A Administração Pública no Século XXI.

Vicente Oliva Buratto

1. O Direito, como toda ciência, precisa acompanhar os fatos sociais e políticos da contemporaneidade, sempre procurando a atualização, para não se tornar obsoleto e ultrapassado. E assim também ocorre no Direito Administrativo. A globalização e a falência de determinadas ideologias estatais (o Estado socialista e o “Well Fare State”) levaram os Estados Nacionais submeterem-se a determinadas mutações em suas organizações e na sua forma de prestação dos serviços essenciais à coletividade.

Tais mutações devem ser analisadas com cautela para que se ache uma forma menos traumática de adequação dos Estados a estas mudanças, inerentes à época em que vivemos e com efeitos imediatos. Algumas questões atinentes à matéria administrativa e com produção de efeitos à relação Administração-servidor merecem a nossa atenção.

O Direito Administrativo, com seus dois séculos de existência, observa, nos dias de hoje, um fenômeno denominado de sociedade participativa. O desgaste evidente da tradicional representação política, juntamente com uma revolução dos meios de comunicação que elevou os índices de informação e educação da sociedade, tornou a coletividade consciente do distanciamento entre o Estado e a sociedade, a quem ele representa. Em razão disto, a diversidade e o crescimento dos métodos participativos da coletividade surgiram naturalmente.

Hoje já existe um sistema de colaboração entre o Poder Público e a sociedade, em forma de contratos de gestão ou convênios, o que possibilita não apenas a saudável relação entre estas duas figuras, bem como a consecução de finalidades públicas, antes talvez de difícil alcance.

Outro fenômeno, com efeitos na Área Administrativa, encontra relação com a implantação de uma administração gerencial, seguidora de princípios técnico-administrativos tais como a autonomia e a profissionalização. A autonomia refere-se a uma nova tendência pela flexibilização das entidades e órgãos públicos para que adequem suas funções à diferentes necessidades. Ao invés da pré-definição de competências, o que torna a prática funcional inflexível e os cargos obsoletos, haveria de ter uma fixação prévia da finalidade almejada para, a partir dela, instituir-se cargos e funções para o seu alcance, flexibilizando a Administração para atuar num mundo em mudança constante, tornando-a, enfim, autônoma.

Já o princípio da profissionalização faz remissão à necessidade de atualização e especialização do corpo técnico de servidores da Administração, afastando a burocratização da prestação dos serviços e empregando recursos humanos superiores, paritários aos utilizados pelos entes da iniciativa privada, para que, assim, possibilite-se o alcance da finalidade de bem atender às necessidades da coletividade.

Outrossim, há uma tendência de maior participação e envolvimento da coletividade nas atividades do Estado, quais sejam a produção de normas, como fonte externa ao Poder Legislativo; a administração da coisa pública, nas formas alternativas associativas consensuais com o Poder Executivo; e a solução de conflitos, constituindo órgãos e formas de composição externas ao Poder Judiciário.

Há, ainda, as formas de controle externo da Administração, também denominados de controles sociais que, através de instrumentos participativos, vem ganhando adeptos, aumentando, destarte, o número de fiscais sem ônus para o contribuinte, desenvolvendo ainda, segundo o Profº. Diogo Figueredo Moreira Neto, um sadio espírito cívico. Trata-se portanto de uma efetiva sociedade participativa.

Passemos, assim, a uma explanação mais específica sobre alguns desses fenômenos, que tanto influenciam o pensamento dos estudiosos do Direito Administrativo.

2. Nesse início de século, observamos a continuação de um fenômeno globalizante, o que exige uma produção técnica e profissional dos bens e serviços demandados pelas sociedades. Através da transformação do Estado, pressionado pelas mudanças na sociedade, a Administração Pública percebeu a necessidade de transcender-se para bem servir a coletividade, sua razão de ser. Com base nessa necessidade de transcendência, fez-se necessário o conhecimento dessas novas tendências para, quando da adaptação do Poder público ao novo, encontrar respostas eficientes.

A sociedade contemporânea viu-se obrigada a expandir o seu nível de participação política para conseguir inserir-se num novo mundo no qual foram derrubadas as barreiras do tempo e da distância , através de fenômenos oriundos da informática (internet) e telemática, no qual internacionalizou-se a economia e o sistema monetário, e estabeleceu-se a diversidade de interesses de uma sociedade pluralista.

A falência do Estado monoclasse, tendo como exemplos figurativos o Estado socialista e o Estado do bem estar social, incapaz de atender demandas tão diversas advindas de uma sociedade cada vez mais pluralistas, ensejou uma transformação organizacional da Administração e das demais formas de representação pública, exigindo uma mudança de atuação dos órgãos estatais.

A adequação e o estabelecimento dessa nova forma de Estado, demandada pela sociedade pluralista, fez aparecer, no entendimento do Profº. Diogo Moreira Neto, princípios regentes deste processo tais como: a subsidiariedade, objetivando a diminuir a máquina estatal delegando a outras organizações estatais ou não, determinadas atividades públicas que hipertrofiavam a máquina administrativa; a coordenação, tomando lugar da exclusividade da atuação do Estado através da cooperação e colaboração; a privatização ou, melhor dizendo, desestatização, transferindo aos entes privados a consecução de atividades de interesse público; a publicização, retirando o Estado da execução de atividades relativas ao setor privado, para reforçar seus instrumentos de regulamentação dessas atividades; e a consesualidade, da qual trataremos com mais profundidade.

A consensualidade, tratada referido pelo professor Moreira Neto como um refluxo da imperatividade Estatal, refere-se a uma nova foram de democracia emergente, voltada à escolha de como se quer ser governado, distinta da clássica doutrina voltada à escolha do governante. Trata-se de um amadurecimento democrático, aprimorador da governabilidade, visto que a participação organizada da sociedade no processo decisório tona-se mais evidente. Mas tal processo não significa a extinção da via imperativa de administração. Cria-se apenas uma alternativa ao legislador para a escolha da forma mais coerente e econômica de execução de uma finalidade pública, seja ela a imperativa, seja a consensual.

Vale, entretanto, esclarecer algumas vantagens oriundas da escolha da via consensual, quais sejam: a redução de custos operacionais para o Estado e a sociedade, a simplificação da máquina gestora, a racionalização da atribuição de competência ao Estado administrador, e o potencial criativo e operativo dos entes da constelação social (Estado e particulares).

Alguns desses sistemas já encontram aplicação na Administração Pública brasileira e têm surtido bons resultados na execução da finalidade pública, tais como as políticas de fomento e os contratos de gestão.

Este fenômeno, portanto, surgiu para facilitar a atividade estatal, demanda pelas mais diversas classes da sociedade, além de incentivar uma participação ativa da coletividade nos processos decisórios do Poder Público, atividade cívica e saudável. È lógico, entretanto, que Estado resguardará algumas tarefas para executá-las utilizando-se da sua imperatividade, quando necessário. De qualquer forma, nas palavras do especialista, a consensualidade é um enriquecimento do Direito Administrativo que a ele se incorpora permanentemente.

3. A moralidade administrativa foi inserida no ordenamento jurídico brasileiro pela Constituição de 1988. Não obstante a expectativa dos administrados por um comportamento ético e moral dos administradores públicos, em suas políticas públicas e execução dos interesses gerais, não havia disposição legal acerca do assunto.

De logo, o princípio da moralidade foi inserido pelo caput do art. 37 da CF/88 nas disposições gerais da Administração Pública. O gestor da coisa pública deve não apenas obedecer aos princípios expressos da legalidade, impessoalidade, publicidade e eficiência, mas também deverá agir com a devida moralidade na consecução do fim público.

O profº. Moreira Neto dispõe da seguinte maneira ao tratar da moralidade administrativa: neste fim de século e milênio não mais basta às conscientes e exigentes sociedades contemporâneas saberem que o Estado se submete à vontade da maioria, mas, ainda, que os governantes se submetem às exigências da moral.

A crise moral pela qual passa o país é evidente. A população não mais acredita na existência de valores morais na Administração Pública, tendo em vista os inúmeros escândalos divulgados pelos meios de comunicação e pelas autoridades competentes para apurá-los. É necessário que a Administração – compreendidos aqui os agentes políticos e os servidores públicos – atue de forma não apenas profissional, mas de acordo com os valores morais, regentes da atividade pública.

Muito embora Maurice Hauriou definisse a moral administrativa como o conjunto de regras de conduta tirada da disciplina interior da Administração, é necessário assentar que o referencial da moral administrativa é a finalidade pública. Dita afirmação faz-se importante visto que diversas vezes a atuação da Administração Pública obedece às disposições legais (princípio da legalidade) relativas à formalidade, entretanto não é executada para alcançar uma finalidade pública. Ocorre o que prevê a teoria do desvio de poder.

A probidade administrativa, consistente no dever de o funcionário servir à Administração com honestidade, procedendo no exercício de suas funções, sem aproveitar os poderes ou facilidades delas decorrentes em proveito pessoal, ou de outrem a quem queira favorecer, é obrigação constitucional e o desatendimento a tais regras de conduta, ou seja, agir com improbidade (contra as regras de conduta moral), pode acarretar a perda dos direitos políticos, o que consiste na mais profunda sanção aplicada a um cidadão.

A democracia participativa, efetivada pela Administração consensual já exposta, compreendendo uma necessária integração entre a sociedade e seu governo, não apenas garantirá a legitimidade dos governantes e de suas decisões, mas também proporcionará um maior controle sobre a adequação da atividade administrativa ao princípio da moralidade administrativa.

A própria Constituição Federal criou mecanismos para este controle oferecendo à qualquer cidadão brasileiro o instrumento da ação popular; criando instituições independentes e legítimas, com amplo poderes investigatórios, tais como o Ministério Público; além de equipar as administrações públicas, federal, estaduais e municipais, com corpo técnico para seu assessoramento jurídico, quais sejam as procuradorias.

Por fim, vale esclarecer que é dever do servidor público denunciar a prática de atividades administrativas não apenas ilegais, mas também aqueles que não atenderem ao princípio da moralidade administrativa. Isto não apenas efetivará a transparência, exigida por lei, da atividade administrativa, bem como implicará na moralização do Poder Público e, por conseguinte, dos seus servidores.

4. Consoante explanação acerca das alterações ocorridas na sociedade moderna, decorrentes da multiplicação e do acesso às fontes de informações, tornando-a possuidora de interesses plúrimos e demandas de natureza diversa, dificultando a realização da finalidade pública unicamente pelo Estado, criou-se o princípio da subsidiariedade.

Dito princípio corresponde a uma tendência de desipertrofia da máquina administrativa, transferindo a terceiros atividades estatais demasiadamente onerosas para a execução estatal e distintas das principais finalidades originarias do Estado. Mas de que forma dar-se-ia esta transferência?

Primeiramente, devemos esclarecer quais são estas atividades praticadas pelo Poder Público. Trata-se de atividades voltadas ao atendimento das necessidades da coletividade, também denominadas de serviço público. No brilhante entendimento do Profº. Bandeira de Mello, com sua linguagem tecnicamente apurada, serviço público é toda atividade de oferecimento de utilidade ou comodidade material fruível diretamente pelos administrados, prestados pelo Estado ou por quem lhe faça as vezes, sob um regime de Direito Público, instituído pelo Estado em favor dos interesses que houver definido como próprios do sistema normativo.

O Estado é logicamente o titular da prestação dos serviços públicos. Há autores que consideram o serviço público a própria razão de existência do Estado. Entretanto, devemos prestar atenção que o ilustre professor entende como o prestador do serviço público o Estado, ou quem lhe faça às vezes. Isto se dá em razão da Constituição Federal dispor no Art. 175 que incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob o regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos. Ou seja, o Estado, quando não executar diretamente os serviços de natureza pública, poderá transferir a terceiros, através de concessão ou permissão, a prestação de tais atividades executadas para o alcance das finalidades públicas.

Vale ressaltar que o Estado somente transferirá a execução dos serviços de natureza pública, resguardando para si a titularidade de sua prestação, já que esta é indisponível, relembrando o princípio administrativo basilar da indisponibilidade do interesse público.

Esta possibilidade de transferência da execução dos serviços públicos decorre de todo um processo que, conforme já fora dito, verificou-se a falência daquelas ideologias estatais, quais sejam o Estado Socialista e o Well Fare State. A previsão constitucional acerca da transferência de tais serviços é originária do texto promulgado pela Assembléia Constituinte, ou seja, data de 1988.

Trata-se de uma forma de manter a boa prestação dos serviços essenciais à coletividade, tais como educação, saúde e segurança, transmitindo a terceiros a execução das demais atividades estatais, já que é evidente o esgotamento das possibilidades do tributo como fonte de financiamento para obras e serviços públicos. Ressalte-se que a carga tributária sobre a sociedade já alcança cerca de 34% do Produto Interno Bruto nacional.

E além destes serviços demandarem um altíssimo investimento em tecnologia, encontram-se em incessante transformação. Desse modo, verificou-se que o Estado necessitava ater suas atenções e recursos às necessidades básicas da população, utilizando-se do permissivo constitucional para executar as referidas transferências.

Ademais, a já mencionada sociedade participativa há de contribuir com a Administração Pública naquelas tarefas essenciais à coletividade e passíveis de colaboração na execução ente o Poder Público e as organizações privadas. A partir disto, efetivada estará a administração consensual no âmbito da Administração Pública.

A partir da execução destas transferências, efeitos do fenômeno ao qual o mundo encontra-se inserido, surgem as desestatizações (também denominadas pelas bases políticas de oposição de privatizações), além da denominada terceirização de serviços básicos e subalternos, com o escopo de diminuir a maquina estatal.

Estes assuntos são de suma importância para os servidores públicos, visto que estes são diretamente atingidos pelos efeitos dessa política modernizadora da Administração Pública, por diversas vezes criticada.

5. Da mesma forma que dispomos acima acerca da transferência dos serviços públicos a terceiros como uma tendência modernizadora do Poder Público, existem certas atividades de interesses gerais que, em razão da inércia ou incapacidade dos entes privados nos tempos passados, foram e são prestadas por empresas públicas ou sociedades de economia mista, que devem, nesse diapasão da reformulação organizacional e funcional da Administração Pública, ter o seu controle acionário ou a totalidade de suas ações transferidas à iniciativa privada, já que inexiste atualmente a necessidade que outrora vingara a criação desta chamadas “empresas estatais”.

Trata-se de um fenômeno chamado de desestatização, por vezes alcunhado de privatização. Este procedimento teve início com a promulgação da Constituição de 1988, que permitiu a outorga de concessões e permissões a terceiros para a prestação de serviços públicos, e tomou forma com a aprovação do Programa Nacional de Desestatização, aprovado pelo Congresso Nacional.

De acordo com a síntese acima explicitada, desestatizar significa transferir o controle acionário, ou vender a totalidade das ações de uma empresa pública ou sociedade de economia mista para terceiros, pertencentes à iniciativa privada. Daí a pejorativa denominação de privatização. Incoerente, visto que o que ocorre é a venda, pelo Poder Público, das “empresas estatais”, prestadoras de serviços públicos, sob o motivo de que já não mais lhe cabe explorar tais atividades, tipicamente empresariais, portanto distintas das que essencialmente devem ser oferecidas à coletividade.

Isto ocorre porque o Estado encontrava-se sobrecarregado de obrigações, quando muitas delas poderiam ser transferidas a terceiros, sob o regime de concessão ou permissão, regimes nos quais as novas empresas prestadoras encontram-se contratualmente vinculadas à Administração, sujeitas às cláusulas contratuais e aos poderes exorbitantes do Poder Público, portanto.

Desse modo, através do sistema de desestatização e quebra do monopólio estatal, abre-se a possibilidade de competitividade entre as empresas privadas prestadoras de serviço, o que resulta na prestação de um serviço mais barato à sociedade, além de que a natureza empresarial da atividade possibilita maiores investimentos, causando, por conseguinte, um serviço de melhor qualidade e continuamente atualizado.

Outro fenômeno resultante das alterações no funcionamento e na organização da Administração Pública, decorrente da necessidade de adequação às exigências do mundo contemporâneo, chama-se de terceirização, implementada em alguns dos serviços prestados pela Administração Pública.

O Profº. Marcos Juruema Villela Souto, em estudo sobre o assunto, dispõe de forma singular nos seguintes termos: Em tempos de modernização e diminuição da máquina do Estado, os cargos públicos só devem ser providos ou criados se envolverem atividades típicas do Poder Público, notadamente, as que existem manifestação de poder de império (polícia, fiscalização, controle e justiça). As demais atividades que não exijam o uso da força ou independência no controle podem (e muitas vezes devem) ser terceirizadas…

Além deste argumento, é evidente a renovação do Estado como organização. A hipertrofia estatal, principalmente em referência ao quadro de pessoal, é explícita, e a ineficiência na prestação dos serviços públicos pelos entes estatais evidencia-se com o passar do tempo. A estabilidade, nos termos anteriores à Emenda Constitucional nº. 19, havia sido distorcida, gerando a ineficiência e a desatualização profissional do corpo administrativo do Estado. Com o advento da reforma administrativa, introduzindo a avaliação periódica de desempenho do quadro de pessoal, além da sanção de perda do cargo aplicada aos servidores reprovados em tal avaliação, ocorreu uma certa modificação na estrutura da prestação de serviço e uma necessidade de incessante atualização e profissionalização do serviço público.

Este procedimento de renovação do corpo de pessoal da Administração Pública traduz-se não apenas como uma forma de profissionalização dos servidores públicos, mas também como uma forma de enxugamento da maquina administrativa, expurgando do serviço público, os servidores ineficientes e inadequados à fiel execução da finalidade pública.

Assim, aquelas tarefas, estranhas à prestação do serviço público e despidas das exigências legais de forma e independência em sua prestação, outrora providas por servidores, através de cargos públicos, poderão ser terceirizadas pela Administração, diminuindo, assim, o ônus decorrente da relação estatutária.

Como pode-se observar, esta é uma tendência fundamental na reorganização da Administração Pública. A existência de cargos públicos deverá, em futuro próximo, ser reduzida às necessidades de execução das funções imprescindíveis à sociedade, funções estas que necessitam de independência do servidor na execução de sua competência. As demais deverão ser terceirizadas para que se alcance o almejado enxugamento da máquina administrativa, necessário à efetivação das políticas públicas essenciais.

6. Explicitadas algumas das novas tendências do funcionamento do Poder Público, tais como: a administração consensual, a moralidade administrativa, a desestatização e a terceirização dos serviços estranhos à função típica de Estado, podemos fazer certos apontamentos sobre a nova Administração Pública.

Neste novo século, o Estado, representante de uma sociedade pluralista conforme já disposto, tende a, por um lado ao transferir a execução de atividades, consideradas não tipicamente pública, aos entes da sociedade, aparentar uma diminuição do seu poder estatal, mas pelo outro lado, continuará, e agora com mais eficiência, a prestação dos serviços imprescindíveis à sociedade, mas sempre fiscalizando a fiel execução das referidas atividades (objeto de transferência), através do seu vínculo contratual com tais prestadoras de serviços, e das agências reguladoras (ANP, Anatel, Aneel etc), criadas para este fim específico.

O Poder Público sai da cena executória dessas atividades transferíveis, e passa a ser um representante da sociedade, fiscalizando e exigindo a execução das tarefas nos moldes exigidos pela coletividade.

Com o advento da Constituição de 1988 e a elevação do princípio da moralidade à hierarquia legislativa máxima, procurou-se criar uma nova mentalidade dos gestores públicos e da sociedade, agora mais participativa. Para a realização da moralidade do setor público, as instituições de controle, juntamente com a sociedade, foram munidas de instrumentos jurídicos capazes de efetuar uma efetiva fiscalização da obediência aos ditames morais da atividade administrativa.

Ademais, as inovações da Reforma Administrativa vêm ajudando, na medida do possível tendo em vista a ausência de regulamentação de alguns de seus dispositivos, o desenvolvimento dessas tendências modernizadoras da Administração Pública e a reformulação da organização do Estado, conforme veremos a seguir.

A promulgação da Lei de Responsabilidade Fiscal trouxe uma nova mentalidade acerca da gestão pública responsável, através de dispositivos que vedam a imprudência administrativa de certas políticas governamentais, procurando alcançar a efetiva execução das finalidades públicas, logo em seguida analisados.

As mudanças estão acontecendo, e a modernização e profissionalização do setor público faz-se, inexoravelmente, necessária, visto que as demandas de uma nova sociedade, cada vez mais consciente do seu poder de participação e fiscalização, são incessantes. Tais mudanças, para sua efetivação, necessitam não apenas de uma liderança forte, mas também, e de forma inexorável, de um apoio geral, interno e externo ao Poder Público, para que se alcance o bem maior que é a execução de finalidades públicas, razão de ser do Estado.

Bibliografia:

MOREIRA NETO, Diogo Figueredo, Mutações de Direito Administrativo, 1ª edição, ,Editora Renovar: Rio de Janeiro, 2000.
SOUTO, Marcos Juruema Villela, Desestatização, Privatização, Concessões e Terceirizações, 3ª edição, Ed. Lúmen Júris: Rio de Janeiro, 2000.
BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio; Curso de Direito Administrativo, 13ª edição, Ed. Malheros: São Paulo, 2001.

Vicente Oliva Buratto é advogado e membro da Comissão de Direitos e Prerrogativas da OAB/Ba

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