Autor: Thomaz Thompson Flores Neto (*)
A exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS/Cofins restou sacramentada pelo STF, pendendo de apreciação apenas embargos declaratórios opostos pela Fazenda Nacional, recurso por meio do qual busca, precipuamente, a modulação de efeitos, no afã de livrar a União do ônus da devolução ou compensação de tributos indevidamente arrecadados nos últimos cinco anos.
Nas instâncias ordinárias, ações pleiteando tutela antecipada de evidência seguem sendo ajuizadas, visando à imediata exclusão do ICMS da base cálculo, assim como garantir o direito a ulterior repetição ou compensação do indébito tributário. Isso não só em relação ao PIS/Cofins, como também à CPRB e ao IRPJ e CSSL (no lucro presumido), todos com a mesma base de incidência.
Ao decidir que o ICMS não compõe a base tributável do PIS/Cofins (Tema 69), o STF adotou como ratio decidendi o entendimento de que a parcela do preço do produto ou serviço que corresponde ao referido imposto não integra a receita bruta, por se tratar de simples ingresso que não se incorpora ao patrimônio da empresa vendedora ou prestadora, destinada que é aos cofres do ente tributante.
Na precisa definição do ministro Marco Aurélio, a parte do preço recebido pelos empresários correspondente ao ICMS “não revela medida de riqueza apanhada pela expressão contida no preceito da alínea ‘b’ do inciso I do artigo 195 da Constituição Federal”.
Restou, assim, fixado pela Corte Suprema, em julgamento submetido ao regime de repercussão geral, um novo e vinculante conceito constitucional de receita bruta que, de forma profunda e salutar, impacta o sistema tributário nacional.
Conforme sublinhado pelo ministro Dias Toffoli, no aditamento ao voto vencido que proferiu, “caso esta Suprema Corte adote o entendimento de que o ICMS não integra a base de cálculo do PIS/Cofins, se estará alterando a definição, o conteúdo e o alcance do conceito de receita bruta adotado tanto no direito tributário como no direito privado e já largamente utilizado na jurisprudência da Corte.”
Foi o que efetivamente ocorreu, de forma que aplicar o conceito constitucional de receita bruta, observando o conteúdo e o alcance definido pelo STF, longe de configurar o vedado uso de analogia em matéria tributária, é o caminho diante da nova realidade.
Importante observar que a tese fixada pelo STF no tema 69, ainda que específica em relação à base de cálculo do PIS/Cofins, não possui caráter restritivo, como arriscam alguns.
Em um sistema de precedentes, como o nosso, as razões de decidir é que operam a vinculação, delas se extraindo, por indução, uma regra geral. No escólio de Fredie Didier Júnior, “Da solução de um caso concreto (particular) extrai-se uma regra de direito que pode ser generalizada. Só se pode considerar como ratio decidendi a opção hermenêutica que, a despeito de ser feita para um caso concreto, tenha aptidão para ser universalizada.”
Que a receita das empresas não se confunde com a receita dos entes tributantes é uma verdade insofismável, mas faltava ser afirmada com autoridade, o que agora fez o STF.
A incidência de tributo sobre tributo mais que inconstitucional, é indecente.
Valendo lembrar que não cabe procurar na Constituição Federal vedações pontuais e expressas a essa modalidade espúria de tributação. A incidência de tributo sobre tributo não é autorizada pela Carta Magna, e é o que basta para escancarar a inconstitucionalidade da exação.
Como o Brasil está sendo passado a limpo, o momento parece mais do que oportuno para que se faça valer, na máxima intensidade, o princípio da moralidade tributária. A definição do conceito constitucional de receita bruta, pelo STF, é um passo fundamental nesse sentido.
Autor: Thomaz Thompson Flores Neto é advogado tributarista, titular do escritório Thompson Flores Advogados.