Esclareça-se que há duas reformas sindicais em tramitação: a primeira, com 199 assinaturas de deputados, como relator o deputado federal Sérgio Miranda (PC do B – MG), de iniciativa de Confederações, Federações e Sindicatos de Trabalhadores. A segunda, de iniciativa do Governo federal, apresentada pelo ministro do Trabalho, Ricardo Berzoini, tem como relator o deputado federal Vicentinho (PT/SP).
Esta reforma sindical do Governo Lula não só altera o artº. 8º da Constituição Federal como também substitui o Título V, da CLT com 99 artigos, por quase duas centenas e meia de novos artigos que disporão sobre a organização sindical.
Tal volume de normas ainda deixa fora de sua abrangência os seguintes segmentos: 1-servidores públicos; 2-trabalhadores rurais de economia familiar, meeiros e percenteiros; 3-pescadores artesanais; 4-movimentadores de mercadorias não-portuários (avulsos); 5-profissionais prestadores de serviços (liberais).
Dentre os pontos que a reforma sindical inova estão, dentre outros, os seguintes:
a)-reconhece as centrais sindicais como órgão de cúpula do sindicalismo, acima das confederações; b)-autoriza a intervenção (hoje proibida pela Constituição) em entidades sindicais consideradas não-representativas dando ao Ministério do Trabalho o poder de “conferir” a representatividade; c)-amplia o valor da contribuição compulsória a cargo do empregado, mesmo com a extinção do chamado imposto sindical; d)-permite que uma central sindical crie, conforme seu interesse independentemente do número de filiados, novo sindicato em localidade onde já exista um outro funcionando da mesma representação; e)- estabelece um sistema híbrido que é um misto de unicidade (um sindicato representando uma mesma categoria) e pluralidade (vários sindicatos com representações semelhantes); f)-extingue a chamada “categoria” como critério de representação sindical, trocando-a por “ramo de atividade”, cuja definição legal é deixada para depois; g)-substitui o direito legislado (CLT basicamente) pelo direito negociado.
Em síntese, a reforma tem excesso de regulamentação, é cupulista ao reforçar as centrais em detrimento das bases e é hierarquizada, isto é, tenta transformar o fato social (sindicalismo) em instâncias hierárquicas, como se fosse, por exemplo, um partido político.
Uma simples leitura desta proposta já permite, sem maiores aprofundamentos no tema, formular uma crítica que é quase unânime entre os operadores do direito: a incompatibilidade absoluta da nova legislação (face à intervenção do Poder Público nas Entidades Sindicais) com a Convenção que trata da liberdade sindical, de nº 87 – OIT – Organização Internacional do Trabalho – cuja ratificação foi exigida, por anos a fio, por personalidades do Partido dos Trabalhadores ou deste bem próximas politicamente.
A reforma sindical foi apresentada pelo atual ministro do Trabalho como sendo do “consenso” entre representações patronais, laborais e governamental. Da parte laboral nunca foi consenso face a outra reforma sindical em trâmite no Parlamento, aqui noticiada. Líderes patronais, como o presidente da CNI – Confederação Nacional da Indústria, Armando Monteiro Filho; como o presidente da Federação e do Centro do Comércio do Estado de São Paulo, Abram Szajman, não aceitam aspectos relevantes dessa reforma. No próprio PT, parlamentares como o senador Paulo Paim, dentre outros, não se conformam com o texto apresentado pelo Governo. “Consenso”, portanto, não houve. Do jeito que está a reforma sindical Berzoini não passará!
João José de Souza Leite
Advogado trabalhista, ex-Secretário de Cidadania, Justiça e Trabalho