A vara especializada de execução das penas alternativas

(*) Grecianny Carvalho Cordeiro

A partir do advento da Lei 9714/98, o Estado do Ceará, de forma pioneira, criou na Comarca de Fortaleza uma Vara Especializada na Execução de Penas Alternativas através da Lei Estadual nº 12.862 de 25/11/98, com a seguinte competência:

“Art. 121. Ao Juiz da Vara de Execução de Penas Alternativas compete:

I- promover a execução e fiscalização das penas restritivas de direitos e decidir sobre os respectivos incidentes, inclusive das penas impostas a réus, residentes na Comarca de Fortaleza, que foram processados e julgados em outras unidades judiciárias;

II- cadastrar e credenciar entidades públicas ou com elas conveniar sobre programas comunitários, com vista à aplicação da pena restritiva de direitos de prestação de serviços à comunidade;

III- instituir e supervisionar programas comunitários para os fins previstos no inciso anterior;

IV- fiscalizar o cumprimento das penas de interdição temporárias de direitos e de limitação de fim de semana”.

Conforme se infere da análise do texto acima transcrito, a Lei Estadual 12.862/98 restringiu a competência do Juízo da Vara de Execução de Penas Alternativas tão somente para executar e fiscalizar as penas restritivas de direitos , decidindo sobre seus incidentes, bem como para fiscalizar o cumprimento das penas restritivas previstas nos incisos V e VI do art. 43 do CPB.

A Vara de Execução de Penas Alternativas da Comarca de Fortaleza, além de se encontrar materialmente bem estruturada, conta com um corpo técnico capacitado, inclusive com psicólogo, assistente social e defensor público exclusivo, dispondo, portanto, de excelentes condições para fiscalizar de forma efetiva e eficaz o cumprimento das penas restritivas de direitos.

Para se ter uma idéia, a Vara de Execução de Penas Alternativas conta atualmente com o número de 45 entidades credenciadas para a aplicação da pena de prestação de serviços à comunidade, sendo 32 entidades já beneficiadas pelos serviços prestados pelos apenados.

Ocorre que, a partir da análise do número de processos que chegam à Vara de Execução de Penas Alternativas, pudemos constatar quão grande tem sido a resistência dos operadores do direito, principalmente dos magistrados em aplicar os dispositivos da Lei 9714/98.

“Esquecendo-se” alguns magistrados que, presentes as condições previstas no art. 44 do CPB, a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direito ou multa substitutiva é um direito subjetivo do réu, estes limitam-se, por ocasião da prolação da sentença condenatória, a conceder o sursis ou determinar o cumprimento da pena privativa de liberdade no regime aberto, detalhe esse que deixa passar despercebido o Ministério Público e o defensor do réu.

Ora, em se tratando de crime doloso, cometido sem violência ou grave ameaça à pessoa, cuja pena privativa de liberdade aplicada não seja superior a quatro (04) anos, ou em se tratando de crime culposo, qualquer que seja a pena aplicada, e preenchendo o réu os requisitos legais de que tratam os incisos II e III do art. 44 do CPB, há que ser aplicada a substituição, não havendo que se falar em condenação no regime aberto ou em concessão de sursis , tal como vem acontecendo de forma reiterada.

“Penal- Substituição da pena privativa de liberdade por uma das penas restritivas de direito. Sursis. Inadmissibilidade. Obrigatoriedade da substituição quando reconhecidas as circunstâncias favoráveis do art. 59 e as condições dos incisos II e III do art. 44, c/c o seu par.ún., todos do CP. Direito subjetivo do réu. Etapa obrigatória da aplicação da pena. Recurso especial provido. I- Só se admite a concessão do sursis quando incabível a substituição da pena privativa de liberdade por uma das penas restritivas de direito, conforme preceitua o art. 77, inciso III, do CP. Torna-se obrigatória a substituição das penas privativas de liberdade por uma das restritivas de direito, quando o juiz reconhece na sentença as circunstâncias favoráveis do art. 59, bem como as condições dos incisos II e III do art. 44, c/c o seu par.ún., todos do Código Penal, caracterizando-se direito subjetivo do réu (STJ, REsp 67.570-SC, 6 ª Turma, rel. Min. Ademar Maciel, DOJ 26.08.96, p. 29.730)”

Dispõe o art. 59, inciso IV do CPB que o juiz, “atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e conseqüências do crime” estabelecerá a “substituição da pena privativa de liberdade aplicada, por outra espécie de pena, se cabível.”

“(…)cabe ao juiz, na sentença, verificar a pertinência de eventual substituição da pena de prisão por outra pena alternativa,(…)” (Luiz Flávio Gomes. Penas e Medidas Alternativas à Prisão, São Paulo, ed. RT, 1999, p. 155)

Logo, grande parte dos magistrados cearenses, quando por ocasião da prolação da sentença condenatória, não vem observando as inovações trazidas no Código Penal através da Lei 9714/98, ignorando-as por completo, “preferindo” aplicar incorretamente as regras do regime aberto ou o sursis a réus que possuem o direito público subjetivo à substituição, ao invés de aplicar uma pena alternativa.

Tencionamos através dessas linhas simplesmente alertar os operadores do direito para que essa equivocada prática forense se adeqüe à nova realidade implantada pela Lei 9714/98, cuja aplicabilidade não se constitui numa mera faculdade do juiz, mas sim num direito público subjetivo do réu, desde que preenchidas as exigências legais.

(*) A autora é Promotora de Justiça da Comarca de Jaguaretama e Mestranda em Direito Público pela UFC. grecy@for.sol.com.br

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