A Seção Especializada em Dissídios Coletivos (SDC) do Tribunal Superior do Trabalho proveu parcialmente recurso ordinário do Sindnações para declarar não abusiva a greve realizada de 1º a 15/12/2014 por empregados da Embaixada do Reino dos Países Baixos. A decisão reformou entendimento do Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região (DF/TO), que extinguiu o processo por ausência de comum acordo e impossibilidade jurídica da pretensão econômica contra pessoa jurídica de direito público, nos termos da Orientação Jurisprudencial (OJ) 5 da SDC.
O dissídio coletivo de greve foi ajuizado pelo Sindicato Nacional dos Trabalhadores em Embaixadas, Consulados, Organismos Internacionais e Empregados que Laboram para Estado Estrangeiro ou para Membros do Corpo Diplomático Estrangeiro no Brasil (Sindnações) contra a embaixada, apresentando vários pedidos: declaração de não abusividade da paralisação e deferimento das cláusulas reivindicadas pela categoria, como correção salarial pelo IPCA, auxílio-alimentação de R$ 500 e auxílio-transporte.
A relatora do recurso no TST, ministra Maria Cristina Peduzzi, destacou que a greve foi deflagrada em observância aos três requisitos exigidos pela Lei 7.783/1989: tentativa efetiva de negociação coletiva; aprovação da categoria; e aviso-prévio ao empregador. Por isso, a SDC declarou a não abusividade da paralisação. Porém, quanto às cláusulas econômicas requeridas, a ministra avaliou que a situação era diferente da declaração de abusividade ou não da greve.
Para Peduzzi, a extinção do processo sem resolução do mérito deveria ser mantida quanto aos pedidos de caráter econômico. Ela esclareceu que qualquer concessão de direitos, além dos previstos nas leis locais, só pode decorrer de ato praticado no exercício da soberania do Estado estrangeiro. “Não estamos aqui tratando de mera aplicação do Direito, mas de criação do Direito, com conteúdo econômico-financeiro”, enfatizou.
Questão de soberania
Depois de ter seus pedidos negados pelo TRT, o Sindnações recorreu ao TST, sustentando que a OJ 5 faz referência às pessoas jurídicas de Direito Público interno (nacionais), e não externo (estrangeiras). A impossibilidade jurídica do pedido fundamenta-se em artigos da Constituição Federal que impedem o aumento de despesa de ente público com pessoal, sem previsão em lei específica e prévia dotação orçamentária. Para o sindicato, os Estados estrangeiros não estariam sujeitos a essas disposições constitucionais, seguindo regime jurídico idêntico ao empregador nacional comum por praticar atos de gestão.
A ministra Peduzzi explicou que, quando se trata de reclamações trabalhistas, a jurisprudência nacional é de que a contratação de empregados pelas entidades de Direito Público externo constitui ato de gestão não abrangido pela imunidade de jurisdição, pois o ente estrangeiro agiria como particular, sem demandar tratamento jurídico especial. “Ao contratar trabalhadores no Brasil, o Estado estrangeiro se submete ao cumprimento das condições de trabalho previstas no direito local, conforme o artigo 41 da Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas, promulgada no Brasil pelo Decreto 56.435/1965“, afirmou.
Restrição ao poder normativo
No entanto, em dissídio coletivo ajuizado para fixar condições de trabalho via exercício do poder normativo do Judiciário, “não há mera aplicação do direito local, mas criação de norma destinada a regular todas as relações de trabalho”, salientou Peduzzi. Nesse sentido, acrescentou que, em ofício enviado ao Sindnações, a embaixada esclareceu que não tem autonomia para decidir todos os assuntos e depende de posicionamento do Ministério das Relações Exteriores dos Países Baixos.
A ministra explicou que, nesse caso, se aplica a OJ 5 da SDC, que, diante da autonomia e da autoadministração dos entes de Direito Público interno, assevera a impossibilidade de fixar condições de trabalho com conteúdo econômico via poder normativo do Judiciário. Da mesma forma, no plano internacional, pois a gestão orçamentária, financeira e patrimonial das entidades de Direito Público externo está relacionada ao exercício de sua soberania, que seria violada com a fixação de condições econômicas de trabalho via poder normativo.
“Nesse contexto, seria contraditório admitir dissídio coletivo contra Estado estrangeiro, já que, se as mesmas reivindicações fossem deduzidas contra pessoa jurídica de Direito Público interno, o processo seria extinto sem resolução do mérito por esta Corte”, ressaltou.
A decisão da SDC foi por maioria de votos, vencido o ministro Maurício Godinho Delgado, que dava provimento amplo ao recurso ordinário e determinava o envio do processo ao TRT para exame dos pedidos de conteúdo econômico. Fizeram ressalvas de fundamentação as ministras Maria de Assis Calsing e Kátia Magalhães Arruda.
Processo: RO-472-12.2014.5.10.0000
Fonte: www.tst.jus.br