Alterações do CPC – Lei 10.444 de 07/05/2002 (Parte II)

Breves comentários finais

Marco Aurélio Romeu Fernandes*

Encerramos nossa manifestação no artigo anterior, fazendo comentários sobre as mudanças havidas no CPC, por força da Lei 10.444/2003, no campo da liquidação de sentença.

Quando falávamos acerca das alterações introduzidas no art. 273 do CPC, mencionamos a modificação havida com a incidência, desde então, dos artigos 461 e 461-A, naquela especial forma de provimento jurisdicional.

Contudo, abstivemo-nos de comentar estes dois últimos dispositivos.

Notadamente, o art. 461, a partir da redação dada pela Lei em análise, passou a contar com uma disposição distinta.

A novel lei fez inserir no CPC um novo artigo, mais precisamente o Art. 461-A, que trouxe a seguinte redação:

“Art. 461-A. Na ação que tenha por objeto a entrega de coisa, o juiz, ao conceder a tutela específica, fixará o prazo para o cumprimento da obrigação.

§ 1º Tratando-se de entrega de coisa determinada pelo gênero e quantidade, o credor a individualizará na petição inicial, se lhe couber a escolha; cabendo ao devedor escolher, este a entregará individualizada, no prazo fixado pelo juiz.

§ 2º Não cumprida a obrigação no prazo estabelecido, expedir-se-á em favor do credor mandado de busca e apreensão ou de imissão na posse, conforme se tratar de coisa móvel ou imóvel.

§ 3º Aplica-se à ação prevista neste artigo o disposto nos §§ 1º a 6º do art. 461.”

Percebe-se que a nova redação provocou mudança substancial no procedimento das ações de conhecimento que buscam o cumprimento de obrigações para entrega de coisa.

A possibilidade da utilização da técnica da tutela específica já prevista para as obrigações de fazer e não fazer, inserta na reforma de 94, agora foi ampliada para aquelas de entrega de coisa. E esta foi a grande mudança introduzida pela Lei 10.444 nesta seara.

Esta tutela específica, ou seja, a obtenção do mesmo resultado que se teria caso a obrigação não pecuniária fosse cumprida espontaneamente, reveste-se de singular relevância dentro do processo civil contemporâneo.

O legislador, à luz da busca incessante da maior efetividade do processo, carreou para as obrigações de entrega de coisa sobre as quais ainda não restou consolidado título executivo, a possibilidade da utilização daqueles meios previstos no próprio artigo 461, antes reservados apenas às obrigações de fazer e não fazer.

Assim, nas hipóteses de obrigações para entrega de coisa que estejam lastreadas em um título executivo extrajudicial, permanecem aplicáveis as regras fixadas nos artigos 621 e seguintes do CPC.

Por sua vez, quando ainda inexistir título hábil a autorizar a execução, “as funções de cognição e de execução não serão mais bipartidas em duas relações jurídicas processuais. A partir da vigência da nova regra introduzida pelo art. 2º da Lei n. 10.444/2002, as funções de cognição e execução serão exercidas na mesma relação jurídica processual, seja por intermédio da técnica de execução lato sensu, seja por intermédio do uso de provimentos mandamentais, tal qual determinam os §§ 3º e s. do art. 461, que foram expressamente estendidos ao art. 461-A.”

Por conseqüência desta nova estrutura, também os artigos 621 e 624 restaram com suas redações alteradas.

O artigo 621 passou a conter expressa menção de que trata de procedimento executivo lastreado em título extrajudicial, in verbis:

“Art. 621. O devedor de obrigação de coisa certa, constante de título executivo extrajudicial, será citado para, dentro de 10 (dez) dias, satisfazer a obrigação ou, seguro o juízo (art. 737,II), apresentar embargos.”

Por sua vez, o art. 624 teve alterada a expressão “devedor” por “executado”, a fim de aprimorar a técnica utilizada.

Em conclusão, o que podemos tranqüilamente afirmar é que o legislador vem cada vez mais ampliando a técnica processual por intermédio da qual o juízo cognitivo e de execução se implemente numa mesma relação jurídica processual.

Com a grande inovação trazida no art. 461 na reforma de 94, que teve como grande mérito “tornar comum a regra de cognição com execução num só processo para todos os casos de obrigações de fazer e não fazer em que o credor não disponha de título”, o legislador abriu caminho para, passo a passo, com ampliações gradativas de utilização desta técnica, reduzir, senão vir a extinguir, o processo de execução autônomo do processo de conhecimento, quando ausente título executivo extrajudicial.

Sem dúvida, com isso, e quando tal sonho alcançarmos, poderemos responder, ou melhor, não precisaremos, advogados, explicar ao cliente vencedor de uma demanda que tenha tramitado por longos anos que, embora detentores de uma sentença judicial que lhes tenha reconhecido o direito postulado, ainda não recebeu o bem da vida discutido, sendo necessário novo calvário, agora de execução, para que aquela pretensão antes resistida e agora insatisfeita, venha a ser finalmente alcançada.

*Advogado – Professor de Direito Processual Civil (Faculdade de Direito/UFPel)

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