Ivan Pinto da Rocha advogado em Pernambuco
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1. INTRODUÇÃO
Com o advento “A REFORMA DO CPC”, constituída por uma série de leis editadas, principalmente, nos anos de 1994 e 1995, modificações foram produzidas no sistema processual brasileiro, seja no âmbito da praticidade, celeridade, como na efetivação do direito pela via do processo.
Na opinião de Andrea Proto Pisani, jurista italiano, onde menciona a importância de se buscar diferentes meios de tutela, mostrando suas finalidades, que são idênticas a do procedimento monitório, procura demonstrar que a cognição deve ser simples, sumária, observando a efetividade da tutela jurisdicional e, ainda, evitar abuso de direito de defesa.
Antes da reforma, contudo, na concepção da maioria dos doutrinadores, o tema cognição, estava a merecer a expressão: “exauriente”, posto que desprezava qualquer sumariedade, simplicidade.
Nada obstante, o eminente Ministro do Colendo Superior Tribunal de Justiça, Dr. Sálvio de Figueiredo Teixeira, in “Estatuto da Magistratura e Reforma do Processo Civil”, Ed. Del Rey, 1993, fez uma observação que bem se enquadra no bojo deste trabalho, qual seja:
“Somente procedimentos rápidos e eficazes têm o condão de realizar o verdadeiro escopo do processo. Daí a imprescindibilidade de um novo processo: ágil, seguro e moderno, sem as amarras, fetichitas do passado e do presente, apto a servir de instrumento à realização da Justiça, à defesa da cidadania, a viabilizar a convivência humana e a própria arte de viver”
Entrementes, a lei nº 9.079 de 14 de julho de 1995, introduziu em nosso sistema instrumental, um instituto antigo do direito material, que se adapta, essencialmente, aos objetivos culminados na “REFORMA DO CPC”, como celeridade, praticidade e efetivação do direito pela via processual, ou seja, a AÇÃO MONITÓRIA.
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2. CONCEITO
DE PLÁCIDO SILVA, vocabulário Jurídico, Ed. Forense, 1987, pág. 205, define a palavra monição como:
“Do latim monitio, de monere (advertir, avisar), na significação jurídica, e em uso antigo, era o aviso ou convite para vir depor a respeito de fatos contidos na monitória. A monitória, assim, era carta de aviso ou intimação para depor. Monição. Na terminologia do Direito Canônico, é a advertência feita pela autoridade eclesiástica a uma pessoa, para que cumpra certo dever ou não pratique um ato, a fim de que evite sanção ou penalidade a que está sujeita, pela omissão ou ação indicadas”
Ernane Fidélis dos Santos, Novos Perfis do Processo Civil Brasileiro, Ed. Del Rey, 1996, pág. 48, ensina-nos com propriedade que:
“O fim específico do procedimento monitório é a formação do título executivo e o objeto do pedido, em primeiro plano, é de recebimento coativo da dívida; logo, de execução. Os atos seriam próprios do processo de conhecimento não se concluem como tais, porque o procedimento completo não enseja seu término por sentença jurisdicional. Objetivando, pois, a execução, tais atos são mero adendo, de natureza preparatória, do processo respectivo”
Entende-se, concessa venia, discordando do mestre acima, que o procedimento injuntivo é também cognitivo, ensejando, destarte, sentença jurisdicional, valendo-se, inclusive, da frase lapidar do saudoso mestre FREDERICO MARQUES, onde afirmava que:
“processo de conhecimento é processo de sentença, enquanto o processo executivo é processo de coação” .
Apenas se ressalta que mesmo sendo eventual (Calamandrei), o contraditório e a ampla defesa existem no procedimento em apreço, não havendo, destarte, nenhum óbice à cobertura da sentença monitória pelo manto da coisa julgada material, inclusive porque, aprecia-se, “in caso” o mérito da controvérsia, ensejando também, a meu ver: Ação Rescisória, nas hipóteses vertentes do art. 485 do CPC.
Neste procedimento, em virtude da situação fática ser bastante verossímel, a formação da sentença dependerá de um ato omissivo da parte ré ou do cumprimento voluntário da ordem de pagamento, caso contrário, ou seja, havendo manifestação de defesa, o processo seguirá o rito ordinário, sempre, vale frisar, buscando um pronunciamento jurisdicional que solucione a lide (ponha termo ao processo).
É verdade que no mandado de citação, em primeiro plano, existe uma ordem de pagamento, que ficará sem efeito, pelo menos provisoriamente, caso se ofereça defesa (Embargos). Não há necessidade de penhora (coação), posto que a própria Lei faculta a interposição de defesa.
Agora vejamos o conceito proferido pelo Dr. José Rogério Cruz e Tucci, em seu livro Ação Monitória, 2a. Edição, Editora Revista dos Tribunais, pág. 68, onde conceitua a Ação Mandamental da seguinte forma:
“Consiste no meio pelo qual o credor de quantia certa ou de coisa móvel determinada, cujo o crédito esteja comprovado por documento hábil, requerendo a prolação de provimento judicial consubstanciado, em última análise, num mandado de pagamento ou entrega de coisa, visa obter a satisfação do seu direito”
Registre-se aqui, de logo, que não desejamos jamais tentar levar algum proveito da crítica que iremos nos reportar mais adiante ao respeitável conceito dado a Ação Mandamental, feito pelo Ilustre Professor Dr. José Rogério Cruz e Tucci, transcrito acima. Mas sim, em nome do DIREITO, apenas divergir, no sentido construtivo para que se alcance não só o verdadeiro significado do instituto Monitório, mais a melhor forma de aplicá-lo no ordenamento jurídico pátrio.
Entende-se, destarte, que a Ação Monitória visa tão somente conferir ao possuidor de documento hábil que expresse direito a quantia certa ou a coisa móvel determinada, sem eficácia executiva, um pronunciamento jurisdicional mais célere, devido as circunstâncias de fato (verossímeis), com um eventual contraditório.
Segundo o ilustre mestre e Professor Dr. Frederico Ricardo de Almeida Neves, em seu livro Breves Comentários Sobre A Ação Monitória, Ed. Nossa Livraria, 1a. edição, 1996, pág. 22, leciona de forma primorosa que “A finalidade precípua do novel instituto de direito processual acha-se bem definida na lei e consiste em simplificar o acesso do credor ao título executivo, estabelecendo uma verdadeira inversão quanto a iniciativa do contraditório.”, e mais adiante na pág. 25, conclui o mestre que “É iniludível, portanto, a característica cognitiva do procedimento recém criado…”.
Assim, ousa-se discordar do fabuloso conceito acima (Cruz e Tucci), no sentido de se entender que por mais que a situação fática embasadora da Monitória seja verossímel, ainda, não se pode chamar o autor, de credor, posto que não há exigibilidade da dívida. Também não se pode dizer que a ação mandamental visa a satisfação do direito, mais sim, apenas consolidá-lo, torná-lo exigível.
Frise-se que o próprio Professor Cruz e Tucci em sua obra citada acima ensina de forma explendiosa que o procedimento injutivo é de sumariedade formal de cognição, logo, visando sentença (direito) e não satisfação (realização).
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3. A EXECUÇÃO FORÇADA E A MONITÓRIA
O processo de execução tem como característica principal a não incidência do contraditório, tendo em vista existir uma presunção de certeza, liquidez e exigibilidade no título executivo que a embasa, face a um prévio conhecimento (processo cognitivo) ou em razão de circunstâncias que a própria lei determina (art. 585 do CPC). Portanto, visa, tão somente, a satisfação do credor, realizando o seu direito.
De se ressaltar que, não há título sem que exista lei que o preveja (nulo titulo sine lege) e também, nula é a execução, sem que haja um título que a anteveja (nulo executio sine titulo).
Destarte, existem outras situações, em particular, o caso do título injutivo, ou seja, aquele que não tem força executiva, mas que merece receber uma tutela diferenciada, em razão da desnecessidade de uma dilação probatória que a fundo se tornaria exauriente e da simplicidade da situação fática.
Assim, o legislador adotou a ação mandamental, não havendo como confundir com a ação executiva, posto que aquela visa a satisfação do título e esta o conhecimento sumário, simplificado, inclusive com contraditório, mesmo sendo eventual, para que após a certeza e liquidez (cognição) do título, o exigir através da execução.
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4. DA SEMELHANÇA COM A AÇÃO LIQÜIDATÓRIA
O ordenamento pátrio faculta ao autor, em certos casos previsto na segunda parte do art. 286 do CPC, fazer pedido genérico, que poderá, conseqüentemente, ensejar sentença ilíquida. Entende-se que, neste caso, a sentença, nada mais é do que um título injuntivo, sem, ainda, ter eficácia executiva.
Daí surge a necessidade de se promover a chamada Ação Liqüidatória, prevista no §1º do art. 586 do CPC, que objetiva, a nosso ver, constituir a sentença condenatória ilíquida, a fim de ensejar a Ação de Execução para satisfazer o direito do credor. É iniludível o carácter cognitivo da liquidação de sentença, respeitando, é claro, a vedação de discussão sobre o mérito da lide já julgada, à luz do art. 610 do CPC.
Paralelamente, o que caracteriza o título injuntivo é o desprovimento de eficácia executiva. No particular da Monitória, falta-lhe a exigibilidade para ensejar a Ação Executiva, posto que se presume existir certeza e liquidez. Significando dizer que a Ação Monitória é cognitiva e sua decisão constitutiva, posto que visa, tão somente, dar ao título injuntivo exigibilidade.
Destarte, verifica-se que o título injuntivo, o qual irá ensejar a Ação Liquidatória, é desprovido de liquidez, enquanto o que oportunizará o oferecimento da Monitória, falta-lhe exigibilidade. Assim, percebe-se que o objetivo das Ações são idênticos, ou seja, constituir um título injuntivo, pois faltam-lhes um elemento constitutivo para ensejar a Ação Executiva.
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5. DA NATUREZA DO ATO INICIAL
É importante mencionar que o procedimento monitório termina com o próprio ato inicial, caso, eventualmente, decorra “in albis”, o prazo para embargos, ou o réu pague a quantia ou entregue a coisa móvel, no prazo de 15 dias.
Contudo, se interposta defesa, através de embargos, o procedimento monitório transmudar-se-á em ordinário, não pondo termo ao processo.
Entende-se, entretanto, que a priori, a natureza do ato inicial, em caso de interposição de defesa, é de despacho, podendo a posteriori tornar-se sentença, pelas seguintes razões: (1) primeiro porque a relação processual, quando da prolação do ato, ainda não começou, posto que o réu não foi citado, destarte, não podendo haver questão incidente, descartando a possibilidade de decisão interlocutória; (2) segundo porque se entendêssemos como decisão interlocutória, ensejaria o recurso de agravo, tornando o procedimento exauriente; (3) terceiro porque os requisitos e condições desta Ação são os mesmos de qualquer outra, seja de cognição ou executiva, apenas, há necessidade de uma motivação no despacho inicial (art. 90, X da CF/88), face a condição deste ato poder se tornar sentença, em casos de cumprimento voluntário da obrigação ou transcorrência “in albis” do prazo preclusivo para embargos.
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6. DOS EMBARGOS
Antes de adentrarmos no âmago do assunto, mister se faz da análise do art. 1102c do nosso digesto processual civil, “in verbis”:
“ART. 1102c – No prazo previsto no artigo anterior, poderá o réu oferecer embargos, que suspenderão a eficácia do mandado inicial. Se os embargos não forem opostos, constituir-se-á, de pleno direito, o título executivo judicial, convertendo-se o mandado inicial em mandado executivo e prosseguindo-se na forma prevista no Livro II, Título II, Capítulos II e IV.”
Vê-se que o prazo para Embargos (defesa) é de 15 dias e que em caso de interposição o procedimento transmudar-se-á para ordinário (exauriente).
Nota-se que o termo empregado pelo legislador para defesa é impróprio, posto que poderá confundir o operador do direito com a já existente Ação de embargos do devedor.
Observa-se que a norma quando dispõe no sentido de determinar, de logo, a transformação do mandado inicial em executivo, viola, o princípio da inércia processual, como se a execução fosse instaurada “ex-officio”.
Entende-se que a norma, neste caso, disse mais do que o legislador realmente quis dizer, mesmo porque, a nosso ver, o despacho inicial poderá virar sentença condenatória, que deverá ser publicada em conjunto com a certidão do Cartório de que transcorreu “in albis” o prazo para defesa e as partes intimadas de seu conteúdo, onde poderão requerer ou deixar de requerer o que bem entenderem, inclusive, recorrer (parte vencida) e executar (parte vencedora) após o trânsito em julgado.
É oportuno ressaltar que os Embargos, neste caso, não são uma Ação autônoma e sim mera objeção ao título injuntivo, podendo o embargante alegar qualquer matéria lícita em sua defesa, inclusive, requerer perícia etc., tem conteúdo, eminentemente, de contestação.
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7. CONCLUSÕES
Diante do exposto, não restam dúvidas que a Ação Mandamental pressupõe celeridade e praticidade na efetivação do direito pela via instrumental.
Entende-se que a Monitória é uma Ação de conhecimento sumário, ensejando, destarte, sentença meritória. Visa reconhecer de forma célere o direito expresso em documento hábil sem eficácia executiva.
Observa-se que objeto da Monitória é o mesmo da Ação de Liquidação, ou seja, transformar um título injuntivo em executivo.
Conclui-se que a natureza do ato judicial inicial é bi-dimensional, ou seja, a priori, tem carárter de mero despacho (sem nenhum cunho incidental), podendo, a posteriori, eventualmente, transmudar-se em sentença.
Percebeu-se que em caso de interposição de Embargos, o procedimento Especial Monitório transforma-se em ordinário, promovendo uma cognição exauriente, concluindo-se, destarte, que os Embargos, “in óculi”, não são uma Ação autônoma, têm carácter, eminentemente, de contestação.
Finalmente, entende-se que a disposição do art. 1102c do CPC, disse mais que o legislador quis dizer, posto que não se admite, no âmbito Cível, execução “ex-officio”.
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