Divulgar nomes de políticos suspeitos agrada a todos, mas não faz bem à Justiça

Autor: Maurício Cardoso (*)

 

Como tudo que diz respeito à assim chamada operação “lava jato”, essa lista do Fachin tem muita coisa estranha. A começar que a lista não é do Fachin. É do Janot. O ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal, somente decretou a abertura dos inquéritos entre tantos pedidos pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Foi ele, Janot, que colocou todos os nomes lá. Menos o do presidente Michel Temer. Fachin tirou alguns outros poucos. E divulgou todos os que já sabemos.

Talvez não devesse ter feito isso. Como bem lembra o advogado Marcelo Aith, especialista em Direito Eleitoral e Público e sócio do escritório Aith Advocacia, “a divulgação prematura da lista foi de grande irresponsabilidade, uma vez que o que há nesta fase é um mero inquérito penal. Deve-se levar em consideração que o inquérito tem natureza inquisitiva e, portanto, deveria ser sigiloso, de modo que apenas as partes tivessem acesso a ele”.  Para o advogado, a quebra do sigilo neste caso viola tanto o Código de Processo Penal quanto a Lei 8.036, que regula o foro privilegiado no STF.

Também o criminalista Daniel Bialski, do Bialski Advogados Associados, entende que a divulgação de nomes nesta fase do processo afronta a própria Constituição, que, em seu artigo 1º, diz que todos – onde se incluem os políticos –  são iguais perante a lei e, por isso, têm todos os Direitos e as prerrogativas nela garantidos. Uma dessas prerrogativas é a da presunção da inocência, segundo a qual, todos são inocentes até prova em contrário. “A apuração, o processo dirá quem é culpado ou não, mas o julgamento antecipado já ocorreu, levando ao linchamento público de todos”, reclama Bialski.

Também causa estranheza no caso o fato de se fazer, a partir da delação premiada, uma lista de criminosos e não de crimes. Como se sabe o que constitui objeto primeiro da investigação criminal e da Justiça é o crime. Só depois é que vem a busca pelo criminoso. Está certo que, no caso, o crime é a corrupção e dentro desse charco cabe tudo — e todos.

O resultado dessa inversão é que muita gente que está com o nome na lista já é investigada sob a acusação de ter recebido dinheiro de empreiteira no esquema da Petrobras no processo genérico conhecido como “lava jato”. Aparece, agora, na lista como se tivesse o privilégio de ser réu primário. Ou melhor, investigado de primeira viagem. A impressão que fica da lista não é de privilégio, é de escracho mesmo. Até o José Dirceu, que pagou pelo que fez na Ação Penal 470, o processo do mensalão, está pagando pelo que talvez tenha feito na “lava jato”, está também com o nome na lista. O Lula, então, nem se fala. E tem mais o Fernando Pimentel, o Palocci, o Mantega etc. pt saudações. E mais o Eduardo Cunha e o Sérgio Cabral, que cada dia encabeça uma lista.

A lista do Janot teve seus méritos, não se pode negar. O primeiro foi o de facilitar a vida da imprensa que agora não vai precisar de batalhar diuturnamente pela exclusividade de um vazamento. Tem furo para todos os diários, dependendo da forma como se revira a lista. Outro grande mérito foi o de formalizar a desculpa que todo acusado pego com a mão na cumbuca sempre deu: “Eu fiz porque todo mundo sempre fez”. Agora, sim, se sabe que caixa dois e conluio de políticos com empreiteiras faz parte do código de ética de todos os partidos, de todas as ideologias, de quase todos que disputaram eleições nesse país nos últimos 30 anos. Não é que de ex-presidentes desse período só escapou quem já morreu?

Desculpa é outro capítulo intrigante dessa novela macabra que a lista projetou. Enquanto os acusados eram os ex-amigos, eles eram apontados como integrantes da “maior organização criminosa do país”. E todos batiam palmas para cada acusação vazada da república de Curitiba que deixava o rei nu no meio da rua. Quando se começou a falar em uma lista, cada candidato a fazer parte dela fez de conta que não era com ele.

O estranho é que no momento em que a lista incluiu o nome de todo mundo — ou quase — ninguém teve a coragem de dar a única justificativa que poderia ser invocada como atenuante: “Eu fiz porque todo mundo fez”.

 

 

 

 

Autor: Maurício Cardoso é diretor de redação da revista Consultor Jurídico


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