Autor: Gilson Rasador (*)
Como é de conhecimento geral, a maioria das Unidades da Federação passam por gravíssima crise financeira e é urgente que tomem medidas responsáveis e legais para não comprometer os serviços que lhe são próprios e obrigatórios, embora no atual cenário é pouco provável que consigam resultados satisfatórios no curto e médio prazo.
A par disso, é também sabido que diversos estados concederam incentivos fiscais e financeiros vinculados ao ICMS, visando atrair investimentos para seus territórios em setores industrial, comercial e de serviços para incremento da atividade econômica, bem como para criar novas vagas de trabalho, embora muitos dos atos que criaram benefícios tenham sido declarados inconstitucionais.
Atraídos pela promessa de redução da escorchante carga tributária, muitas empresas investiram pesado na implantação ou na transferência de plantas industriais para regiões de incentivos fiscais, como forma de reduzir seus preços e ampliar a participação de seus produtos e serviços no mercado.
Entretanto, o que de início representou importante fonte de receitas para os Estados e vantagem competitiva, com o passar do tempo se tornou grande dor de cabeça para muitos empresários, que se viram em meio a verdadeiras guerras fiscais travadas entre Estados que concediam incentivos fiscais e aqueles destinatários de mercadorias produzidas em regiões incentivadas.
Num primeiro momento, Estados que se sentiram prejudicados com a concessão de incentivos fiscais sem o necessário aval do Conselho de Política Fazendária (Confaz), passaram a questionar e obtiveram êxito no Supremo Tribunal Federal em ações de inconstitucionalidade de benefícios irregularmente concedidos.
Paralelamente a isso, os órgãos de Fiscalização das Fazendas de Estados consumidores, especialmente das Regiões Sul e Sudeste, passaram a vedar créditos de ICMS para empresas estabelecidas em seus territórios que adquirissem mercadorias beneficiadas com incentivos fiscais, apenas admitindo crédito correspondente ao valor do imposto efetivamente pago.
Com isso, perderem a vantagem competitiva, pois não tendo o adquirente direito ao crédito integral do ICMS, o custo da mercadoria acaba sendo maior do que o de mercadoria adquirida de fornecedor que não aproveite incentivo fiscal. Além disso, há risco de terem de devolver o montante correspondente aos incentivos fiscais utilizados após declaração de inconstitucionalidade das normas que instituíram ditos benefícios.
Não bastassem tais fatos, que fizeram com que muitas empresas desativassem plantas industriais ou centros de distribuição instalados em regiões de incentivos fiscais, mais uma dificuldade vem sendo criada com o pomposo nome de Fundo Estadual de Equilíbrio Fiscal – FEEF, instituído sem a menor preocupação com aspectos constitucionais.
De fato, com alicerce no Convênio ICMS 42, de 2016, aprovado no âmbito do Confaz para autorizar a criação de condições para fruição de incentivos fiscais do ICMS, os Estados vêm editando leis e regulamentos para determinar que as empresas beneficiárias de incentivos fiscais ou financeiros depositem naquele fundo o equivalente a, no mínimo, 10% do respectivo benefício.
Tais normas padecem de vícios insanáveis, posto que, ao lado de não se encontrar autorização para sua instituição na Constituição Federal, afrontam o artigo 167, IV, que veda a vinculação de receitas de impostos a órgão, fundo ou despesas, não autorizada pela lei Maior.
Não há dúvidas de que o indigitado fundo de equilíbrio fiscal tem natureza tributária, pois corresponde a uma fatia do próprio ICMS objeto da dispensa de pagamento e, tendo essa natureza, um quarto do valor arrecadado deveria ser destinado aos Municípios, de acordo com o critério constitucional de repartição das receitas de impostos.
Ademais, os incentivos fiscais concedidos pelos Estados têm, em sua ampla maioria, têm natureza contratual, são onerosos, sob determinadas condições e por prazo certo. De sorte que representa violação a ato jurídico perfeito e a direito adquirido, além de ludibriar a boa-fé daqueles que confiaram no Poder concedente, qualquer norma que venha impor condições lá não previstas.
Por estas razões, os empresários que fizeram e continuam fazendo altos investimentos e mantendo quadro de trabalhadores em estabelecimentos localizados em áreas incentivadas, não podem ter reduzida, durante a vigência dos respectivos contratos de incentivos fiscais ou financeiros, a contrapartida ajustada com os Estados, sob pena de menosprezo à Constituição Federal.
Cabe referir ainda que, se superadas forem as barreiras da inconstitucionalidade aqui indicadas, o pagamento destinado ao FEEF só poderia ser exigido a partir de janeiro de 2017, pois trata-se de majoração de tributo que deve obedecer à regra da anualidade.
Por fim, mas não menos importante, é o fato que decorre da aprovação do convenio ICMS aqui mencionado, pela unanimidade dos membros que integram do Confaz. Na medida em que as Unidades Federação autorizam a cobrança de fundo sobre o valor dos incentivos fiscais concedidos, mesmo que sem o aval do Confaz, estão convalidando tais incentivos, não podendo mais questioná-los nas cortes judiciais.
Autor: Gilson Rasador é especialista em direito tributário. Sócio do Piazzeta, Boeira e Rasador Advogados.