Autores: Carlos Henrique Abrão e Laercio Laurelli (*)
A pretexto de reformar o artigo 101 da Constituição Federal, o Senado Brasileiro elaborou a emenda constitucional de número 35/2015, a qual cuida da nova forma de ser elaborada lista tríplice para o cargo de ministro da Corte Suprema. Embora existam pequenos avanços, no fundo, representa o mais gritante retrocesso, além de politizar ainda mais o STF.
Com razão, a indicação para a lista de três componentes passa a ser da alçada de sete distintos integrantes, desde o presidente do STF, abarcando também do STJ, TST, STM, da Corte de Contas da União, o procurador-geral da República e, nada mais nada menos, do que o Presidente do Conselho Federal da OAB. O mandato será por uma década, sem direito à reeleição e com quarentena de cinco anos para exercício de mandato eletivo.
Indaga-se em que país do mundo desenvolvido a autonomia, soberania e independência do Judiciário pode ser tão maltratada e completamente esfolada como no texto examinado. A principal responsabilidade pela indicação de ministro do STF deve recair nos ombros de magistrados, das respectivas associações de classe, sem interferência externa alguma e conforme grau de discernimento, tirocínio, com idade mínima de 45 anos e máxima de 65 anos, sem dúvida alguma.
Politizar a nomeação pela maioria do Senado Federal é outra anomalia que o texto encerra, eis que o indicado deverá percorrer todos os corredores do Senado e fazer o correto beija mão. A exposição midiática do mensalão e lava jato expuseram os holofotes do Supremo, criando uma divisão interna e certa ruptura que agora preocupa a sociedade e também o próprio Parlamento.
Jamais poderia se delegar a indicação de ministro da mais importante Corte do País aos pretensos presidentes, sem que o fato se projete dentro do organismo representativo dos magistrados. Dessa maneira, proclamamos que o número de ministros seja elevado para 15 e que 2/3 sejam oriundos da classe de magistrados, a qual se encarregará de realizar o escrutínio e indicar juízes de carreira com no mínimo 20 anos de exercício da judicatura, elevado saber, comprovado cabedal e exposição correta do seu pensamento em termos de enfrentamento de assuntos mais relevantes.
O quadro remanescente de cinco magistrados poderia ser escolhido entre advogados, promotores estaduais e federais, guarnecendo, assim, a liturgia de se espalhar pluralidade na multifacetária visão dos conflitos.
Dessa maneira, com o máximo respeito aos senadores que trabalharam para a respectiva emenda constitucional número 35/2015, a visão que se nos apresenta distorce a função e coloca nas mãos da maioria do Senado a capacidade de escolha, o que, obviamente, esmigalha e enfraquece a característica de um ministro da Suprema Corte.
Esse encontro de um denominador comum jamais poderá ser abstraído da classe de magistrados estadual e federal para a composição no Supremo Tribunal Federal. Deixar e/ou delegar esse requisito para entidades distintas simboliza romper com o atual estado de coisas e conferir ao estranhamento de quem desconhece o puro exercício da jurisdição um importante e relevante papel no cenário republicano.
É inevitável reconhecer que há sempre uma forte carga política na indicação, mas não pode ser única, preponderante e exclusiva. Manter tal e qual se irradia da declinada emenda seria compartilhar com entes e agentes estranhos à Justiça uma missão impossível de escolha, para que se formasse a lista tríplice e, depois disso, coubesse ao Presidente da República o nome do seu gosto e preferência dentro dos padrões da conveniência e oportunidade.
Ampliar o número de ministros daria maior potencial e, sobretudo, consistência no rendimento dos trabalhos, ao lado de projetar mais uma turma que ficaria exclusivamente para as causas de ordem penal, tanto ambicionado em tempos de macrocriminalidade, sem perde de vista o vulto e a celeridade processuais inerentes aos pedidos de habeas corpus e recursos criminais de um universo sem igual.
Tudo fora constitucionalizado pela Lei Maior em vigor e, assim, é fundamental reduzirmos os caos de repercussão e grande interesse nacional para julgamento pelo Supremo Tribunal Federal. Não se estaria mudando o acesso à Justiça, mas parâmetros seriam disponibilizados para filtros e triagens compatíveis com a finalidade da prestação jurisdicional.
E nessa importante situação que hoje se encontra o STF, o maior desafio é de se evitar a sua politização completa e conferir às entidades representativas da magistratura o poder único, indelegável e maciço de escolha da maioria dos ministros da Suprema Corte, porquanto daríamos prestígio àqueles concursados, pela meritocracia e grandes profissionais talhados para o desafio de por a mão na massa e julgar os milhares de processos que batem às portas da Corte Suprema.
Autores: Carlos Henrique Abrão é desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo e professor pesquisador convidado da Universidade de Heidelberg (Alemanha). Tem doutorado pela USP e especialização em Paris.
Laercio Laurelli é desembargador aposentado do Tribunal de Justiça de São Paulo e professor de Direito Penal e Processo Penal.