Autor: Diogo Póvoa e Pedro Helou (*)
Para a maioria das pessoas que pensa em falar em público, surge imediatamente uma sequência de sensações psíquicas que transitam entre o medo e o receio em se expor. Em seguida, somos tomados pelas sensações físicas: o coração bate mais acelerado, a mão sua, e a barriga começa a doer. Aparecem, então, nossas crenças limitantes: “não vou conseguir”; “vai dar branco”; ”vou gaguejar”.
E por que sempre que pensamos em falar em público, na chamada oratória, já nos vem à cabeça uma apresentação para uma grande plateia, em um ambiente formal? Para os advogados, o primeiro desafio que vem em mente é a sustentação oral.
Pelos inúmeros padrões construídos, fomos conduzidos a achar que a oratória não faz parte do nosso dia a dia, mas tão somente de ambientes sisudos e “profissionais”. É hora de desconstruirmos essas crenças, tanto em relação à limitação da utilização da oratória como o pavor das sustentações orais.
A oratória faz parte da nossa vida cotidiana, seja em ambiente formal ou informal, seja em uma conversa no dia a dia, seja em reuniões, palestras, audiências, despachos ou sustentações orais.
Uma premissa básica que temos que ter em todos os momentos em que nos expomos é: a oratória tem por objetivo gerar ação no nosso público-alvo. Ou seja, sempre que nos expressamos, precisamos saber que o nosso propósito é que o nosso cliente em prospecção nos contrate, que o cliente confie na nossa tese, que o julgador julgue favoravelmente aos nossos pedidos.
Então, existem três pilares básicos a serem trabalhados na oratória: a inteligência emocional; o conteúdo; e a forma.
A inteligência emocional é o que costumamos chamar de pilar de concreto, afinal, é a base da nossa oratória. Se esse pilar desmoronar, toda a sua exposição pode vir por água abaixo e, por isso mesmo, é o mais difícil de ser construído, em razão das inúmeras crenças limitantes que cada um de nós possui. Nesse pilar, além de muitas outras habilidades, temos de trabalhar alguns mindsets (forma de pensar) que concretizam a nossa exposição: mindset da oportunidade; mindset da entrega; e o mindset da recompensa.
O mindset da oportunidade é aquele que nos leva à gratidão por vivenciar aquele momento de exposição. Por exemplo, aquele advogado renomado e com anos de experiência com o qual você trabalha não poderá fazer a sustentação oral de um processo muito importante, e então você encara esse momento como uma oportunidade. Foque nesse mindset, até porque poucos são os advogados que têm essa possibilidade.
O mindset da entrega é aquele que nos leva a estar concentrado somente na exposição que estamos fazendo, ignorando os julgamentos e a aceitação social. A partir desse mindset o nosso único foco será entregar o conteúdo que fará o nosso público-alvo agir. Se estivermos dispersos e desconcentrados, o nosso público-alvo também ficará disperso e desconcentrado.
O mindset da recompensa caminha próximo do mindset da oportunidade. A partir daquele desafio que encaramos como oportunidade, ficamos focados nos aplausos e nos elogios que receberemos após nossa exposição, por exemplo. É claro que os advogados também pensam nos honorários.
E, então, depois de sabermos os mindsets do pilar de concreto, precisamos saber quais são as habilidades do conteúdo. O conteúdo é o pilar de gesso, o mais fácil de ser construído e que pode exigir estruturação ou até mesmo improviso. São as palavras, as frases, a verbalização daquilo que nos preparamos para expor. Nesse pilar, existem seis habilidades para serem trabalhadas: a eliminação de ruídos e preenchedores de silêncio; a utilização de perguntas no decorrer da exposição; a exposição do modo mais específico, direto e óbvio possível; a utilização de exemplos; a utilização de analogias concretas; e o storytelling (a arte de contar histórias).
O que são os ruídos ou os preenchedores de silêncio? São aquelas expressões que descredibilizam a nossa fala e tornam o nosso discurso mais incômodo aos ouvidos do nosso público-alvo. É o caso do “né”, do “éééé”, e tantos outros. Uma exposição sem ruídos e preenchedores é uma exposição mais agradável e mais assimilável.
A habilidade das perguntas é aquela que faz as pessoas pensarem e permite a interação com o público-alvo. As perguntas geram curiosidade no ouvinte e aumentam o nível de atenção daqueles que estão dispersos. São muito recomendadas para o início das exposições, até mesmo para sentirmos quem é o nosso público-alvo, quando não conhecemos.
As perguntas podem nos levar a conhecer mais a fundo nosso público e, portanto, sermos mais específicos, diretos e óbvios na nossa exposição. O uso dessa habilidade não deixa margem à dupla interpretação, uma das causas na falha de comunicação. Isto sem falar que exposições mais específicas e diretas são mais agradáveis do que falas generalistas e genéricas.
Perceberam que a todo o momento damos exemplos? Essa é uma habilidade do pilar conteúdo, em que nos aproximamos do nosso público, que através de exemplos consegue compreender melhor aquela informação passada. A exposição se torna mais didática, logo, de maior assimilação.
Assim como a apresentação de exemplos, o uso de analogias concretas permite a melhor compreensão do tema abordado na exposição. Comecem a apresentação de analogias com “é como se…”, “é a mesma coisa que…”.
Ainda na pretensão de facilitar a assimilação do conteúdo pelo ouvinte, nós temos o storytelling (a arte de contar histórias). Quem já assistiu ao filme Forrest Gump sabe da habilidade do personagem em contar vários eventos de sua vida por meio de histórias que se contrastam com a própria história dos Estados Unidos. As histórias sequenciais são mais bem absorvidas pelo cérebro, e por isso estamos diante de uma habilidade muito trabalhada quando se pretende alcançar a emoção dos ouvintes.
Superados os pilares de concreto e de gesso, precisamos expor o pilar de madeira, que tem uma dificuldade média de construção. A forma nada mais é que o modo como nós (voz e corpo) nos comportamos ao longo da nossa exposição. Na forma, precisamos trabalhar as sete habilidades mais importantes para uma exposição de excelência: técnica do silêncio; técnica do grito; movimentação; variação do tom (intensidade) de voz; técnica da naturalidade; técnica do olhar; e o sorriso.
Nas técnicas da forma, ainda mais do que nas técnicas dos demais pilares, não existe “receita de bolo” ou rigidez na utilização. Existem somente técnicas e habilidades que podem facilitar a superação do seu medo em fazer sustentações orais, por exemplo.
Entrando nas técnicas, a primeira delas é a técnica do silêncio. Lembram dos discursos do Barack Obama? As pausas e o silêncio utilizados como forma de fazer o público pensar e até mesmo de auxiliar a elaboração de ideias do ex-presidente dos EUA. Assim como um atleta precisa oxigenar os seus músculos ao longo da atividade, nós também precisamos fazer o mesmo no decorrer da nossa exposição. Fazendo uma conexão entre forma e conteúdo, a respiração e a pausa diminuem bastante os ruídos e os preenchedores de silêncio. Utilizamos bastante dessa técnica para pessoas gagas.
Sempre na pretensão de manter o público atento e gerar uma ação no ouvinte, nós trabalhamos a técnica do grito, que é aquela em que damos ênfase, aumentando o tom de voz, a algumas palavras ou expressões mais importantes da exposição. Em uma sustentação oral, por exemplo, precisamos “gritar” pelo provimento do nosso recurso.
Variar o tom da sua voz (intensidade) não só para gritar, mas também para usar palavras e expressões com a pretensão de levar emoção aos nossos ouvintes é outra habilidade que devemos estar atentos no pilar da forma. A variação evita aqueles discursos estáticos e cansativos.
Do mesmo modo que nos preocupamos com a nossa voz, precisamos nos preocupar com o nosso olhar. Olhar para o nosso ouvinte significa valorizá-lo e transparecer que a sua presença e análise é muito importante na nossa exposição. Olhar para aquele magistrado que você acredita que pode ser o voto decisivo pode significar um pedido de vista ou até mesmo uma mudança de entendimento.
Como na oratória as habilidades e técnicas não são isoladas, a habilidade do olhar, juntamente com o mindset da entrega, pode significar uma mudança de condução da sua exposição, pois é sempre importante perceber a reação do público a cada momento e reagir às ações.
Apesar de falarmos aqui de algumas habilidades, a naturalidade deve permear na nossa exposição, mas, ainda assim, algumas técnicas facilitam a transparência de tranquilidade e segurança naquilo que se fala. A técnica da naturalidade é aquela em que seus braços e mãos gesticulam e reforçam as informações passadas. Claro, em sustentações orais, o púlpito limita um pouco a técnica da naturalidade, o que não inviabiliza a gesticulação. A gesticulação natural, em vez de ficar segurando a tribuna ou com as mãos para baixo, transmite segurança aos magistrados. Lembrando que o excesso de gesticulação também incomoda, pois transmite afobação e desconforto. Por isso, a técnica da naturalidade de forma suave é a mais indicada.
Ainda na ideia de linguagem corporal, quando não estivermos na tribuna ou sentados em uma reunião, do mesmo modo que a voz não pode ser monótona e em um só tom, não podemos ficar estáticos e fixos em somente um ponto do nosso palco. A movimentação precisa ocorrer, inclusive com a aproximação do público-alvo, se possível for. Caminhar ao longo do palco e do espaço destinado a nossa fala torna a exposição mais agradável e menos cansativa. Nem por isso devemos caminhar incansavelmente, fazendo movimentos pendulares, pois podemos gerar desconforto na plateia.
No decorrer do nosso discurso, o sorriso deve fazer parte da forma como nós falamos, pois sorrisos geram sorrisos e evidenciam simpatia. Já viram que quando alguém boceja a outra pessoa também boceja? Então, quando nós sorrimos, nossos ouvintes também sorriem. Obviamente, nem todos os assuntos e ambientes permitem o sorriso, por isso a sua utilização, assim como as outras habilidades da forma, devem ser trabalhadas de modo natural.
Então, já conseguimos gerar a sua vontade de agir, de se expor e superar o seu medo de dar uma palestra ou fazer uma sustentação oral? Esperamos que sim! Para isso, prepare-se sempre que possível. Treine e pratique. Grave vídeos e áudios como forma de treinamento. Converse consigo no banho ou no carro: são momentos em que estamos sozinhos e, na maioria das vezes, é um tempo quase inútil e não utilizado.
E como dizia Sobral Pinto: “A advocacia não é profissão para covardes”.
Quem não se expõe não se conecta e a advocacia exige essa conexão: uma conexão com a nossa coragem e autoconfiança.
Autor: Diogo Póvoa e Pedro Helou é fundador e facilitador no Instituto Verbalize.