Jalno Duarte Ferreira
Segundo a norma contida no art. 583 do CPC, toda execução tem por base, título executivo judicial ou extrajudicial, não podendo existir processo de execução que não se aparelhe por meio de um título executivo. É, portanto, processo documental, pois o título é indispensável para a propositura da ação, sendo necessário, ainda, para que vingue a execução, estar comprovado o inadimplemento do devedor e a comprovação da liquidez, certeza e exigibilidade do título, estando o mesmo, revestido de sua força executiva, o que não ocorre quando operada a prescrição.
Anteriormente ao advento da Ação Monitória, o credor, de posse de um título executivo extrajudicial prescrito, para fazer valer seu direito, necessitava buscar o amparo da tutela jurisdicional, através de ações de procedimento comum, sumário ou ordinário, dependendo do valor da causa, ações estas geralmente denominadas de cobrança ou enriquecimento ilícito, como no caso dos cheques prescritos, ficando, assim, sujeito às intempéries e procrastinações de um procedimento por demais longo, embora não pudesse se socorrer com tais argumentos, em virtude de sua desídia, pois é de sabença geral no mundo jurídico que “dormientibus non succurrit jus.”
Com o advento da Ação Monitória, de origem francesa, também denominada por alguns de procedimento injuntivo, introduzida no CPC, pela Lei 9.079, de 14 de julho de 1995, esta situação modificou-se, eis que, extreme de dúvidas, ter a ação monitória um procedimento intermediário entre o da execução e o comum, sendo ação de procedimento especial de jurisdição contenciosa e como tal, constituindo-se em processo de conhecimento, acrescentada ao Livro IV, Título I, do Código de Rito, o Capítulo XV,
De acordo com a regra estampada no art. 1.102(a), pode promover a Ação Monitória todo aquele que pretender, com fundamento em prova escrita sem eficácia executiva, receber soma em dinheiro, coisa fungível ou bem móvel. Vê-se, pois, que o requisito específico de admissibilidade do procedimento monitório é a existência de “prova escrita”, desprovida de força executória, o que não ocorria, anteriormente a esta lei, como mencionado acima, pois o interessado, tinha que movimentar o aparelhamento jurisdicional com ação de rito comum, objetivando a obtenção de um pronunciamento judicial que permitisse a utilização da via executória.
Agora, com o advento deste novo diploma legal, inserido na parte destinada aos procedimentos especiais de jurisdição contenciosa, aquele que tiver em seu poder título injuntivo, ou seja, documento sem força executória, pode se valer da tutela jurisdicional, bem diferenciada da execução, que tem como função precípua a de permitir a formação do título executivo de maneira mais célere.
A exemplo de alguns Códigos europeus, tais como os da Itália e da Alemanha, o legislador brasileiro sistematizou um procedimento intermediário, entre o cognitivo e o executivo, denominado procedimento monitório ou injuntivo, objetivando caminho mais célere à formação do título executivo, passível de ser utilizado pelo credor, quando munido de documento que comprovasse seu crédito, ainda que não revestido de força executiva. Mediante este procedimento, o credor, ao exercitar seu direito de ação, pode postular em juízo, não a condenação do devedor, mas, em sumária cognição, a expedição de uma ordem ou mandado para que a prestação obrigacional seja cumprida no prazo estabelecido em lei.
Amparando tal tese, não se pode deixar de trazer à colação, escorreita lição do renomado processualista, HUMBERTO THEODORO JÚNIOR que assim preleciona: “os qualificativos monitório e injuntivo são expressões indicativas de ordem, mandamento, imposição, em seu significado léxico, justamente porque, ao invés de iniciar-se por uma citação do réu para defender-se, principia por uma ordem expedida pelo magistrado, determinando ao devedor que pague a dívida em prazo determinado”.
Assim, a Ação Monitória, já largamente utilizada no direito alienígena, mormente, no italiano e alemão, passou agora a existir no sistema jurídico brasileiro, sendo regulamentada pelos arts. 1102 (a), (b), (c) do CPC.
A Ação Monitória é, portanto, ação de conhecimento, condenatória com procedimento especial de cognição sumária, sendo sua finalidade principal, alcançar a formação de um título executivo judicial de modo mais rápido do que na ação condenatória convencional.
Portanto, pelo que se observa na norma contida no art. 1102(a) do CPC, chega-se à ilação de que qualquer título executivo extrajudicial, cuja prescrição o atingiu, poderá ser cobrado através da Ação Monitória, uma vez que ao título, descaracterizado como executivo, não se pode negar, sua força probante escrita, em que nela se encontre a obrigação de pagar quantia certa e determinada.
Conclui-se, assim, que agora, o credor tem, à sua disposição, outro instrumento de mais valia e muito mais célere, principalmente se o devedor atender de pronto o mandado judicial monitório, benefício este que vem evitar o desgaste de ambas as partes com incidentes procrastinatórios, inerentes ao procedimento comum.
Finalizando, não se pode deixar de alertar que ao se intentar uma Ação Monitória, utilizando como prova escrita, um cheque, promissória, ou qualquer outro título extrajudicial, não se está restaurando sua característica executória, porque esta, com a prescrição operada, jamais voltará a existir. O que se obtém com a Monitória é, sim, outro título executivo, agora judicial, que ensejará se necessário, o devido e competente processo de execução.
Sustentando tal tese, nossos tribunais vêm, constantemente, decidindo de forma a amparar credores em tais situações, como se vê nos julgados a seguir enumerados:
Se o credor, dispondo de prova escrita, entende não ser ela titulo executivo extrajudicial, pode optar pela ação monitória, ainda que o julgador tenha entendimento contrario quanto a natureza do titulo. Não se pode obrigar o credor a trilhar a via executiva quando ele tem duvida sobre a liquidez e certeza do titulo, valendo-se da ação monitória. Sentença desconstituída. Apelo provido.
(TARS – Ap. Civ. nº 195196498 – Canoas – 5ª Câm. – Rel. Juiz João Carlos Branco Cardoso – J. 07.03.96).
É cabível ação monitória para cobrança de cheque prescrito, uma vez que tal procedimento não restitui a forca executória dessa cambial, Mas tão-somente torna disponível, para obtenção de título executivo judicial, uma via processual mais célere do que a ação ordinária de cobrança, em nada restando agredido o instituto da prescrição.
(TAMG – Ap. nº 02179086-4/00 – Teófilo Otoni – 6ª Câm. Cív. – Rel. Juiz Pedro Henriques – DJU 11.09.96 – m.v.).
A ação monitória é a via adequada para cobrança de cheques, que perderam a eficácia de título executivo pelo decurso de tempo. Estes, por sua vez, estando formalmente perfeitos, não admitem, salvo raras exceções, a discussão da causa debendi, razão pela qual inocorreu o alegado cerceamento de defesa. As alegações que abririam ensejo a este tipo de discussão, deveriam vir acompanhadas de indícios ou começo de provas, que autorizassem a perquirição subseqüente, o que não ocorreu. (TAPR – AC 101.677-7 – 6ª C. Cív. – Rel. Juiz Antônio Alves do Prado Filho – DJPR 08.08.97)
O cheque encontra-se prescrito para o exercício de execução, tendo em vista que o prazo respectivo é de 06 meses. O cheque perdeu a eficácia executória, mas não deixou de ser prova hábil para ensejar a ação monitória (art. 1.102, a do CPC). Preliminar rejeitada. Inépcia da inicial. Causa debendi não declinada. Cheque devolvido por insuficiência de fundos. Prova bastante para comprovação de crédito. Ao autor não cabe declinar a causa debendi. (TJDF – AC 43.965 – (Reg. Ac. 95.974) – 3ª T. – Rel. Des. Campos Amaral – DJU 06.08.97)