A lei reguladora do estágio estudantil vigente até a publicação da Lei n. 11788/2008 data de 07.12.1977, tendo vigorado, portanto, por mais de trinta anos.
São vastíssimas a exposição doutrinária e as decisões jurisprudenciais sobre o tema, sobretudo após a alteração do anterior texto legal pela MP n. 2164, de 24.08.2001, que abriu a possibilidade de estágio por estudantes de ensino médio não profissionalizante.
Com efeito, foi, sobretudo, a partir desta alteração legislativa que houve significativo incremento na concessão de estágios por parte da iniciativa privada e, concomitantemente, expressivo aumento das situações de fraude trabalhista, com o completo desvirtuamento das relações de estágio e utilização dos estudantes como mão-de-obra extremamente barata, em substituição aos empregados devidamente formalizados.
Tais fatos, em grande parte implementados por agentes de integração que cobram quantias mensais das empresas concedentes por estudante intermediado, fizeram necessária, ao longo dos últimos anos, intensa atuação da Fiscalização do Ministério do Trabalho e Emprego e do Ministério Público do Trabalho visando a coibir o mencionado desvirtuamento das relações de estágio.
Foram inúmeras ações fiscais e medidas judiciais coletivas implementadas com tal escopo, tendo havido, na maioria absoluta das vezes, a regularização das situações de fraude encontradas, em sede administrativa ou judicial.
No entanto, a atuação dos agentes públicos responsáveis pela coibição de tais irregularidades sempre demonstrou ser insuficiente para a completa eliminação das fraudes, tendo em vista, principalmente, a insuficiência de pessoal e de recursos.
Neste contexto, o legislador editou nova regulamentação legal sobre o tema, tendo, a nosso sentir, avançado em diversos aspectos, mas retrocedido em outros ou, ao menos, deixado de aproveitar a oportunidade de corrigir certas brechas do texto legal anterior.
De fato, várias são as inovações positivas no novo texto. A primeira e das mais relevantes delas é a previsão expressa de responsabilização dos agentes de integração que indicarem estudantes para a realização de atividades incompatíveis com a estrutura curricular, bem como estudantes de cursos para os quais não há previsão de estágio curricular (art. 5º, §3º).
Evidente que não seria necessária a expressa previsão legal de responsabilização de quem desvirtua a relação de estágio, haja vista, inclusive, a vasta atuação do Parquet Trabalhista contra agentes de integração, mas a experiência demonstra que a disposição literal é bastante salutar.
O art. 5º da nova lei, além de prever a aludida responsabilidade, dispõe claramente quais são as atribuições dos referidos agentes de integração, os quais, aliás, não possuíam, até então, regulamentação legal, mas apenas sua previsão no art. 7º do Decreto n. 87497/1982, que regulamentou a antiga lei do estágio.
O decreto de 1982 já proibia e, agora, a nova lei também veda a cobrança de qualquer valor dos estudantes. Entretanto, a lei não veda a cobrança de valores das empresas concedentes do estágio, limitando-se a dispor que as instituições de ensino e as partes cedentes de estágio podem recorrer a serviços de agentes de integração públicos ou privados, “mediante condições acordadas em instrumento jurídico apropriado” (art. 5º, caput). No entanto, lembra Rodrigo Carelli que essas instituições não deveriam ter fins lucrativos, por contrariar a sua natureza e as colocar como empresas que lucram com trabalho alheio, o que se conhece como “marchandage”, na seara trabalhista. [01] Desta forma, também não poderiam cobrar valores por estudante colocado nas empresas cedentes, pois tais agentes se tornariam verdadeiros sócios dos trabalhadores em sua atividade, devendo sua atuação se limitar à relação entre as instituições de ensino e as empresas cedentes de estágio, e não participar da relação estudante-empresa cedente. [02]
De nossa parte, entendemos que grande oportunidade foi perdida no sentido de clarificar tal aspecto no novo diploma legal, a exemplo da previsão expressa de responsabilidade, pois justamente a busca indiscriminada de lucro foi o que incrementou a utilização desvirtuada da relação de estágio, sob a égide da lei de regência anterior.
A nova lei, se tinha o escopo de prevenir fraudes com o desvirtuamento da relação de estágio, perdeu a oportunidade de extirpar a incongruente possibilidade de estágio dos estudantes de nível médio não profissionalizante. De fato, como acima referido, foi a partir de tal previsão legal, inserida em nosso ordenamento pelo pouco democrático instrumento da medida provisória, sem qualquer participação do Poder Legislativo e do debate popular, que se iniciou um forte movimento patronal de substituição de sua mão-de-obra regular pela precária e barata utilização de (falsos) estagiários.
Com efeito, a MP n. 2164-41/2001 , sem adentrar na sua falta de preenchimento dos requisitos constitucionais de relevância e urgência, foi editada sob a égide de governo de perfil deliberadamente neoliberal, e com forte tendência flexibilizante da legislação de proteção social, sobretudo no que diz com os direitos fundamentais trabalhistas e de índole previdenciária. Nesse contexto, não é difícil deduzir que a intenção, ainda que disfarçada, era mesmo de precarização das relações trabalhistas, como diversas outras medidas legislativas do mesmo período.
À época, os diversos operadores da seara trabalhista se surpreenderam com a dificuldade de compatibilização do estágio de nível médio não profissionalizante com os requisitos da relação de estágio, sobretudo no que diz com os requisitos de natureza material.
Assim, já anotou Rodrigo Carelli que a introdução da referida norma não exclui os demais requisitos impostos pela lei, permanecendo a necessidade de se proporcionar experiência prática na linha de formação do estagiário, complementando o ensino, de acordo com a estrutura curricular. Portanto, só será válido o estágio em nível médio se as atividades desenvolvidas se relacionarem diretamente com o curso freqüentado pelo estudante, não podendo ocorrer a utilização do estágio para a substituição de pessoal regular, em atividades discrepantes com o currículo escolar. Questiona o referido autor, por fim, em que áreas poderia ser realizado estágio em nível médio não profissionalizante, concluindo que apenas em atividades que guardarem estreita vinculação com a grade curricular de nível médio. [03]
Delgado também assevera que dificilmente os requisitos materiais do estágio conseguirão, na prática, ser preenchidos, no caso de estágio por parte de alunos de ensino médio não profissionalizante, ressaltando que, em qualquer situação, o estágio só será válido “caso atenda os requisitos materiais que asseguram o cumprimento de seus objetivos de natureza educacional complementar”. [04] Por tais razões, a nosso sentir, grande oportunidade foi perdida para excluir tal possibilidade de nosso ordenamento. Afinal, no que se refere ao ensino médio não profissionalizante, sempre vamos encontrar muito mais casos de fraude do que de legítimas relações de estágio.
Importa, nessa quadra, não se olvidar que o estágio, afinal, não se presta a ser o “primeiro emprego” do estudante, para que o mesmo obtenha “experiência” e, finalmente se insira no mercado formal. Não era esta a intenção da lei de regência anterior, e nem é a da atual norma. A nossa Constituição da República, ao descrever todos os direitos fundamentais atinentes aos trabalhadores, não fez ressalva alguma, além da alusiva aos domésticos. Destarte, revela-se inconstitucional qualquer interpretação da nova lei que considere possível afastar dos trabalhadores seus direitos fundamentais arrolados na Carta Magna, com o argumento sofista de que é para o seu bem, que depois terá melhor colocação com a experiência adquirida no (falso) estágio.
Convém sempre lembrar que na verdadeira relação de estágio, todos os requisitos da relação de emprego podem estar presentes, sem que se configure o vínculo empregatício. [05] Desta forma, é de extrema relevância, o correto enquadramento jurídico do tipo contratual (se de emprego ou de estágio), sob pena de se afastar do trabalhador estudante a incidência de toda a proteção de uma legislação social construída em décadas.
Por isso, grande importância deve ser dada aos requisitos formais e, principalmente, materiais da relação de estágio.
Sob a égide do diploma anterior, a doutrina considerava como requisitos formais do estágio a qualificação das partes envolvidas no estágio, o termo de compromisso, o instrumento firmado entre a concedente de estágio e a instituição de ensino e a concessão de seguro de acidentes pessoais. [06]
Destaca-se no novo diploma regente, a possibilidade, antes vedada, da parte concedente do estágio ser profissional liberal de nível superior. Com efeito, tratava-se de grave omissão do texto anterior, uma vez que profissionais como médicos, dentistas, advogados, arquitetos, entre outros, não se encontravam aptos, do ponto de vista formal, a conceder estágio. Como notório, o estágio com profissionais renomados em suas áreas de atuação sempre foi bastante cobiçado, por sua importância para a formação do estudante. Trata-se, portanto, de uma daquelas situações em que a realidade fática vem cumprir seu papel de fonte material do Direito, a fazer com que o legislador venha acompanhá-la.
Sempre foi possível observar que, na prática, geralmente se encontram presentes os requisitos formais acima referidos, mesmo nos casos de flagrante desvirtuamento do estágio. De fato, é comum que a empresa concedente mantenha falsos estagiários com toda a documentação acima mencionada e, no entanto, resta patente a finalidade de mera precarização das relações de trabalho com a substituição de sua mão-de-obra regular pela utilização de (falsos) estagiários.
Por isso, muito mais importantes do que os requisitos meramente formais são os chamados requisitos substanciais ou materiais do estágio.
Assim, considera a doutrina, sob o diploma anterior, que tais requisitos incluem que o estágio se realize em locais que tenham condições reais de proporcionar experiência prática de formação profissional ao estudante; que haja compatibilização entre as funções exercidas e o respectivo currículo escolar; que ocorra a efetiva transferência de conhecimentos técnico-profissionais; e que o estágio configure efetiva complementação do ensino e da aprendizagem do aluno. [07]
Tais requisitos, segundo Delgado, visam assegurar o cumprimento dos fins sociais da lei do estágio, ou seja, a efetiva aprendizagem social, profissional e cultural pelo estudante, mediante sua participação em situações reais de vida e de trabalho em seu meio. [08] Trata-se, portanto, dos requisitos que, efetivamente, farão com que se configure a verdadeira relação de estágio, afastando as conseqüências do vínculo empregatício. Por exemplo, se, em uma verdadeira relação de estágio, a parte concedente não fornece o seguro contra acidentes, poderá ser por isso responsabilizada, mas não se há de ter a relação de estágio descaracterizada só por tal motivo. Por outro lado, mesmo se presente toda a documentação formal prevista legalmente, se for observado que o estudante está realizando trabalho subordinado, em nada relacionado à sua área de formação, sem a supervisão da instituição de ensino, sem qualquer transferência de conhecimento em sua atividade, há que se reconhecer descaracterizado o estágio e, com fulcro no art. 9º da CLT, configurados os requisitos dos arts. 2º e 3º do mesmo diploma, deve ser reconhecida a relação de emprego.
Portanto, vê-se que, a par de toda a formalidade legalmente imposta, é imperioso que a relação de estágio atenda a seus fins sociais, sob pena de inconstitucionalidade, uma vez que as normas de direitos fundamentais dos trabalhadores não podem restar afastadas por norma de estatura infraconstitucional.
No novo diploma, embora tenha havido significativa alteração do texto, pensamos que basicamente permanecem os mesmos requisitos substanciais. De fato, o art. 1º, parágrafo 2º, da nova lei, exige a “contextualização curricular” das atividades desenvolvidas pelo estagiário. O art. 3º, inciso III, exige a compatibilidade entre as atividades desenvolvidas e as previstas no termo de compromisso, o qual, por evidente, deve se compatibilizar com a estrutura curricular do curso freqüentado. O parágrafo 1º, do mesmo art. 3º, dispõe ser necessário o acompanhamento efetivo do estágio pelo professor orientador da instituição de ensino e pelo supervisor da parte concedente. Ainda, no art. 9º, inciso II, são exigidas instalações da parte concedente que tenham condições de proporcionar ao educando atividades de aprendizagem social, profissional e cultural.
Portanto, a nova lei, assim como a anterior, deixa bem esclarecido que o escopo do nobre instituto do estágio não corresponde à precarização das relações trabalhistas, por meio da substituição de empregados por mão-de-obra barata e sem a incidência dos direitos fundamentais trabalhistas.
Inovação das mais relevantes é o rol de obrigações impostas às instituições de ensino a que se vinculam os estudantes estagiários. Embora o decreto regulamentador da lei anterior já previsse algumas obrigações, inclusive a coordenação, orientação, supervisão e avaliação do estágio (art. 2º e 4º, do Decreto n. 87497/1982), a verdade é que sempre foi notório (com raras e honrosas exceções) que as instituições de ensino pouco ou nada intervinham nas relações de estágio. E, como não havia obrigação legal expressa, uma vez que o decreto ostenta hierarquia infralegal, nenhuma sanção costumava sofrer.
Entretanto, Souto Maior já previa, sob o diploma anterior, a possibilidade de responsabilização da instituição de ensino que não cumprisse suas obrigações na formação do contrato de estágio, pois deixaria de haver uma relação educacional, entrando em cena uma relação meramente mercantil, em que a escola favoreceria, com sua omissão, a fraude aos direitos trabalhistas, deixando seu papel de educadora para o de uma mera intermediadora de mão-de-obra, devendo se responsabilizar, inclusive, pelos créditos trabalhistas do falso estagiário. [09]
Digna de nota a nova obrigação da parte concedente indicar funcionário seu, com formação e experiência na área de formação do estagiário, para orientação e supervisão do estágio, com limitação de dez estagiários supervisionados simultaneamente. Trata-se, sem dúvida, de obrigação, que pode ser enquadrada como novo requisito formal, que vem ao encontro do verdadeiro propósito do instituto do estágio, uma vez que, se o estagiário desenvolver suas atividades isoladamente, sem a orientação e supervisão direta de alguém experiente na função, não terá como tirar verdadeiro proveito do estágio, limitando-se a trabalhar como qualquer outro funcionário da empresa.
No entanto, de nada adiantará a mera e formal indicação de um funcionário da empresa como supervisor do estágio. É necessário que o supervisor, efetivamente, esteja exercendo suas funções de orientação e supervisão. Aqui estamos diante de requisito substancial da relação de estágio, sem o qual restará o mesmo descaracterizado, pois se trata da efetiva transferência de conhecimentos técnico-profissionais do supervisor para o(s) estagiário(s). Daí a já mencionada diferenciação entre os requisitos formais e materiais, com forte prevalência da importância dos últimos.
Novos requisitos formais também se impõem com o novel diploma, como a limitação de duração do estágio (dois anos), e a limitação do número de estagiários, em conformidade com o total de empregados do estabelecimento, de acordo com a relação constante do art. 17, da nova lei. São, de fato, importantes requisitos tendentes a evitar o desvirtuamento do instituto com a substituição de pessoal regular.
Importante notar que essa limitação da relação estagiários/empregados não se aplica aos estágios de nível superior e médio profissional (Art.17, §4º), o que vem corroborar o que acima mencionado sobre o problema do estágio em nível médio não profissional. O próprio legislador entendeu por bem limitar numericamente apenas este tipo de estágio, já sabendo que aqui é que se encontra campo fértil para fraudes. Melhor teria sido, como já dito, extinguir de vez essa possibilidade, criada em época de fulgor flexibilizante e precarizante das relações de trabalho.
Foi criada também, na nova lei, a relevante obrigação de se assegurar às pessoas portadoras de deficiência, a cota de dez por cento das vagas oferecidas para estágio. Constitui disposição que vem ao encontro dos ditames da Convenção n. 159 e da Recomendação n. 168, ambas da OIT, bem como da Convenção Internacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, da ONU. Assim como de diversas disposições de nossa Constituição, que visam à igualdade de direitos no trabalho (CF, art. 7º, XXXI), à proteção e integração social das pessoas com deficiência (CF, art. 227, §1º, II), e sua integração ao serviço público (CF, art. 37, VIII). Assim, tanto existe agora reserva de vagas para pessoas com deficiência nas empresas com a partir de cem empregados (art. 93 da Lei n. 8213/91), como para todas aquelas que admitirem estagiários, inclusive entes públicos (Lei n. 11788/08, art. 9º, caput, C/C art. 17, §5º).
Pena que o legislador, aparentemente, esqueceu de prever sanção específica para o descumprimento dessa cota de estagiários com deficiência, ao contrário da cota de empregados com deficiência, para cujo descumprimento a legislação expressamente prevê pesada pena pecuniária (Lei n. 8213/91, art. 133, e Portaria MTE n. 1199/2003).
De toda forma, sempre será possível ao Ministério Público do Trabalho, ou outros legitimados, ajuizar ação civil pública, impondo essa obrigação às empresas recalcitrantes, sob pena de cominações pecuniárias (Lei n. 7347/85, art. 11).
Todavia, o que mais chamou a atenção da mídia, inclusive, com alardes de que seria mais difícil a concessão de estágio com a vigência da nova lei, foi a criação de novos direitos aos estagiários, o que “encareceria” um pouco essa concessão.
Tais direitos consistem, principalmente, na limitação da jornada diária e semanal (art. 10), a compulsoriedade da concessão de bolsa ou outra contraprestação, além do vale-transporte nos casos de estágio não obrigatório (art. 12, caput), sua integração facultativa ao Regime Geral da Previdência Social (art. 12, §2º), recesso anual de trinta dias (art. 13), e a incidência da legislação de saúde e segurança no trabalho (art. 14).
Esses direitos correspondem a alguns dos elencados no art. 7º da nossa Constituição, como direitos fundamentais dos trabalhadores. Alguns autores, valendo-se do fato de que a Constituição, no caput do art. 7º, se refere a trabalhadores, e não a empregados, já defendem, há algum tempo, a extensão desses direitos a trabalhadores não empregados, na esteira de uma “interpretação constitucional evolutiva”. [10]
A previsão de parte desses direitos, agora, aos estagiários, vem, sem dúvida, ao encontro dessa atraente idéia de extensão dos direitos fundamentais do trabalho a toda forma de trabalho humano.
Entretanto, nessa quadra, pertinente se faz a observação de Delgado, lembrando que o alargamento que o legislador tem feito de certo rol de direitos trabalhistas, para fora das fronteiras da relação de emprego, tem se demonstrado como artifícios de desregulamentação ou de flexibilização trabalhistas, ou seja, como antítese ao alargamento dos direitos fundamentais, constituindo, na verdade, um mecanismo destinado à sua pulverização. [11]
De fato, aduz o autor que alguns experimentos legislativos vem sendo feitos, criando-se situações supostamente novas de contratação trabalhista, com um rol mais restrito de direitos. É o que ocorreu, por exemplo, com os trabalhadores menores, que tinham um salário mínimo inferior ao padrão geral. Ocorre, atualmente, com os aprendizes e com os estagiários, além dos diversos tipos de contrato a termo. Ocorre, ainda, com os empregados de micro e pequenas empresas, cuja legislação reguladora sempre tenta restringir a proteção jurídica. Desta forma, para Delgado, a extensão de direitos fundamentais trabalhistas para trabalho não empregatício, se não manejada prudentemente, poderia agregar força à tendência de desregulamentação e flexibilização da legislação trabalhista. Isso porque essa extensão tenderia à diminuição do rol de tais direitos, em face das diversas especificidades dos vários tipos de trabalhadores. [12]
É o que, agora, aparentemente, ocorreu. A extensão parcial de direitos tipicamente empregatícios aos estagiários não pode servir de brecha a permitir o desvirtuamento do nobre instituto do estágio. Não pode, agora, o empregador aduzir que já que o estagiário tem direito a salário, limitação de jornada, vale-transporte, férias, INSS, e incidência de normas de segurança e saúde, não tem tanta importância que substitua parte de seus empregados por (falsos) estagiários, no limite da quantidade que a lei permite. É justamente nesse sentido a preocupação do ilustre filósofo e magistrado citado.
Trata-se, em síntese, da seguinte conclusão: estender direitos fundamentais a verdadeiros estagiários, sim; precarizar as relações de trabalho, substituindo pessoal regular por falsos estagiários, posto que reduzidas as diferenças de proteção jurídica, não!
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Notas
CARELLI, Rodrigo de Lacerda. Formas Atípicas de Trabalho. São Paulo: LTr, 2004. p. 102.
MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do Trabalho. 5.ed. São Paulo: Malheiros, 1998. p. 131 apud CARELLI, op. cit. P. 102.
CARELLI, Rodrigo de Lacerda. Op. cit. p. 106/107.
DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 3. ed. São Paulo: LTr, 2004. p. 326.
DELGADO. Op. cit. P. 323.
Cf., com pequenas diferenças, CARELLI, op. cit. P. 103; DELGADO, op. cit. P. 325/326; TEIXEIRA FILHO, João de Lima et al.. Instituições de Direito do Trabalho. Vol. I. 20. ed. atual. São Paulo: LTr, 2002. p. 188; BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. 3. ed. rev. e ampl. São Paulo: LTr, 2007. p. 557.
Cf, principalmente, CARELLI. Op. cit. p. 103, e DELGADO, op. cit. p. 326/327.
DELGADO. Idem.
MAIOR, Jorge Luiz Souto. “Dos Contratos de Estágio Regidos Pela Lei n. 6494/77”. In Revista Trabalho em Revista. Curitiba: Decisório Trabalhista, dezembro de 2002, n. 245, p. 1700-1702.
Cf., p. ex., CARELLI, op. cit. p. 133-136.
DELGADO, Mauricio Godinho. “Direitos Fundamentais na Relação de Trabalho”. In. Revista do Ministério Público do Trabalho. Ano XVI. N. 31. Brasília: Procuradoria Geral do Trabalho, 2006. p. 41.
Idem. p. 41-44.
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Armando Cruz Vasconcellos
Auditor Fiscal do Trabalho (RJ).Especialista em Direito Constitucional. Especialista em Direito e Processo do Trabalho.