Advocacia criminal: sobre nossa indispensabilidade e a Democracia

Autores: Gamil Föppel El Hireche e Pedro Ravel Freitas Santos (*)

 

Embora nós apenas fizéssemos cumprir a Constituição, nossa atuação contrariava as violências dos que tinham tomado o poder à força.”

Essa frase não foi dita hoje. Essa frase não foi dita sobre hoje. Evandro Lins e Silva, o autor da oração acima indicada, se referiu à sua cassação do Supremo Tribunal Federal no regime militar… Se hoje a violência não é mais física, as prerrogativas dos Defensores são constantemente violentadas, talvez de forma até mais grave.

Advocacia, advogado criminal, defensor, liberdade… Inocência, chaga, dor, cuidado, desespero. A filha que grita a saudade do pai. O pai que derrama a lágrima pelo filho preso… A esposa que aguarda…

Ser advogado é ser humano.

Não se está advogado, se é advogado, pois advogar é tomar indelevelmente a dor, a angústia do outro. É colocar-se à frente dos que são alvejados pelas pedras, afinal advogar não é profissão de covardes, como sabiamente asseverou Sobral Pinto.

O advogado criminal replica, ao fim e ao cabo, as lições de grandes expoentes da história. O que devem ter falado de quem se pôs a defender Jesus Cristo, Tiradentes… O que devem ter falado dos que criticaram o Regime Nazista… O que devem ter falado dos que defendiam os subversivos presos nos idos da ditadura militar do Brasil… Advogar é não se importar para o que falam. Advogar é agir, e com coragem, sempre.

Embora sendo humano e possuindo, por conseguinte, todos os vícios e virtudes dos homens, o advogado criminal deve reunir, ouso dizer, a paciência de Buda e a altivez de um Revolucionário…

Não importa quem seja o inimigo da rodada, o advogado estará sempre ao lado deste sujeito apontado e apedrejado…

Advocacia criminal é se comprometer com a perfeição. A utopia da liberdade é ao mesmo tempo energia.

Se para o eterno Rui Barbosa, a profissão de advogado tem uma dignidade quase sacerdotal, é preciso nos esforçarmos, diuturnamente, contra as demonstrações de totalitarismo, cada vez mais frequente…

Advogar é se comprometer para que os ventres de amanhã permaneçam livres…

Advogar, falar, agir, gritar e gritar.

Continuemos a gritar e um dia, quiçá um dia, seremos ouvidos. Um dia o Brasil (e também o Paraná) se abrirá para os desígnios da Constituição. Um dia contextos não serão pretextos para impedir a nossa luta. Por ora, olvidam delas, mas estaremos sempre ao lado daqueles que os ‘bons’ não querem mais.

Advogar é suplício, súplica, suor…

Advogar é se expor para evitar o linchamento animalesco do sentimento de vingança…

É sair dos contextos intentados por um Estado cada vez mais policialesco e manter-se crente na fé.

Crença na Constituição. Crença nos homens. Crença na Democracia.

Não há Democracia sem defesa, pois a ausência de defesa é autoritarismo.

Mas precisa-se de defesa real, defesa com prerrogativas sérias, defesa com respeito, defesa com dignidade, defesa com seriedade.

Lembremos sempre que se o corpo pode ser levado à autoridade judicial por qualquer do povo, na maior parte das vezes são os advogados quem carregam os cidadãos à Justiça.

Não à toa, a advocacia criminal é comemorada dias antes do Dia guardado à Justiça.

Pois também nunca haverá, ainda que os totalitaristas desejem, Justiça sem Defesa.

Não é uma questão de sermos melhores. Não se trata de estar acima do bem e do mal.

Trata-se somente de sermos indispensáveis. Ao menos, para a Constituição da República…

Por fim, nosso Raul Chaves:

“Advogar é, em essência, defender intransigentemente os direitos das pessoas, os seus sentimentos, os seus anseios, é compreender as angústias, os problemas dos outros como se seus fossem. Na área crime, é lutar pela proteção às suas liberdades, evitar os excessos da acusação, conter o sensacionalismo, os pré-julgamentos.”

Um abraço aos advogados criminalistas do país, que resistem a tempos sombrios, e, em particular, aos baianos.

 

 

 

 

 

Autores: Gamil Föppel El Hireche é advogado e professor. Doutor em Direito Penal Econômico (UFPE). Membro da Comissão de Juristas para atualização do Código Penal e da Comissão de Juristas para atualização da Lei de Execuções Penais.

 Pedro Ravel Freitas Santos é pós-graduando em Ciências Criminais (Faculdade Baiana de Direito). Graduado em Direito (Universidade Federal da Bahia. 2015.1). Técnico Administrativo Ministério Público da Bahia (2012-2015).


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