Autor: Luiz Gustavo de Oliveira Ramos (*)
O ano não foi fácil para ninguém — um lugar comum que é impossível de evitar, ao se fazer uma retrospectiva de 2016 para o setor das telecomunicações. Com a retração de investimentos e do mercado de consumo, não faltaram aos departamentos jurídicos e escritórios de advocacia problemas sobre os quais se debruçar. Mas, não há dúvida alguma, discussões jurídicas relevantes tomaram conta do país e, embora sem uma definição, o balanço geral do ano pode fazer com que vejamos 2017 com mais esperança.
Dentre os temas que geraram grandes debates, está o da limitação de dados da internet. Em 22 de abril, o Conselho Diretor da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) decidiu proibir as operadoras de reduzir a velocidade, suspender o serviço ou cobrar pelo tráfego excedente nos casos em que os consumidores utilizarem toda a franquia contratada. Tratava-se, porém, de uma decisão provisória, que deveria valer até que a agência examine o assunto em maior profundidade e o regulamente de forma definitiva.
Na mesma linha, foram apresentados projetos de lei pelos senadores Ricardo Ferraço (PSDB-ES) e Eunício Oliveira (PMDB-CE), com a vedação à implementação de limites de consumo nas franquias. Apresentou-se, ainda, o Projeto de Decreto Legislativo (PDS) 14/2016, do senador Cássio Cunha Lima (PSDB-PB), sustando o trecho da Resolução 614/2013, da Anatel, que autoriza as operadoras a limitar as franquias e a cobrar mais pelo consumo excedente de dados ou a reduzir a velocidade de acesso. Todos esses projetos, porém, chegam ao final do ano sem terem sido aprovados pelo Congresso.
Grande repercussão tiveram, também, as sucessivas ordens judiciais que determinaram a suspensão do WhatsApp, causando transtornos a milhões de pessoas que se utilizam do aplicativo para suas comunicações do dia a dia, tanto no âmbito pessoal como no profissional. A pretexto de se punir a empresa pela falta de cooperação com a Justiça, decisões oriundas dos estados de Sergipe e do Rio de Janeiro acabaram por penalizar a população.
Foi necessária a intervenção do Supremo Tribunal Federal, em medida cautelar na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 403. Ao deferir a liminar, o ministro Ricardo Lewandowski ressaltou que a suspensão do WhatsApp é medida desproporcional e que viola o preceito fundamental da liberdade de expressão, “quando mais não seja por gerar insegurança jurídica entre os usuários do serviço, ao deixar milhões de brasileiros sem comunicação entre si”.
O mês de junho chegou e trouxe na bagagem o maior pedido de recuperação judicial da história. Com dívidas de mais de R$ 65 bilhões, a Oi foi ao Poder Judiciário se socorrer da proteção legal destinada às empresas em situação de momentânea insolvência. Mais de 450 mil processos judiciais movidos contra a Oi, em todo o país, foram suspensos pela decisão que deferiu o processamento da recuperação judicial. A empresa obteve, ainda, a suspensão das cláusulas contratuais que autorizariam seus fornecedores a rescindir os contratos em razão do pedido de recuperação judicial.
No início de setembro, a Oi apresentou seu plano de recuperação, propondo conversão de dívidas em ações, longas carências para a realização de pagamentos e benefícios a credores que se dispuserem a investir recursos na empresa. Além disso, o plano prevê a venda da área de telefonia móvel, passando a empresa a se concentrar, principalmente, na banda larga fixa.
Porém, antes que o plano fosse às assembleias para a aprovação dos credores, o juiz determinou a realização de mediação entre a Oi e a Anatel, para discussão do pagamento de cerca de R$ 11 bilhões em multas aplicadas pela agência. Assim, o ano chega ao fim, sem que haja, ainda, a definição do futuro da Oi.
Já se aproximava o final do ano quando, em 30 de novembro, chegou ao Senado Federal o Projeto de Lei da Câmara (PLC) 79, que promove alterações no marco regulatório das telecomunicações. Em 13 artigos, o projeto altera a Lei Geral de Telecomunicações (Lei 9.472/1997) para permitir a adaptação da modalidade de outorga de serviços de telecomunicações, de concessão para autorização, bem como a transferência para o regime privado de serviços que, de acordo com o texto vigente, só podem ser prestados em regime público, como é o caso do Serviço Telefônico Fixo Comutado (STFC).
Na avaliação dos senadores, o projeto é benéfico ao país, por aumentar a atratividade de investimentos para as telecomunicações, aliviando as empresas das obrigações de universalização dos serviços e afastando a exigência de reversão dos bens usados na sua prestação, o que ocorre no término dos contratos de concessão. Os críticos ao projeto, contudo, o veem como uma medida cujo propósito é o de socorrer a Oi, transferindo àquela empresa cerca de R$ 9 bilhões em bens reversíveis, um prejuízo ao patrimônio público que será ainda maior se forem considerados todos os bens que se encontram em mãos das demais operadoras.
Em 6 de dezembro, o projeto foi aprovado em decisão terminativa pela Comissão Especial do Desenvolvimento Nacional e, desse modo, poderia seguir diretamente para sanção presidencial. A senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM) anunciou, porém, que entrará com recurso, o que, se confirmado, forçará a votação do projeto pelo plenário, a ocorrer apenas no ano que vem.
Enfim, para o setor de telecomunicações, o ano de 2016 ficará marcado como uma espécie de ano que não acabou. Um ano em que muitas mudanças foram anunciadas e esperadas, muitos debates foram travados, algumas expectativas foram frustradas, algumas surpresas aconteceram, um ano em que tivemos a troca de ministro (decorrente da troca de comando do governo central), mas que termina com a sensação de que as transformações pra valer virão só mais adiante, se a pauta política der espaço.
Autor: Luiz Gustavo de Oliveira Ramo é advogado especialista em Telecomunicações, Direito da Internet e sócio do escritório Oliveira Ramos e Advogados.