Agora ressuscitado, Funpen foi marginalizado desde sua criação

Autora: Vera Lúcia Chemim (*)

 

Na República Federativa do Brasil, as políticas e ações governamentais têm uma característica em comum: são estrutural e conjunturalmente repressivas e quase nunca preventivas.

O exemplo mais gritante do momento é a publicação da Portaria 72, de 18 de janeiro de 2017, do Ministério de Justiça e Cidadania alterando a Portaria n 1.414, de 26 de dezembro de 2016, que regulamenta a transferência obrigatória de recursos do Fundo Penitenciário Nacional (Funpen).

Em outras palavras: tenta-se agilizar as ações por meio de transferência aos Estados e ao Distrito Federal de até 50% dos recursos do Funpen, independentemente de convênios ou algo similar, para a construção de novos presídios, ampliação dos já existentes e a sua modernização, no sentido de criar novas vagas para fazer frente à atual demanda prisional.

Já se criticou em comentário recente, acerca da negligência dos órgãos responsáveis em aplicar “efetivamente os abundantes recursos que financiam o Funpen”, conforme previsto respectivamente, nos artigos 2º e 3º, da Lei Complementar 79/1994 [1].

Aquela crítica se referia ao fato de que, independentemente da obrigatoriedade determinada pela Lei de Execução Penal (artigos 28, 29, 31, 32, 41, inciso II e 126) de os presos trabalharem para pagar pelo menos, uma parte dos seus custos materiais ao Estado pari passu com a formalização do PLS-580/2015, que pretende fazer com que os presos ricos paguem o total de suas despesas seria necessário, primeiro verificar até que ponto os recursos do Funpen eram realmente utilizados para a construção, reforma e modernização dos presídios, na compra de equipamentos modernos de segurança, na qualificação dos policiais, no ensino profissionalizante para os presos, bem como nas demais medidas previstas no artigo 3º, incisos I a XVIII da LC 79.

O Fundo Penitenciário Nacional, desde a sua criação pela Lei Complementar 79/1994 tem sido praticamente relegado a segundo plano, para não dizer, marginalizado pelas autoridades competentes no sentido de sua real operacionalização.

Paradoxalmente, como se observou naquele comentário, a fonte de recursos do Funpen (artigo 2º, incisos I a X) é relativamente grande. Vêm do pagamento de custas judiciais, fianças e multas; de dotação orçamentária da União, inclusive disposto no artigo 3º-A, com previsão de seu repasse aos Estados até 2019 e anos subsequentes com as suas respectivas porcentagens; de concursos de loterias e sorteios; de convênios com entidades em geral e outros [2].

Ainda com relação ao Funpen, a divulgação do atual Plano de Segurança Pública Nacional somente agora determinou em uma das suas medidas, “a utilização total do Funpen” para o aperfeiçoamento do sistema penitenciário, no que diz respeito a sua infraestrutura.

Quanto ao combate ao crime organizado, as medidas são igualmente “posteriores aos fatos”, ratificando o argumento desse artigo: o de que a natureza daquelas medidas é “repressiva” ao invés de “preventiva”.

Conforme se pode depreender, tudo se resume a uma questão de “colocar em prática” a legislação já existente sobre o tema: a Lei Complementar 79/1994 e a Lei de Execução Penal.

Quanto à última, é oportuno ressaltar o artigo 72 que determina as atribuições do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), entre elas a de: acompanhar a fiel aplicação das normas de execução penal em todo o Território Nacional; inspecionar e fiscalizar periodicamente os estabelecimentos e serviços penais, além de outras previstas naquele dispositivo, bem como a coordenação e supervisão dos estabelecimentos penais e de internamento federais.

Em se tratando de um órgão de execução penal, de acordo com o previsto no artigo 61 da referida lei é de se questionar da mesma forma, até que ponto ele exerce efetivamente as suas atribuições legais, tendo em vista os recentes acontecimentos.

A despeito das considerações críticas aqui expostas, a atual conjuntura política, social e econômica necessita daquelas medidas de caráter urgente, isto é, de curto prazo, mas, também sinaliza para uma união de esforços de natureza federativa principalmente, porque vivemos sob a égide de um regime republicano que demanda um planejamento estratégico, isto é, de médio e longo prazo, o qual deverá ser executado harmonicamente pelos três Poderes Públicos, como  convém a um sistema presidencialista democrático.

 

 

 

Autora: Vera Lúcia Chemim  é advogada constitucionalista.


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