A boa prática jurídica apoia a prestação jurisdicional

Por Adriano Rodrigo Ponce de Oliveira

Sempre defendi que peças judiciais devem ser redigidas de forma clara e objetiva, evitando-se, dentro do possível, termos e expressões que dificultem a compreensão por parte dos operadores do Direito e principalmente por parte do jurisdicionado, que é o destinatário final do nosso trabalho. Até mesmo a imprensa pode se confundir diante de uma redação muito rebuscada ou que abuse do chamado “juridiquês”.

Peticionar exige técnica. Não se pode ficar refém de modelos (tem gente que não sabe fazer nada sem o seu “pen drive”). Ao se recorrer a modelos, é preciso se perguntar o porquê de cada assertiva e consultar os artigos de lei para não citar dispositivos revogados, o que já constatei.

O excesso de trabalho a que se submetem os profissionais exige que as manifestações sejam concisas e que somente se transcrevam precedentes jurisprudenciais sobre questões mais controvertidas (e não sobre entendimentos já pacificados). Não há tempo para ler “tratados”.

Em alguns casos, anexar cópia do julgado em vez de transcrevê-lo pode evitar que a leitura da peça jurídica seja dificultada. Introduzir muita coisa na petição pode favorecer que pontos realmente importantes passem despercebidos.

Particularmente, adoto impressão na frente e no verso e oriento meu cartório a fazê-lo, pois dessa forma reduzimos o consumo de papel e os processos ficam menos volumosos. Assim agindo, também reduzimos o custo do arquivo permanente que é terceirizado pelo Tribunal e que se baseia na quantidade de papel arquivado. Parece que não, mas o impacto de se compulsar um processo mais “fino” é menor. Há uma tendência em se esperar mais para analisar processos mais volumosos, já que, pelo menos em tese, a apreciação requer mais tempo disponível. Seria interessante que a impressão nos dois lados se difundisse mais…

Ainda falando nas petições, muitas vezes estão acompanhadas de dezenas de cópias de documentos. Nesse caso, é salutar que os documentos sejam numerados e que a cada referência que se faça a eles, se apontem os respectivos números. Além disso, não custa destacar, com caneta do tipo “marca-texto”, as informações mais relevantes que constarem nos anexos.

Mais de uma vez eu já oficiei à Ordem dos Advogados elogiando atuações de profissionais bem organizados sob esse ponto de vista. A razão é simples: há casos em que as dezenas ou centenas de papéis não recebem qualquer tipo de identificação, o que demanda o dobro ou o triplo do tempo e do esforço para a sua análise. Essa análise fica extremamente prejudicada quando os anexos são simplesmente “despejados” no processo sem que haja um roteiro. Por falar em roteiro, vários documentos justificam um índice, não é mesmo? Muitas vezes o profissional acaba não conseguindo se fazer entender tão-somente por não observar tais dicas e o cliente pode sofrer muitos prejuízos.

Ainda sobre os documentos “despejados”, não é demais ressaltar que muitos deles não interessam à discussão. Recentemente eu solicitei à parte que informasse o objeto de outra demanda para eu analisar se eram coincidentes. Em resposta, ela anexou cópia integral do outro processo. Justificando a dificuldade de manuseio, o desinteresse, o prejuízo ambiental e o custo de arquivamento, determinei que mais de 150 folhas fossem desentranhadas (retiradas) e remetidas para reciclagem…

As folhas de suporte devem ser utilizadas apenas quando houver risco de a perfuração do documento a ser juntado interferir no entendimento do seu conteúdo. Já calculou o prejuízo de material, de espaço e de tempo que decorre do procedimento de ficar desdobrando folhas coladas em outras folhas sem necessidade alguma para conseguir ler seu conteúdo?

De resto, também recomenda a boa estética que se evite o uso de várias fontes do editor de texto. Os destaques devem recair somente sobre trechos de fato importantes, preferencialmente com a adoção de um só tipo de recurso (negrito, itálico ou sublinhado).

Por fim, o uso do corretor ortográfico do editor de textos não consome mais do que poucos minutos e gera muitos benefícios. Afinal, a redação truncada também pode impedir a compreensão e o que não é compreendido não será atendido. Tratando-se de situação muito complexa, não custa nada pedir a alguém que leia a petição e diga se está compreensível antes de encartá-la ao processo.

As dicas versam a prática judiciária, mas se aplicam a outras atividades. Na era da comunicação digital, é preciso gradativo desapego ao papel e é necessário fazer uso racional dele. Deve-se conciliar a agilidade da comunicação com qualidade. É preciso se fazer entender. Tudo é questão de reeducação e de reflexão sobre como estamos nos portando e sobre como podemos melhorar.

Adriano Rodrigo Ponce de Oliveira é juiz da 2ª Vara de Penápolis (SP).

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