Autores: José Luiz Conrado Vieira e Angelo Corsetti (*)
Os gestores financeiros de uma empresa sabem que para a obtenção de bons resultados e a criação de valor para os acionistas, uma das principais medidas é minimizar o seu custo de capital. Nesse sentido, é indispensável a avaliação permanente da estrutura de capital da empresa, de modo que reflita uma proporção entre quantidade de capital próprio (patrimônio líquido) e capital de terceiros (endividamento) que traduza um trade-offcapaz de preservar, ao longo do tempo, um equilíbrio saudável entre risco e retorno, criando condições para a maximização do seu valor.
Por conseguinte, um dos elementos centrais da gestão empresarial é a escolha de suas fontes de financiamento, pesando aí, dentre outros, não só a questão do enquadramento jurídico e contábil dos recursos (capital próprio ou de terceiros), como também a sua origem (doméstica ou externa).
Conquanto comum, intuitivamente, a ideia de que a melhor fonte seria, sempre, a de recursos próprios (dos sócios), isso costuma não ser verdade, seja em face do timing inerente aos processos decisórios (usualmente mais longo nas sociedades por ações), seja em função de condições mais favoráveis de mercado ou da legislação aplicável, dentre outros fatores.
Assim, na busca dos melhores retornos os gestores financeiros são, frequentemente, levados a incluir na estrutura de capital da empresa uma proporção maior de dívidas, ponderando não só o tempo necessário à obtenção dos recursos, como o fato de os custos poderem ser, em muitos casos, inferiores ao do capital próprio em função, por exemplo, da possibilidade de dedução fiscal dos juros pagos, que pode levar a uma economia equivalente ao imposto de renda correspondente.
Portanto, notadamente nos casos em que o tempo constitui um fator crucial no âmbito das decisões de natureza financeira, a capacidade e velocidade de resposta do mercado financeiro tendem a se tornar um fator altamente relevante na gestão empresarial.
Nesse sentido, merece destaque o grau de abertura alcançado pelo País no âmbito dos capitais estrangeiros e do mercado de câmbio, cujos principais mecanismos, fundados nas Leis 4.131/62 e 4.595/64 e numa extensa base regulatória do Conselho Monetário Nacional (CMN) e do Banco Central do Brasil (BCB), viabilizam, atualmente, um acesso bastante amplo e rápido a recursos externos por parte de empresas locais.
Com efeito, e embora muitos ainda não saibam, o Brasil oferece, hoje, um nível elevado de acesso ao mercado cambial, traduzido, por exemplo, pelo artigo 8º da Resolução 3.568, de 29/5/2008, do CMN, segundo o qual “as pessoas físicas e as pessoas jurídicas podem comprar e vender moeda estrangeira ou realizar transferências internacionais em reais, de qualquer natureza, sem limitação de valor”, sendo-lhes exigido, apenas, que o façam por meio de agente autorizado pelo BCB e que sejam observadas a legalidade e a fundamentação econômica da transação, assim como assumidas “as responsabilidades definidas na respectiva documentação”.
Por sua vez, o aparato regulatório dos capitais estrangeiros, também vinculado às duas citadas leis, trouxe, a partir de 1996, um sistema declaratório eletrônico (RDE) que, substituindo o antigo sistema “cartorial” de registro, no BCB, de operações financeiras com o exterior, reduziu drasticamente, nessa área, o risco operacional inerente à implementação das decisões empresariais.
Desta forma, o acesso aos empréstimos externos, seja sob a modalidade direta (contratação entre o tomador brasileiro e o credor externo), seja por meio de colocação de títulos no exterior (bônus, notes, commercial papers, etc.), assim como aos investimentos estrangeiros diretos (IED), dentre outras modalidades, não mais se sujeita à burocracia estatal que marcou, por longo tempo, a regulamentação cambial brasileira.
Assim, o ambiente de relativa neutralidade, em termos de tempo e risco, ora propiciado pelas normas aplicáveis a câmbio e capitais estrangeiros, trouxe, claramente, maior tranquilidade aos gestores financeiros na análise das operações.
Nada obstante, cumpre lembrar que o financiamento com linhas de crédito externas (Lei 4.131/62), cujos custo e perfil são geralmente mais atraentes que as correspondentes nacionais, coloca em foco, por sua vez, as questões da flutuação e da volatilidade cambial, inescapáveis no processo de planejamento financeiro, notadamente para empresas que não disponham de ativos em moeda estrangeira que possam servir (como é usual entre as exportadoras) como mecanismo de proteção cambial (“hedge natural”). Nesse caso, a saída mais usual é a busca de proteção no mercado de derivativos.
Isso não dispensa, evidentemente, tanto o acompanhamento contínuo das tendências do mercado de câmbio, como a manutenção de um controle permanente e rigoroso sobre sua “posição em divisas”, a ser registrada em demonstrativo específico (consistente e coincidente com os valores contidos no balanço patrimonial) que contemple rubricas como dívidas e créditos em moeda estrangeira, vencimentos, saldos a cobrir, etc.
Autores: José Luiz Conrado Vieira é doutor e mestre em Direito Econômico (USP), professor do Insper Direito e consultor em Capitais Internacionais.
Angelo Corsetti é professor do Insper Direito e consultor em Finanças Corporativas.