TJ/SC condena homem por dano psíquico, dano qualificado e maus-tratos

O juiz Marcelo Volpato, do Juizado de Violência Doméstica contra a Mulher da comarca da Capital, condenou a sete anos de detenção – em regime semiaberto – um morador de Florianópolis pela prática de três crimes: lesão corporal por dano psíquico, dano qualificado e maus-tratos contra idoso. Todos os delitos foram cometidos contra a esposa entre 2013 e 2018. A vítima, hoje, está com 80 anos.

Por diversas vezes, de acordo com os autos, o marido ofendeu a integridade psíquica e a saúde da esposa, mediante agressões verbais, insultos, privação de sono e de convívio com a família. O homem, dependente químico, tinha ciúmes excessivos e alucinações persecutórias. Ele via “amantes” da mulher nos tijolos da cozinha e no colchão da cama, falava sem parar, não a deixava ficar sozinha no quarto nem no banheiro. Ele destruiu e deteriorou os móveis, utensílios e objetos do apartamento.

Segundo os autos, o apartamento onde vivia o casal era insalubre e estava em completa degradação. Consta ainda que a vítima necessitava de assistência e cuidados especializados – ela teria quebrado o fêmur – que não foram prestados pelo marido. Eles ficaram casados por nove anos. Um dos vizinhos do casal, em juízo, afirmou que viu a vítima subindo as escadas do prédio sentada, de costas, em razão de lesões. Fato corroborado por outro vizinho. Um deles relatou que o réu não permitia que as pessoas cumprimentassem ou falassem com a vítima. Uma vizinha contou que ela gritava demais, diariamente, em todos os períodos, e ouvia objetos quebrando no apartamento.

Uma ex-síndica do condomínio acionou a polícia repetidas vezes, mas quando os militares chegavam, a vítima dizia sempre a mesma coisa: “É brincadeira de casal, não se preocupem, está tudo bem”. Ela também negou as agressões na delegacia e o próprio relatório policial reconhece que havia uma dificuldade em demonstrar a lesão corporal. Sobre essa atitude, o juiz Marcelo Volpato pontuou: “A referida negativa é sintoma da situação traumática de estresse e pode ter influenciado na própria percepção de realidade por parte da vítima, uma vez que o depoimento foi colhido à época em que a vítima era sucessivamente submetida às situações de violência”.

O magistrado explicou que o crime de lesão corporal, previsto no artigo 129 do Código Penal, consiste em causar dano – sem a intenção de matar – à integridade física ou também à saúde fisiológica ou mental de outra pessoa. Para ele, a negativa da vítima não pode impedir a responsabilização do réu. Como medida de proteção à própria vítima, e para entender o que de fato acontecia naquele apartamento, o juiz optou por submetê-la a uma perícia psicológica.

As informações consignadas nessa avaliação psicológica, esclareceu Volpato, estão em absoluta coerência com o substrato probatório produzido nos autos e com a narrativa das testemunhas de acusação, “notadamente dos vizinhos que presenciavam diariamente os fatos criminosos, bem como dos filhos da vítima e policiais que participaram da ocorrência”. Sobre esses anos de violência, já depois de ser resgatada pelos filhos, a vítima disse: “Parecia que eu tinha ficado paralisada, dopada, eu não ligava mais. Se eu não tivesse saído de lá, acho que já teria morrido”.

Em relação ao dano psíquico, além das disposições do Código Penal e da Lei Maria da Penha, o magistrado destacou trecho da doutrina da magistrada catarinense Ana Luísa Schmidt Ramos: “No campo da lesão corporal por dano psíquico, o resultado apurado, ou seja, a lesão, demanda a construção processual do nexo entre a conduta do acusado e o resultado, que pode ser decorrente de fatores estranhos. Com isso, pode-se atribuir responsabilidade penal com maior qualidade, evitando-se, ao mesmo tempo, acusações desprovidas de base legal”.

Diante dos fatos apresentados no processo, inclusive o laudo psicológico, o magistrado entendeu que a vítima era submetida a uma “tortura psicológica” diária, com privação do sono e do convívio com a família, ofensas verbais, submissão a ambiente insalubre e privação de vestuário digno entre outros. E concluiu: “Tenho que o nexo entre as condutas do acusado e o resultado lesão corporal por dano psíquico restou devidamente evidenciado no item referente à autoria e está estampado no laudo psicológico”. O magistrado entendeu ainda que a materialidade e autoria dos crimes de maus-tratos e de dano também ficaram comprovadas. O juiz determinou que a pena seja cumprida em uma colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar, observadas as regras de execução do regime semiaberto. Cabe recurso ao TJ.


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