A ação de despejo por falta de pagamento objetiva a rescisão da locação, pelo não-pagamento dos aluguéis e demais encargos, desde que estes estejam previstos no instrumento locatício. A própria lei autoriza que o despejo por falta de pagamento seja cumulado com a cobrança dos aluguéis e encargos.
Quanto à petição inicial do despejo por falta de pagamento, há requisito essencial que a Lei n. 8.245/91 impõe, e que diz respeito à discriminação do valor do débito que deve ser apresentado na petição inicial.
É absolutamente necessário, como em verdade já era antes, embora sem expressa exigência legal, que sejam discriminados, mês a mês, aluguéis e encargos separadamente, a fim de atingir o valor alegado.
Isso permitirá, sem maiores delongas, que o inquilino possa, no prazo da resposta, requerer ao Juiz autorização para pagar o débito apontado, atualizado, sem necessidade de qualquer cálculo judicial.
Além disso, cabe ao inquilino, nessa situação, depositar também o que for exigível com base em cláusulas do contrato de locação, como o valor das multas moratórias, correção monetária e honorários de advogado, se tudo isso, repito, estiver previsto em contrato e requerido na inicial, exceto a verba honorária, que já decorre de lei.
Decretado o despejo por sentença, nos mesmos autos, a lei faculta ao locador a cobrança dos alugueres e encargos da locação, se tiver havido cumulação da rescisão da locação com a cobrança de alugueres.
A demanda (Ação de Despejo por Falta de Pagamento) pode ser proposta no dia imediato ao do vencimento do aluguel, entendendo, erroneamente, alguns locatários que o locador deva aguardar o vencimento de três alugueres para ajuizar a ação. Esse entendimento não encontra guarida na lei porque, constando do contrato o dia certo em que o locatário tem de cumprir a obrigação, o dia subseqüente, logicamente, configura a mora, ou seja, o atraso no cumprimento da obrigação.
Citado da ação, é facultado ao locatário, através de petição subscrita por advogado, regularmente constituído, ou por si próprio, requerer autorização para purgar a mora (pagar as despesas dos alugueres e encargos devidamente atualizados, multas ou penalidades contratuais exigíveis, juros de mora, custas processuais e verba honorária) no prazo de 15 (quinze) dias, contados da juntada aos autos do mandado devidamente cumprido por Oficial de Justiça. Deferido o pedido, o locatário terá o prazo de 15 (quinze) dias para efetuar o depósito do valor autorizado, após a intimação do deferimento.
Observo que, consoante lições pretorianas, independe de advogado a petição do inquilino que comparece apenas para purgar a mora.
Segundo alguns julgados, pela simplicidade de que o ato se reveste, a razão está em que a emenda da mora se constituiu em pagamento que é ato de direito material, e, assim, não exige a presença daquele profissional. É sempre necessária a constituição de advogado, como elemento indispensável à administração da Justiça, para atos, como os processuais, que exigem capacidade postulatória, a qual é privativa dos bacharéis em Direito, devidamente inscritos na Ordem dos Advogados do Brasil.
Sempre se teve por incompatível o réu contestar o pedido de despejo por falta de pagamento e concomitantemente purgar a mora. Considero que essas atitudes, por parte do inquilino, continuam a ser antagônicas.
Contudo, alguns julgados admitem a purgação parcial da mora (o valor que o inquilino entende devido) e contestação, como exegese do art. 62 da Lei n. 8.245/91, in verbis:
“À luz do que dispõe o art. 62 da Lei n. 8.245/91, na ação de despejo por falta de pagamento pode o inquilino cumular pedido de purgação parcial da mora, da quantia que ache exata, com contestação relativa às verbas que, no seu entender, estão sendo cobradas indevidamente pelo senhorio” (Agravo de Instrumento n. 369916, Relator Claret de Almeida, julgado em 19-10-1992, publicado no DOE Poder Judiciário em 18-12-1997).
Caso o locatário venha a discordar dos valores cobrados na ação de despejo, poderá contestar o feito, correndo, entretanto, sério risco de ser despejado, caso, posteriormente, se verifique a exatidão dos cálculos do locador, perdendo, conseqüentemente, o seu patrimônio, ou seja, o seu ponto comercial.
A lei vigente, porém, embora não autorize de modo expresso que o locatário adote, simultaneamente, essas duas providências processuais, permite que se infira, de seu texto, essa dupla possibilidade, ao menos quando dispõe que, se a emenda da mora não for integral, nem for complementado o depósito, o pedido de rescisão prosseguirá pela diferença, mas, ainda assim, o autor pode levantar a quantia que for incontroversa.
Permitindo-se que o locador levante a quantia incontroversa, evita-se que a demora no julgamento da ação o prejudique. Na sistemática anterior, no curso da instrução da ação de despejo não se permitia o levantamento de qualquer importância, até a decisão final, motivada principalmente pelo fato de não se entender a ação de rescisão como sendo também um pedido de cobrança.
Não será possível purgar a mora (pagar), quando, por duas vezes, nos 12 (doze) meses anteriores à Ação de Despejo, o locatário já o tiver feito. Nessa hipótese, o locador deve instruir a petição inicial com a prova da existência das duas ações anteriores, bem como do pagamento dos valores nas duas oportunidades, para que se verifique a impossibilidade da terceira liquidação.
Na ação de cobrança, o locador, além do aluguel, pode exigir o condomínio e demais encargos, desde que estes estejam previstos no contrato de locação. Essa matéria não é tranqüila, pois existem alguns entendimentos jurisprudenciais em contrário, no sentido que os títulos executivos necessitam de expressa indicação legal, o que não ocorre com o IPTU, despesas de energia elétrica e de elevadores.
Compartilho, outrossim, com a opinião de que aludidas verbas possam vir a ser cobradas em sede de execução, desde que previstas no contrato de locação, já que, de acordo com o art. 585, II, do Código de Processo Civil, o documento público é título executivo desde que subscrito por duas testemunhas.
Além do mais, seria desfavorável ao credor ajuizar uma ação ordinária para cobrança do IPTU, despesas de energia elétrica e de elevador e outra para a cobrança de alugueres, o que, de certa forma, infringe o princípio da economia processual.
* Mário Cerveira Filho
Assessor da Presidência do Tribunal de Ética e Disciplina da Ordem dos Advogados do Brasil, Juiz Arbitral da ABAR (Associação Brasileira de Mediação e Arbitragem, Advogado da ABRALSHOP (Associação Brasileira dos Lojistas de Shopping) e da ALSHOP (Associação dos Lojistas de Shopping do Estado de São Paulo), Cruz do Mérito Filosófico e Cultural.