martins é desembargador do