Discurso de juízes e do MP sobre abuso de autoridade é corporativista

Autores:  Rodrigo Fernandes de Moraes Ferreira e José Milton Ferreira (*)

 

No Estado Democrático de Direito, juízes e promotores são protagonistas, mas não são inimputáveis, até porque, na condição de pessoas, padecem de mal comum ao gênero humano: a falibilidade.

Na verdade, são agentes públicos que lidam com bens muito preciosos, como a liberdade, a dignidade e o patrimônio das pessoas, o que lhes impõe, além das cautelas indispensáveis, responder pelos equívocos e excessos que eventualmente venham a cometer.

Em suma, não podem pairar acima da Constituição e das normas legais em geral, vale dizer, não estão acima do bem e do mal, porque, apesar de investidos em funções relevantes, estão sujeitos ao erro e outros pecados menores e maiores.

Todos sabemos que, entre tantos magistrados qualificados e probos, há juízes despreparados, desatualizados, descomprometidos com o trabalho, afoitos, comprometidos ideologicamente e mesmo venais, que não entregam a prestação jurisdicional como deveriam fazer.

O mesmo é de se afirmar em relação ao Ministério Público, que, não poucas vezes, persegue mais os holofotes do que a realização do Direito.

Constitui falácia afirmar-se que a responsabilização desses agentes públicos, nos casos em que suas atuações extrapolem os limites legais, caracterizando abuso de autoridade, representaria prejuízo para a continuidade de investigações em andamento, de processos em tramitação e para a aplicação do direito.

Necessário ressaltar que excessos e ilicitudes que, eventualmente, lhes forem irrogadas serão objeto de julgamento na esteira do devido processo legal, observando-se, como natural, o contraditório e a ampla defesa.

O que está ocorrendo neste momento é que a magistratura e o Ministério Público, segmentos do serviço público brasileiro com o maior nível de remuneração, ultrapassando, em todos os casos, o teto fixado na Constituição Federal, com a reverberação das notícias a esse respeito, sentem a necessidade de reagir para manter o status quo.

Daí, o discurso corporativista, beirando a chantagem, que passaram a propagar, sustentando que a responsabilização de seus membros por eventual abuso de poder representa risco para investigações em andamento e para a aplicação do direito, chegando mesmo membros do Ministério Público a afirmar, em caso de chantagem explícita, que se afastariam das investigações em curso, como se isso fosse possível ou como se não fosse possível substituir os insurretos ou insatisfeitos.

Então, em suma, o que temos é o corporativismo exacerbado da Magistratura e do Ministério Público, que a imprensa, à falta de melhor compreensão do cenário, faz ecoar, inflamando a opinião pública, já tão desalentada com a atuação de muitos de seus representantes políticos e tão entusiasmada com as ações da Justiça e do Ministério Público em vários episódios que têm levado a julgamento antes eminentes próceres da vida pública brasileira.

O que vem ocorrendo e, diferentemente do que propala o discurso falacioso, continuará a ocorrer inexoravelmente, em razão da relativa maturidade política que o país alcançou, é a realização do princípio constitucional/democrático, segundo o qual, todos são iguais perante a lei.

Os membros da magistratura e do Ministério Público, nas suas relações sociais e nas suas atuações funcionais, estão sujeitos às mesmas normas que nós outros mortais. Precisam entender isso e precisam entender que não são detentores de mandato para legislar, como, às vezes, parecem acreditar, se arvorando em fazê-lo.

 

 

 

 

Autores:  Rodrigo Fernandes de Moraes Ferreira é sócio do escritório Ferreira Advogados e Consultores Associados, mestre em direito e professor universitário em Brasí

José Milton Ferreira é advogado, Conselheiro Aposentado do Tribunal de Contas do Distrito Federal e ex-procurador-geral do Distrito Federal. Sócio do escritório Ferreira Advogados e Consultores Associados.


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