A alteração do art. 159 do Código Penal (Define o crime de extorsão mediante sequestro)

Autor: *Damásio E. de Jesus

O Código Penal, no art. 159, caput, define o crime de extorsão mediante seqüestro como o fato de privar alguém de sua liberdade com o fim de obter, para si ou para outrem, qualquer vantagem, como condição ou preço do resgate.

No § 4º previa uma causa de diminuição de pena: “Se o crime é cometido por quadrilha ou bando, o co-autor que denunciá-lo à autoridade, facilitando a libertação do seqüestrado, terá sua pena reduzida de um a dois terços”. A disposição tratava da “delação premiada”, pela qual, na extorsão mediante seqüestro cometida por quadrilha ou bando, o delator, desde que com suas informações a autoridade pudesse libertar a vítima pessoal, tinha reduzida a pena. Exigia-se que o delito tivesse sido cometido por quadrilha ou bando (Código Penal, art. 288). Diante disso, ainda que eficaz, a informação desleal não aproveitava na hipótese de crime cometido por dois ou três seqüestradores. Assim, se um, dentre dois ou três, denunciasse seus comparsas, não podia ser favorecido pela redução da pena. Empregando a norma a expressão “quadrilha ou bando”, indicava a necessidade de, pelo menos, quatro seqüestradores. Além disso, o termo “co-autor” estava mal empregado, uma vez que no delito realizado em concurso de pessoas podemos ter co-autores e partícipes. A disposição, beneficiando o co-autor, excluía o partícipe. Daí porque dizíamos que o legislador havia pretendido referir-se ao participante (gênero), abrangendo o co-autor e o partícipe (espécies).

A Lei n. 9.269, de 2 de abril de 1996, que entrou em vigor no dia seguinte ( DOU de 3.4.96 ), veio corrigir as falhas. Nos termos de seu art. 1º, o referido § 4º passa a ter a seguinte redação: “Se o crime é cometido em concurso, o concorrente que o denunciar à autoridade, facilitando a libertação do seqüestrado, terá sua pena reduzida de uma dois terços”.

A antiga menção à “quadrilha ou bando” foi substituída pelo termo “concurso”. Refere-se a norma ao concurso de pessoas (Código Penal, art. 29). De modo que a circunstância aproveita a todos os participantes, ou, como diz a lei, concorrentes, estendendo-se a co-autores e partícipes. Excluída a exigência de ter sido o delito praticado por quadrilha ou bando, o privilégio alcança a hipótese de concurso de dois ou três seqüestradores. Por isso, em face da lei nova, cometido o crime, v.g., por duas pessoas, seja caso de co-autoria ou participação, o delator deve ser beneficiado pela diminuição da pena, desde que eficazes as informações, i.e., desde que a traição tenha permitido a libertação da vítima. A disposição, de natureza penal, é retroativa.

A alteração da lei, na prática, destina-se ao nada. A delação premiada, introduzida no art. 159 do Código Penal pela Lei dos Crimes Hediondos (art. 7º da Lei n. 8.072/90), teve rara aplicação em quase seis anos de vida legal. Não é difícil de ser encontrada a razão. Na Polícia, quando presos, os seqüestradores sempre afirmam que jamais irão trair os comparsas: “ficaríamos com fama de alcagüetas e não teríamos vida longa na cadeia” ( depoimento do Delegado Maurício Soares, Chefe da Delegacia Anti-Seqüestro da Polícia Civil de São Paulo, sobre a ineficácia da delação premiada, Folha de S. Paulo, 4 de abril de 1996, Cidades, C7 ). Os delinqüentes sabem que o prêmio para a traição é a certeza da morte e não a eventual redução da pena.

*Damásio E. de Jesus é Professor de Direito Penal e autor de importantes obras jurídicas, entre elas Código Penal Anotado, Código de Processo Penal Anotado (também disponível em CDROM) e Lei dos Juizados Especiais Anotada

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