Inúmeros são os processos no Brasil envolvendo médicos, hospitais e seguros saúde e a apuração de suas responsabilidades em relação a danos causados a pacientes. O fato é que os usuários de serviços médicos, mesmo aqueles que provêm de camadas sociais menos afortunadas, têm uma idéia clara de seus direitos como pacientes. Cada vez mais se consolida a percepção do erro, da imperícia, da negligência e da imprudência e, principalmente, a busca da reparação.
Todo indivíduo tem o dever de não praticar atos nocivos, danosos ou prejudiciais à outra pessoa, dos quais resultem prejuízos. Todos devem responder por seus próprios atos ou por atos de terceiros a que possam estar ligados moralmente, principalmente profissionais que atuam na área médica, pois tratam essencialmente de vidas.
Dessa forma, os operadores do direito sempre buscam um maior aperfeiçoamento sobre o tema, tendo como elemento de referência a análise da culpa. A responsabilidade civil do médico, na qualidade de profissional liberal, será apurada mediante a verificação da culpa.
Por outro lado, quando se tratar de serviços médicos prestados, por exemplo, por um hospital como fornecedor de serviços, a apuração da responsabilidade independe da existência de culpa.
Para que o tema fique claro, é necessário explicar alguns conceitos fundamentais. Em primeiro lugar, o de culpa. No sentido jurídico, culpa ocorre quando o agente não visa a causar prejuízo a outrem, mas o dano simplesmente resulta de sua atitude negligente, imprudente ou imperita. Dolo é a violação deliberada, consciente, intencional de um dever jurídico.
O dano, como fenômeno jurídico, é aquele que decorre da inobservância de uma norma. E, por último, deve haver uma relação de causalidade entre a ação ou omissão culposa do agente e o dano à vítima. Ou seja, se a vítima sofre o dano, mas não se evidencia a relação de causalidade com o comportamento do agente, não haverá que se falar em indenização.
Postos esses conceitos, vale destacar duas teorias existentes no direito civil brasileiro com relação à responsabilidade civil: a Teoria Subjetiva e a Teoria Objetiva.
Na Teoria Subjetiva, a responsabilidade se baseia na noção de culpa, cabendo à vítima provar a culpa do agente e se demonstrada negligência, imprudência ou imperícia deste, decorrerá o dever de indenizar. Já a Teoria Objetiva tem como postulado que todo dano é indenizável e deve ser reparado por quem a ele se atrela por um nexo de causalidade.
No caso do médico, não há o compromisso de curar, mas tão somente o de proceder de acordo com as regras e métodos da profissão. O que se exige do médico é a prestação de serviços conscienciosos, atentos, zelosos, bem como a utilização de recursos e métodos adequados.
Assim sendo, a responsabilidade civil médica ocorre quando a vítima demonstrar que o profissional agiu sob qualquer modalidade culposa, ou ainda com dolo. Em qualquer desses casos, a prova cabe àquele que se disser prejudicado. A responsabilidade civil médica é, conforme acima exposto, subjetiva.
Algumas vezes, entretanto, pode-se presumir a culpa (Teoria Objetiva), como no caso de cirurgias plásticas estéticas, exames de laboratório e check-up. Nesses casos, tem-se a chamada obrigação de resultado, ou seja, o profissional se obriga a atingir determinado fim. O que interessa é o resultado de sua atividade.
No caso de hospitais e clínicas, a responsabilidade é objetiva quanto aos atos de seus prepostos ou empregados. Segundo a Teoria Objetiva, se presume a culpa de hospitais e clínicas por atos praticados por médico vinculados a eles.
Porém ao estabelecimento cabe o direito de regresso (direito à recomposição de seu patrimônio) contra o seu agente culpado. O mesmo ocorre com as operadoras de saúde quanto aos defeitos do serviço prestado por médico a ela vinculado ou hospital por ela mantido.
O artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor dispõe que “o fornecedor de serviços responde, independentemente da existência da culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação de serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos”.
Dessa forma, sendo a operadora de saúde pessoa jurídica que explora atividade empresarial no ramo de medicina, é irretorquível que se enquadra no conceito legal de fornecedor de serviços e que é objetiva sua responsabilidade por eventuais defeitos médico-hospitalares prestados aos consumidores em geral.
É um tema cheio de peculiaridades e, portanto, deve ser analisado e estudado cada caso concreto, não só pelos operadores do direito, mas também por todos aqueles que prestam serviços ligados à área de saúde.
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Alessandra Abate é advogada especializada em direito civil do escritório Correia da Silva Advogados