Anotações sobre responsabilidade no Novo Código Civil.

Jonny Maikel dos Santos

Juiz de Direito (Bahia). Ex-professor substituto da UFRN. Ex-Coordenador Jurídico, Supervisor Jurídico e Advogado da Caixa Econômica Federal. Ex-Procurador do Município e Advogado no Estado do RN.

Sumário: 1 – Introdução. 2 – Da responsabilidade subjetiva – Regra no Novo Código Civil. 3- Responsabilidade objetiva – linhas gerais. 4- Responsabilidade objetiva no NCC e os contratos aleatórios. 5- Acidente do trabalho e responsabilidade objetiva. 6 – O art. 945 do NCC, a teoria da causalidade adequada e a responsabilização objetiva. 7- Pensão mensal ou indenização de uma só vez. 8- Abuso de direito e os limites do art. 1.228, § 2º, do Novo Código Civil. 9- Incapaz e responsabilidade. 10- Interpretação restritiva do art. 931 do NCC. 11 – O empregador e o comitente e o agir regressivamente contra o empregado ou preposto. 12- Juízo criminal e juízo cível. 13- Os limites do art. 944 do NCC. 14- Cônjuge declarado culpado e a alteração do regime de bens. 15- Redução dos prazos prescricionais e validade e efeitos dos négocios e atos jurídicos. 16- Conclusão.

1 – INTRODUÇÃO.

Atualmente o estudioso do direito deve se preparar para uma mudança nas relações jurídicas, pois apesar de alguns falarem sobre tímidos avanços do Novo Código qualquer estudo um pouco mais aprofundado pode demonstrar que os conceitos vagos, abertos e indeterminados na nova legislação contribuem para o avanço do direito.

O novo Código Civil evoluiu acolhendo em contraposição ao CC de 1.916 conceitos como a função social da propriedade e do contrato, solidarismo social, boa-fé objetiva, eticidade, dignidade da pessoa humana; e, especificamente no campo da responsabilidade, teoria do risco, responsabilidade objetiva e aumento do rol dos responsáveis pela reparação de danos.

Neste resumo, não tenho a mínima pretensão de esgotar a matéria, mas apenas contribuir com algumas poucas anotações sobre responsabilidade no NCC.
2 – DA RESPONSABILIDADE SUBJETIVA – REGRA NO NOVO CÓDIGO CIVIL.
Nos termos do caput do art. 927 do NCC de 2.002 aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo, sendo patente a responsabilidade subjetiva como regra do Código atual.
Assim, fica mantida, em regra, a necessidade da comprovação de culpa para que o lesado possa assegurar a condenação em juízo do causador do dano.
Para responsabilização do devedor, em regra, deve ser comprovada a ocorrência do dano, “a culpa em sentido amplo” e verificado o nexo de causalidade entre a ação ou omissão e o evento danoso.
Não pretendo discorrer sobre tão debatida responsabilidade, e, portanto, passo, desde logo, a outros pontos tratados pelo novo Código Civil.
3 – RESPONSABILIDADE OBJETIVA – LINHAS GERAIS.
Ensina o Código Civil de 2.002, no parágrafo único do artigo 927, que haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, na linha da responsabilidade objetiva:
a) nos casos especificados em lei; ou,
b) quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.
Vale dizer, ainda que, nos termos do “art. 187: a responsabilidade civil decorrente do abuso do direito independe de culpa, e fundamenta-se somente no critério objetivo-finalístico (37º. – Enunciado aprovado na Jornada de Direito Civil promovida pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal).
Quanto à primeira situação do parágrafo único do art. 927 do NCC basta ao interprete procurar os casos de responsabilidade objetiva na legislação extravagante infraconstitucional ou na Constituição, como, por exemplo, o Código de Defesa do Consumidor (Lei no. 8.078/90), Responsabilidade Civil das Estradas de Ferro, (Decreto 2.681/1912), Responsabilidade Civil por danos nucleares (Lei nº 6.453, de 17 de outubro de 1977 e Decreto 911/19993), Responsabilidade Civil do Estado nos limites do art. 37, §6º da CF/88, etc…
Por exemplo, nos termos do CDC o fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos (art. 12); e, por outro plano, o fornecedor de serviços também responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos (art. 14), porém a responsabilidade pessoal dos profissionais liberais ( médicos, por exemplo) será apurada mediante a verificação de culpa (§ 4° do art. 14).
Ressalto, segundo o STJ, que a atividade profissional desenvolvida por advogado não caracteriza relação de consumo, pois além de ser regida por uma norma específica (Lei 8.906/94), não é uma atividade fornecida no mercado de consumo, assim não incide o Código de Defesa do Consumidor (CDC) nas ações que tratam de trabalho advocatício (STJ, RESP 532377, julgado em 21/08/2003).
Também, exemplificativamente, será exclusiva do operador da instalação nuclear, nos termos da Lei n o. 6.453/77, independentemente da existência de culpa, a responsabilidade civil pela reparação de dano nuclear causado por acidente nuclear: I – ocorrido na instalação nuclear; Il – provocado por material nuclear procedente de instalação nuclear, quando o acidente ocorrer: a) antes que o operador da instalação nuclear a que se destina tenha assumido, por contrato escrito, a responsabilidade por acidentes nucleares causados pelo material; b) na falta de contrato, antes que o operador da outra instalação nuclear haja assumido efetivamente o encargo do material; III – provocado por material nuclear enviado à instalação nuclear, quando o acidente ocorrer: a) depois que a responsabilidade por acidente provocado pelo material lhe houver sido transferida, por contrato escrito, pelo operador da outra instalação nuclear; b) na falta de contrato, depois que o operador da instalação nuclear houver assumido efetivamente o encargo do material a ele enviado.
Quanto à segunda hipótese (do parágrafo único do art. 927 do NCC) deverá o interprete verificar obrigatoriamente os seguintes aspectos para aplicação da responsabilidade objetiva, ficando muito atento aos conceitos abertos:
1º) quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, em risco para os direitos de outrem, e, ainda, “causar a pessoa determinada um ônus maior do que aos demais membros da coletividade (38º. – Enunciado aprovado pelo CJF), como, por exemplo, nos casos de fabricação e comercialização de fogos de artifício, mineradoras, transporte rodoviário de produtos inflamáveis ou tóxicos; e,
2º.) o risco-proveito (e não o risco criado (1) ou o amplo risco integral), ou seja, o risco capaz de angariar um proveito real e concreto, de natureza econômica ou com finalidade lucrativa ou pecuniária, pois conforme ensina ALVINO LIMA: “a teoria do risco não se justifica desde que não haja proveito para o agente causador do dano, porquanto, se o proveito é a razão de ser justificativa de arcar o agente com os riscos, na sua ausência deixa de ter fundamento a teoria” (LIMA, Alvino. Culpa e Risco. 2. ed. São Paulo: RT, 1999, pág. 198) (no mesmo sentido: GAGLIANO, Pablo Stolze e PAMPLONA FILHO, Rodolfo, in Novo Curso de Direito Civil, 3. ed., São Paulo: Saraiva, 2002).

Ora, por exemplo, o ato de dirigir por rodovias nacionais na qualidade de simples motorista ou taxista com proveito econômico, por si só, não possibilita a aplicação da segunda parte do parágrafo único do art. 927 do NCC, porém, por outro vértice, o mesmo condutor referido, transportando produtos tóxicos ou inflamáveis, pode responder objetivamente por eventual dano causado a outrem, mesmo obedecendo todas as regras de segurança, pois, nesta hipótese, pode o autor do dano na condução do veículo causar ao lesado, em decorrência da sua atividade, um ônus maior do que aos demais membros da coletividade.

Ressalto que “a responsabilidade fundada no risco da atividade, como prevista na segunda parte do parágrafo único do art. 927 do novo Código Civil, configura-se quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano causar a pessoa determinada um ônus maior do que aos demais membros da coletividade (38º. – Enunciado aprovado pelo CJF).

4 – RESPONSABILIDADE OBJETIVA NO NCC E OS CONTRATOS ALEATÓRIOS.
O contrato é aleatório:
a) por dizer respeito a coisas ou fatos futuros, cujo risco de não virem a existir um dos contratantes assuma, terá o outro direito de receber integralmente o que lhe foi prometido, desde que de sua parte não tenha havido dolo ou culpa, ainda que nada do avençado venha a existir; ou,
b) por ser objeto dele coisas futuras, tomando o adquirente a si o risco de virem a existir em qualquer quantidade, terá também direito o alienante a todo o preço, desde que de sua parte não tiver concorrido culpa, ainda que a coisa venha a existir em quantidade inferior à esperada (mas, se da coisa nada vier a existir, alienação não haverá, e o alienante restituirá o preço recebido); ou,
c) por se referir a coisas existentes, mas expostas a risco, assumido pelo adquirente, terá igualmente direito o alienante a todo o preço, posto que a coisa já não existisse, em parte, ou de todo, no dia do contrato (e a alienação aleatória poderá ser anulada como dolosa pelo prejudicado, se provar que o outro contratante não ignorava a consumação do risco, a que no contrato se considerava exposta a coisa).
Em alguns casos especialíssimos, mesmo quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem, como, por exemplo, nos casos de contratos aleatórios não será possível à aplicação da segunda parte do parágrafo único do art. 927 do Novo Código Civil, pois o próprio contratante assume o risco, devendo ser aplicado o princípio constitucional da razoabilidade e afastada a regra da responsabilidade objetiva.
Os negócios jurídicos aleatórios legítimos nos quais os contratantes têm plena ciência dos perigos da contratação, nos termos da legislação em vigor, como, por exemplo, nos contratos de fundos de investimentos, não estão cobertos pela proteção da segunda parte do parágrafo único do art. 927 do Novo Código Civil, ou seja, não estão protegidos pela responsabilidade objetiva, mas sim pela subjetiva.
5 – ACIDENTE DO TRABALHO E RESPONSABILIDADE OBJETIVA.

As obrigações ressarcitórias decorrentes de acidente de trabalho abrangem: 1º) as prestações acidentárias (cabendo a “Previdência Social/INSS” ressarcir o acidentado ou seus dependentes segundo os ditames da responsabilidade objetiva); e, 2º) as decorrentes do direito comum, ou seja, responsabilização civil por dano, com ônus para o empregador, nos casos de dolo ou culpa, nos termos do art. 7°, XXVIII, da Constituição Federal (agora, após, o NCC, com responsabilização em regra subjetiva).

Numa interpretação progressista, quanto as obrigações ressarcitórias decorrentes do direito comum verifico possibilidade de aplicação, em casos devidamente fundamentados, da responsabilização objetiva do empregador à luz do NCC.

Antes da Constituição de 1988 o STF exigia para indenização do direito comum a comprovação de dolo ou culpa grave do empregador, veja-se:

“A indenização acidentaria não exclui a do direito comum, em caso de dolo ou culpa grave do empregador” (Súmula 229 decisão 16/12/1963, publicação sudin vol:00001-01 pg:00110 texto).

Porém, após a vigência da CF/88 passaram os tribunais a exigir a comprovação de qualquer gradação de culpa (2) para indenização do direito comum.

E, atualmente, sabendo que, o disposto no art. 7º. XXVIII da Carta Magna (“seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa”) constituiu apenas direito mínimo do trabalhador à luz do disposto na parte final do caput do art. 7º do CF, pode ser aplicada à regra do art. 927, parágrafo único, segunda parte do NCC. Veja-se:

“Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:” (Constituição Federal art. 7º – caput).

Assim, pode ser aplicada a responsabilização objetiva, por exemplo, nos casos de acidente do trabalho causador de pneumoconiose ao empregado (pneumopatia devida à inalação de pó ou poeira, e da qual existem várias formas, segundo o tipo de material inalado – berilo, asbesto, carvão, etc) em decorrência, por exemplo, de atividade normalmente desenvolvida em mineiro de susboslo, sem necessidade de investigar a precariedade do ambiente de trabalho, típico dos subsolos das minas de carvão, garantindo indenização a título de dano moral e pensão vitalícia ou pagamento desta indenização de uma só vez (- parágrafo único do art. 950 do NCC), independentemente de verificação de culpa.
6 – O ART. 945 DO NCC, A TEORIA DA CAUSALIDADE ADEQUADA E A RESPONSABILIZAÇÃO OBJETIVA.
O art. 945 do novo Código Civil não encontra correspondência no Código de 1.916, entretanto o judiciário já verificava casos de culpa concorrente da vítima.
Prescreve o art. 945 do NCC:
“ Art. 945. Se a vítima tiver concorrido culposamente para o evento danoso, a sua indenização será fixada tendo-se em conta a gravidade de sua culpa em confronto com a do autor do dano.”
Pode a vítima concorrer para o evento danoso e a sua indenização será fixada tendo-se em conta a gravidade de sua culpa em confronto com a do autor do dano, porém nem toda participação do lesado acarretará culpa concorrente com diminuição da indenização, podendo ser aplicada a teoria da causalidade adequada.
O art. 563 do Código Civil Português consagra a teoria da causalidade adequada, devendo adotar-se a sua formulação negativa segundo a qual a condição deixará de ser causa do dano sempre que seja de todo indiferente para a produção do dano ou só se tenha tornado condição dele, em virtude de outras circunstâncias extraordinárias.
“O art. 945 do Código Civil, que não encontra correspondente no Código Civil de 1916, não exclui a aplicação da teoria da causalidade adequada. (47º – Enunciado aprovado na Jornada de Direito Civil promovida pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal).
Ensina o Supremo Tribunal Administrativo de Portugal:
“DESCRITORES: ACÇÃO DE RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL. RESPONSABILIDADE POR INFORMAÇÕES ORAIS. NEXO DE CAUSALIDADE.
CONHECIMENTO DO MÉRITO.
DESPACHO SANEADOR.
“I – Só pode conhecer-se do mérito da causa no despacho saneador quando for de afastar absolutamente a possibilidade de a produção da prova poder alterar os elementos de facto relevantes para a decisão.
II – A responsabilidade civil extracontratual das autarquias locais por factos ilícitos praticados pelos seus órgãos ou agentes assenta nos pressupostos da idêntica responsabilidade prevista na lei civil, que são o facto, a ilicitude, a imputação do facto ao lesante, o prejuízo ou dano, e o nexo de causalidade entre este e o facto.

III – O art. 563.º do Código Civil, consagra a teoria da causalidade adequada, devendo adoptar-se a sua formulação negativa correspondente aos ensinamentos de Ennecerus-Lehmann, segundo a qual a condição deixará de ser causa do dano sempre que seja de todo indiferente para a produção do dano e só se tenha tornado condição dele, em virtude de outras circunstâncias extraordinárias.
IV – A emissão de horários de funcionamento de uma discoteca e a prestação de uma informação verbal sobre a desnecessidade de licenciamento, levadas a cabo por um órgão de uma câmara municipal com competência nessa matéria, são actos idóneos a gerarem no particular que pretende explorar aquele estabelecimento, a convicção de esse licenciamento não era necessário e relevarem para a formação da sua decisão de contratar essa exploração e efectuar obras com o mesmo fim.

V – Embora o art. 7.º, n.º 2, do C.P.A. estabeleça que «a Administração Pública é responsável pelas informações prestadas por escrito aos particulares», deve entender-se que, atribuindo a lei aos seus órgãos o dever jurídico de informar no âmbito das suas funções administrativas [alínea a) do n.º 1 do mesmo artigo], a Administração é responsável por informações dadas por esses órgãos por qualquer forma, inclusivamente as prestadas oralmente, como decorre do preceituado no art. 22.º da C.R.P., devendo considerar-se materialmente inconstitucional aquele n.º 2 do art. 7.º se for interpretado como excluindo a responsabilidade da Administração relativamente a informações não escritas dadas por esses órgãos no âmbito dessas funções.

VI – O facto de ter sido a interessada e não a câmara municipal a decidir a redução do período de funcionamento e, depois, o seu encerramento da discoteca, por ser incerta a sua situação quanto a licenciamento, não basta para concluir que não possa haver nexo de causalidade adequada entre os actos imputados àquela câmara municipal e os danos provenientes daquela redução e encerramento, pois o nexo de causalidade adequada não é excluído quando o facto praticado pelo lesado pode ser considerado um efeito adequado do facto do lesante” (Processo : 01875/02, Lisboa, 7 de Maio de 2003.
Jorge de Sousa – Relator – Costa Reis – Isabel Jovita, Supremo Tribunal Administrativo).
Vale dizer que o STF nos casos de responsabilidade civil do Estado já preferiu aplicar quanto ao nexo de causalidade a teoria do dano direto e imediato, também denominada teoria da interrupção do nexo causal, afastando as teorias da equivalência das condições e a da causalidade adequada.
Sobre o tema, antes do novo Código Civil, decidiu o STF:
Ementa: Responsabilidade civil do Estado. Dano decorrente de assalto por quadrilha de que fazia parte preso foragido vários meses antes. – A responsabilidade do Estado, embora objetiva por forca do disposto no artigo 107 da Emenda Constitucional n. 1/69 (e, atualmente, no § 6. do artigo 37 da Carta Magna), não dispensa, obviamente, o requisito, também objetivo, do nexo de causalidade entre a ação ou a omissão atribuída a seus agentes e o dano causado a terceiros. – Em nosso sistema jurídico, como resulta do disposto no artigo 1.060 do Código Civil, a teoria adotada quanto ao nexo de causalidade e a teoria do dano direto e imediato, também denominada teoria da interrupção do nexo causal. Não obstante aquele dispositivo da codificação civil diga respeito a impropriamente denominada responsabilidade contratual, aplica-se ele também a responsabilidade extracontratual, inclusive a objetiva, até por ser aquela que, sem quaisquer considerações de ordem subjetiva, afasta os inconvenientes das outras duas teorias existentes: a da equivalência das condições e a da causalidade adequada. – No caso, em face dos fatos tidos como certos pelo acórdão recorrido, e com base nos quais reconheceu ele o nexo de causalidade indispensável para o reconhecimento da responsabilidade objetiva constitucional, e inequívoco que o nexo de causalidade inexiste, e, portanto, não pode haver a incidência da responsabilidade prevista no artigo 107 da Emenda Constitucional n. 1/69, a que corresponde o § 6. do artigo 37 da atual Constituição. Com efeito, o dano decorrente do assalto por uma quadrilha de que participava um dos evadidos da prisão não foi o efeito necessário da omissão da autoridade publica que o acórdão recorrido teve como causa da fuga dele, mas resultou de conclusas, como a formação da quadrilha, e o assalto ocorrido cerca de vinte e um meses apos a evasão. Recurso extraordinário conhecido e provido (RE 130764 / PR-,RECURSOEXTRAORDINÁRIO,Relator(a): Min.MOREIRA ALVES,12/05/1992, Órgão Julgador: PRIMEIRATURMA, Publicação: DJ DATA-07-08-92 PP-11782 EMENT VOL-01669-02 PP-00350 RTJ VOL-00143-01 PP-00270).

Vale notar que, a culpa concorrente da vítima permite a redução da condenação imposta ao agressor mesmo nos casos de responsabilização objetiva, nesse sentido:

“EMENTA: CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. Responsabilidade do fornecedor.
Culpa concorrente da vítima. Hotel. Piscina. Agência de viagens.
– Responsabilidade do hotel, que não sinaliza convenientemente a profundidade da piscina, de acesso livre aos hóspedes. Art. 14 do CDC.
– A culpa concorrente da vítima permite a redução da condenação imposta ao fornecedor . Art. 12, § 2º, III, do CDC.
– A agência de viagens responde pelo dano pessoal que decorreu do mau serviço do hotel contratado por ela para a hospedagem durante o pacote de turismo.
Recursos conhecidos e providos em parte. RESP 287849 / SP ; RECURSO ESPECIAL 2000/0119421-6 DJ DATA:13/08/2001 PG:00165,RDRVOL.:00021,PG:00392,RSTJ VOL.:00154 PG:00463, RT VOL.:00797 PG:00226 Min. RUY ROSADO DE AGUIAR).
7 – PENSÃO MENSAL OU INDENIZAÇÃO DE UMA SÓ VEZ.
Algumas vezes, sob a égide do CC de 1.916, os réus sustentavam, em preliminar, a impossibilidade do pedido do autor de indenização de uma só vez, dizendo que o ordenamento jurídico somente assegurava pensão mensal correspondente a lesão; e, nessa linha, o devedor não poderia ser compelido a pagar todo o devido de uma só vez, quando poderia pagar em parcelas e de modo menos gravoso.
Agora, não restam dúvidas sobre o pedido de indenização de uma só vez, pois “o parágrafo único do art. 950 do novo Código Civil institui direito potestativo do lesado para exigir pagamento da indenização de uma só vez, mediante arbitramento do valor pelo juiz, atendidos os arts. 944 e 945 e a possibilidade econômica do ofensor. (48º – Enunciado aprovado pelo CJF).
O art. 950 do NCC prescreve que se da ofensa resultar defeito pelo qual o ofendido não possa exercer o seu ofício ou profissão, ou se lhe diminua a capacidade de trabalho, a indenização, além das despesas do tratamento e lucros cessantes até ao fim da convalescença, incluirá pensão correspondente à importância do trabalho para que se inabilitou, ou da depreciação que ele sofreu.
E, o prejudicado, se preferir, poderá exigir que a indenização seja arbitrada e paga de uma só vez.
8 – ABUSO DE DIREITO E OS LIMITES DO ART. 1.228, § 2º, DO NOVO CÓDIGO CIVIL.
Prescreve o art. 1.228 do NCC:
“ Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha.
§ 1o O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas.
§ 2o São defesos os atos que não trazem ao proprietário qualquer comodidade, ou utilidade, e sejam animados pela intenção de prejudicar outrem.
No NCC o abuso de direito é tido como ato ilícito.
Ensina o art. 187 do novo Código Civil que comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.
E, deve o julgador, agir com prudência, quanto interpretar, no caso concreto o conceito aberto do que seja “exceder manifestamente” os limites de um direito, principalmente quando aplicar a regra do art. 1.228, § 2º, NCC.
Assim, “a regra do art. 1.228, § 2º, do novo Código Civil interpreta-se restritivamente, em harmonia com o princípio da função social da propriedade e com o disposto no art. 187. (49º. – Enunciado aprovado na Jornada de Direito Civil promovida pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal).
Como já dito acima, a responsabilidade civil decorrente do abuso do direito independe de culpa, e fundamenta-se somente no critério objetivo-finalístico.
9 – INCAPAZ E RESPONSABILIDADE.
Nota-se inovação com relação à responsabilização do próprio incapaz por danos causados a terceiros, ampliando o rol dos responsáveis civis.
O incapaz passa a responder com seu próprio patrimônio pelos prejuízos que causar, se as pessoas por ele responsáveis não tiverem obrigação de fazê-lo (vg. nos casos de ato infracional com reflexos patromoniais, nos termos do art. 116 da Lei n o. 8.069/90 – ECA) ou não dispuserem de meios suficientes. A indenização nestes casos, que deverá ser eqüitativa não terá lugar se privar do necessário o incapaz ou as pessoas que dele dependem.
“A impossibilidade de privação do necessário à pessoa, prevista no art. 928, traduz um dever de indenização eqüitativa, informado pelo princípio constitucional da proteção à dignidade da pessoa humana. Como conseqüência, também os pais, tutores e curadores serão beneficiados pelo limite humanitário do dever de indenizar, de modo que a passagem ao patrimônio do incapaz se dará não quando esgotados todos os recursos do responsável, mas se reduzidos estes ao montante necessário à manutenção de sua dignidade. (39º. – Enunciado aprovado na Jornada de Direito Civil promovida pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal).
“O incapaz responde pelos prejuízos que causar de maneira subsidiária ou excepcionalmente, como devedor principal, na hipótese do ressarcimento devido pelos adolescentes que praticarem atos infracionais, nos termos do art. 116 do Estatuto da Criança e do Adolescente, no âmbito das medidas sócioeducativas ali previstas. (40º. -Enunciado aprovado pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal).
São também responsáveis pela reparação civil: os pais, pelos filhos “menores” (tecnicamente crianças ou adolescentes) que estiverem sob sua autoridade e em sua companhia; e, o tutor e o curador, pelos pupilos e curatelados, que se acharem nas mesmas condições.
“A única hipótese em que poderá haver responsabilidade solidária do menor de 18 anos com seus pais é ter sido emancipado nos termos do art. 5º, parágrafo único, inc. I, do novo Código Civil. (41º -Enunciado do CJF).
10 – INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA DO ART. 931 DO NCC.
O art. 931 do NCC deve ser interpretado restritivamente e somente nas relações de consumo, sob pena de lesão a regra do art. 927 do mesmo diploma, apesar de ampliar o conceito de fato do produto existente no art. 12 do CDC.
Prescreve o art. 931 do NCC:
“Art. 931. Ressalvados outros casos previstos em lei especial, os empresários individuais e as empresas respondem independentemente de culpa pelos danos causados pelos produtos postos em circulação”.
“O art. 931 amplia o conceito de fato do produto existente no art. 12 do Código de Defesa do Consumidor, imputando responsabilidade civil à empresa e aos empresários individuais vinculados à circulação dos produtos. (42º – Enunciado aprovado pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal).
Vale dizer, que “a responsabilidade civil pelo fato do produto, prevista no art. 931 do novo Código Civil, também inclui os riscos do desenvolvimento. (43º. -Enunciado aprovado pelo CJF).
11 – O EMPREGADOR E O COMITENTE E O AGIR REGRESSIVAMENTE CONTRA O EMPREGADO OU PREPOSTO.
Nos termos do art. 934 do NCC aquele que ressarcir o dano causado por outrem pode reaver o que houver pago daquele por quem pagou, salvo se o causador do dano for descendente seu, absoluta ou relativamente incapaz.
E, “na hipótese do art. 934, o empregador e o comitente somente poderão agir regressivamente contra o empregado ou preposto se estes tiverem causado dano com dolo ou culpa. (44º – Enunciado aprovado CJF).
São também responsáveis pela reparação civil: o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele; e, ainda que não haja culpa de sua parte, responderão pelos atos praticados pelo terceiro; e, nas mesmas condições, os donos de hotéis, hospedarias, casas ou estabelecimentos onde se albergue por dinheiro, mesmo para fins de educação, pelos seus hóspedes, moradores e educandos.

Ressalto que, os donos de hotéis, hospedarias, casas ou estabelecimentos onde se albergue por dinheiro podem ser responsabilizados por danos causados pelos seus hóspedes, moradores e educandos, assim, também, neste ponto, verifico ampliação do rol dos responsáveis civis em relação a norma anterior.
12 – JUÍZO CRIMINAL E JUÍZO CÍVEL.
Ensina o art. 935 do Novo Código Civil que a responsabilidade civil é independente da criminal, não se podendo questionar mais sobre a existência do fato, ou sobre quem seja o seu autor, quando estas questões se acharem decididas no juízo criminal.
“No caso do art. 935, não mais se poderá questionar sobre a existência do fato ou sobre quem seja o seu autor se essas questões se acharem categoricamente decididas no juízo criminal. (45º.Enunciado aprovados na Jornada de Direito Civil promovida pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal, sob a coordenação científica do Ministro Ruy Rosado, do STJ).

É também responsável pela reparação civil o que gratuitamente houver participado no produto do crime, até a concorrente quantia, e, ainda, que não haja culpa de sua parte, responderá pelos atos praticados pelo terceiro.
13 – OS LIMITES DO ART. 944 DO NCC.
A possibilidade de redução do montante da indenização em face do grau de culpa do agente, estabelecida no parágrafo único do art. 944 do novo Código Civil não se aplica às hipóteses de responsabilidade objetiva.
Prescreve o art. 944 do NCC:
“Art. 944. A indenização mede-se pela extensão do dano.
Parágrafo único. Se houver excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o dano, poderá o juiz reduzir, eqüitativamente, a indenização”.
“A possibilidade de redução do montante da indenização em face do grau de culpa do agente, estabelecida no parágrafo único do art. 944 do novo Código Civil, deve ser interpretada restritivamente, por representar uma exceção ao princípio da reparação integral do dano, não se aplicando às hipóteses de responsabilidade objetiva. (46º – Enunciado aprovado na Jornada de Direito Civil promovida pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal).
Creio que, com o prudente arbítrio do julgador, nos casos de reparação de danos causados aos direitos de personalidade para fins de reparação econômica de “danos morais’” pode o julgador tentar aplicar a regra estabelecida no parágrafo único do art. 944 do novo Código Civil.
Nesta linha, o Projeto de Lei n. 6960/02, que altera dispositivos do Novo Código Civil, acrescenta um segundo parágrafo ao art. 944, esclarecendo; e, também, complementando a amplitude buscada pelo legislador, veja-se: “§ 2°. A reparação do dano moral deve constituir-se em compensação ao lesado e adequado desestímulo ao lesante”.
14 – CÔNJUGE DECLARADO CULPADO E A ALTERAÇÃO DO REGIME DE BENS.

Em regra, se um dos cônjuges separados judicialmente vier a necessitar de alimentos, será o outro obrigado a prestá-los mediante pensão a ser fixada pelo juiz, caso não tenha sido declarado culpado na ação de separação judicial.

Porém, o parágrafo único do art. 1.704 do NCC, dissociando culpa da responsabilidade de prestar alimentos, esclarece que se o cônjuge declarado culpado vier a necessitar de alimentos, e não tiver parentes em condições de prestá-los, nem aptidão para o trabalho, o outro cônjuge será obrigado a assegurá-los, fixando o juiz o valor indispensável à sobrevivência, ou seja, a novidade trazida pelo Código atual, apesar de aparente ofensa ao senso ético, impõe, lastreada no dever humanitário de assistência mútua e na dignidade da pessoa humana, em casos excepcionais, que o “cônjuge traído” possa ser obrigado a prestar alimentos ao “cônjuge infiel”.

Por outro ponto, quanto à modificação do regime de bens, para evitar prejuízos aos direitos de terceiros; e, também, para prevenção de responsabilização futura de quaisquer dos cônjuges, a alteração do regime de bens deve ser realizada de maneira formal.

Nos termos do art. 1.639, § 2º do NCC é lícito aos nubentes, antes de celebrado o casamento, estipular, quanto aos seus bens, o que lhes aprouver, sendo admissível alteração do regime de bens, mediante autorização judicial em pedido motivado de ambos os cônjuges, apurada a procedência das razões invocadas e ressalvados os direitos de terceiros.

O art. 1.639, § 2º do NCC não explica por qual meio deve ser procedida alteração do regime de bens e, portanto, devem os Tribunais expedir provimentos orientando os julgadores.

No Estado da Bahia o tema foi tratado por meio do Provimento da Corregedoria Geral da Justiça n º 002/2003 de 21 de julho de 2.003 uniformizando a modificação de regime de bens para que não haja prejuízo ao princípio da segurança jurídica, exigindo pedido motivado de ambos os cônjuges, em procedimento de jurisdição voluntária, devendo o Juízo competente publicar edital com prazo de 30 (trinta) dias, a fim de imprimir a devida publicidade à mudança, visando resguardar direitos de terceiros com intervenção do Ministério Público para a validade da mudança; e, após o trânsito em julgado da sentença, devem ser expedidos mandados de averbação aos Cartórios de Registro Civil e de Imóveis, e caso qualquer dos cônjuges seja empresário, ao Registro de Empresas Mercantis (arts. 980, 979, 968 e 1.550 do NCC), valendo notar que a competência será da vara de família da respectiva comarca onde se processar a mudança (sobre o referido provimento vide: o livro “Provimentos Consolidados da Corregedoria Geral da Justiça do Estado da Bahia 2000-2003”, Volume II, , Salvador: TJ – IPRAJ, 2.003, pág. 113/114).

15 – REDUÇÃO DOS PRAZOS PRESCRICIONAIS E VALIDADE E EFEITOS DOS NÉGOCIOS E ATOS JURÍDICOS.

Para todos que lidam com a responsabilidade civil o tempo é fator importantíssimo e diante da redução dos prazos prescricionais deve o interprete verificar, neste momento de transição, o artigo 2.028 do CC de 2.002.

Nos termos do art. 2.028 do NCC serão os da lei anterior os prazos, quando reduzidos pelo Código de 2.002, e se, na data de sua entrada em vigor deste, já houver transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada.

Assim, “a partir da vigência do novo Código Civil, o prazo prescricional das ações de reparação de danos que não houver atingido a metade do tempo previsto no Código Civil de 1916 fluirá por inteiro, nos termos da nova lei (art. 206). (50º. – Enunciado aprovado na Jornada de Direito Civil promovida pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal).

WILSON DE SOUZA CAMPOS BATALHA, falando sobre o Código Civil Alemão, afirma que: “Se a lei nova reduz o prazo de prescrição ou decadência, há que se distinguir: a) se o prazo maior da lei antiga se escoar antes de findar o prazo menor estabelecido pela lei nova, adota-se o prazo estabelecido pela lei anterior; b) se o prazo menor da lei nova se consumar antes de terminado o prazo maior previsto pela anterior, aplica-se o prazo da lei nova, contando-se o prazo a partir da vigência desta”. (BATALHA, Wilson de Souza Campos, in Lei de Introdução ao Código Civil, citado por GAGLIANO, Pablo Stolze e PAMPLONA FILHO, Rodolfo, in Novo Curso de Direito Civil, 3º. ed., São Paulo: Saraiva, 2002, pág. 508).

No que diz respeito a validade dos negócios e demais atos jurídicos, constituídos antes da entrada em vigor do atual Código de 2.002, deve ser obedecido o disposto nas leis anteriores referidas no art. 2.045 do NCC, mas os efeitos, por força do art. 2.035 do Novo Código Civil, destes negócios e atos, produzidos após a vigência do Código Atual, serão regidos pelos preceitos da nova ordem jurídica, salvo se houver sido prevista pelas partes determinada forma de execução, e, ainda, nos termos do parágrafo único do art. 2.035, nenhuma convenção prevalecerá se contrariar preceitos de ordem pública, tais como os estabelecidos pelo Código vigente para assegurar a função social da propriedade e dos contratos.

Acontece que, apesar do avanço do art. 2.035 do NCC este dispositivo infraconstitucional é de constitucionalidade duvidosa por aparente ofensa aos princípios do direito adquirido e do ato jurídico perfeito.

Recentemente (Informativo nº 317 – Data: 27 de agosto de 2003), o STF, tratando de proteção aos princípios do direito adquirido e do ato jurídico perfeito no julgamento de Medida Cautelar em Ação Direta de Inconstitucionalidade versando sobre planos de saúde decidiu que:

“Planos Privados de Assistência à Saúde – 1:
Concluído o julgamento de medida liminar em ação direta ajuizada pela Confederação Nacional de Saúde – Hospitais, Estabelecimentos e Serviços, contra a Lei 9.656/98 e a Medida Provisória 1.730/98, que dispõem sobre os planos privados de assistência à saúde (v. Informativo 167). O Tribunal, num primeiro exame, não conheceu da ação quanto à alegada inconstitucionalidade formal do inteiro teor da Lei e da Medida Provisória impugnadas, tendo em vista as substanciais alterações nelas promovidas, nem quanto à alegada inconstitucionalidade formal de determinados dispositivos, em que se sustentava a necessidade de lei complementar para disciplinar as matérias relativas à autorização, fiscalização e funcionamento das empresas em questão, uma vez que, desde a edição da CF/88, os planos privados de saúde não integram o sistema financeiro nacional, mas sim as ações e serviços de saúde (Título VIII, Capítulo II, Seção II, da Constituição), não exigindo, assim, a reserva de lei complementar (CF, art. 197: “São de relevância pública as ações e serviços de saúde, cabendo ao Poder Público dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle, devendo sua execução ser feita diretamente ou através de terceiros e, também por pessoa física ou jurídica de direito privado”).
ADI 1.931-MC-DF, rel. Min. Maurício Corrêa, 21.8.2003. (ADI-1931)

Planos Privados de Assistência à Saúde – 2:
Prosseguindo no julgamento, o Tribunal afastou a alegada inconstitucionalidade material por ofensa aos princípios do devido processo legal substantivo e aos artigos 196 e 199 da CF, bem como pela alegada caracterização de desproporcional e desarrazoada intervenção estatal em área reservada à livre iniciativa, de determinados dispositivos das normas impugnadas — que, estabelecem, em síntese, a instituição do plano ou seguro de referência à saúde; a impossibilidade de exclusão de cobertura de lesões preexistentes, salvo nos primeiros 24 meses do contrato; a cobertura de número ilimitado de consultas médicas; a vedação à variação das contraprestações pecuniárias para os consumidores com mais de 60 anos de idade, participantes há mais de 10 anos; a obrigação de ofertar todos os benefícios previstos na Lei, e o ressarcimento ao Poder Público dos gastos feitos pelos participantes na rede pública de saúde — por considerar que os artigos impugnados, ao estabelecerem os limites de atuação das operadoras de planos privados de saúde, estão em harmonia com a competência do Estado prevista no art. 197 da CF.
ADI 1.931-MC-DF, rel. Min. Maurício Corrêa, 21.8.2003. (ADI-1931).

Planos Privados de Assistência à Saúde – 3:
No mesmo julgamento acima mencionado, o Tribunal não conheceu da ação quanto à alegação de inconstitucionalidade do art. 35, § 1º, da Lei 9.656/98 e do § 2º, acrescentado pela Medida Provisória 1.730/98, em que se sustentava a ofensa ao ato jurídico perfeito e ao direito adquirido (art. 5º, XXXVI), pela circunstância de que o referido dispositivo, retirado em uma das reedições da Medida Provisória — momento em que a autora da ação, ao proceder ao aditamento, suscitara o prejuízo da ação direta quanto à mencionada alegação —, fora reinserido em outra oportunidade, sem que a autora, no aditamento subseqüente, fizesse qualquer menção quanto ao retorno da situação anterior e reiterasse a declaração de inconstitucionalidade quanto ao mencionado artigo, carecendo a ação, no ponto, de pedido.
ADI 1.931-MC-DF, rel. Min. Maurício Corrêa, 21.8.2003. (ADI-1931)

Planos Privados de Assistência à Saúde – 4:
Prosseguindo no mesmo julgamento, o Tribunal, entendendo caracterizada a aparente ofensa ao direito adquirido e ao ato jurídico perfeito (CF, art. 5º, XXXVI), deferiu a cautelar para suspender a eficácia do art. 35-G, renumerado como 35-E pela Medida Provisória 2.177/2001, que estabelece a aplicação da Lei 9.656/98 a contratos celebrados anteriormente à data de sua vigência, ressaltando, no entanto, a possibilidade de incidência nos casos concretos do Código de Defesa do Consumidor ou de outras normas de proteção ao consumidor. No que concerne ao § 2º do art. 10 da mesma Lei — que trata da obrigatoriedade da oferta do plano de referência para todos os atuais e futuros consumidores —, o Tribunal, entendendo caracterizada num primeiro exame a inconstitucionalidade por ofensa ao direito adquirido e ao ato jurídico perfeito, conheceu em parte da ação para afastar a aplicação do mencionado dispositivo aos contratos aperfeiçoados até o dia 3/6/98 (anteriores à edição da Lei 9.656/98); aos contratos aperfeiçoados entre 4/6/98 e 1º/9/98 (ou seja, compreendidos entre a data de edição e a data de vigência da citada Lei), salientando, com relação ao segundo grupo, que, em face da vacatio legis, a norma somente tornou-se obrigatória na data de vigência; e aos contratos aperfeiçoados entre 8/12/98 e 2/12/99 (compreendidos entre a data da entrada em vigor da MP 1.730/98, que dilatou a obrigatoriedade da oferta do plano-referência para 3/12/99, e a data imediatamente anterior àquela fixada na citada MP), já que durante esse período o plano-referência deixara de ser obrigatório. Com relação aos contratos aperfeiçoados entre 2/9/98 e 7/12/98 (ou seja, compreendidos entre a data da vigência da Lei 9.656/98 e a data da edição da Medida Provisória 1.730/98), o Tribunal afastou a tese de inconstitucionalidade, uma vez que durante o mencionado período estiveram plenamente em vigor os preceitos da Lei 9.656/98, implicando a obrigatoriedade da oferta do plano-referência, o mesmo valendo para os contratos aperfeiçoados após 3/12/99.
ADI 1.931-MC-DF, rel. Min. Maurício Corrêa, 21.8.2003. (ADI-1931)

Planos Privados de Assistência à Saúde – 5:
Em suma, o Tribunal, por aparente ofensa ao direito adquirido e ao ato jurídico perfeito (CF, art. 5, XXXVI), deferiu em parte o pedido de medida cautelar para declarar a inconstitucionalidade da expressão “atuais e” constante do § 2º do art. 10 da Lei 9.656/98, com a redação dada pela Medida Provisória 1.908-18/99, delimitando, no entanto, a incidência da declaração aos contratos aperfeiçoados até o dia 3/6/98, e aos apefeiçoados entre 4/6/98 e 1º/9/98 e entre 8/12/98 e 2/12/99 (“art. 10. É instituído o plano-referência de assistência à saúde, com cobertura assistencial médico-ambulatorial e hospitalar, compreendendo partos e tratamentos, realizados exclusivamente no Brasil, com padrão de enfermaria, centro de terapia intensiva, ou similar, quando necessária a internação hospitalar, das doenças listadas na Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde, da Organização Mundial de Saúde, respeitadas as exigências mínimas estabelecidas no art. 12 desta Lei … § 2º As pessoas jurídicas que comercializam produtos de que tratam o inciso I e o § 1º do art. 1º desta Lei, oferecerão, obrigatoriamente, a partir de 3 de dezembro de 1999, o plano-referência de que trata este artigo a todos os seus atuais e futuros consumidores.”).
ADI 1.931-MC-DF, rel. Min. Maurício Corrêa, 21.8.2003. (ADI-1931)

Portanto, cabe ao Judiciário apreciar com cautela as disposições dos arts. 2.035 e 2.028 do NCC.

Alerto que, é dever do interprete começar a leitura do Novo Código Civil não pelo seu início, mas pelo livro complementar – das disposições finais e transitórias, sob pena de cometer injustiças e falhas graves, diante das ressalvas e minúcias estabelecidas nos arts. 2.028 a 2.046.

16 – CONCLUSÃO

A responsabilidade civil tratada no NCC manteve a tradição do antigo Código no que diz respeito à responsabilidade subjetiva, porém ampliou o rol dos responsáveis pelos danos causados, acolheu a teoria do risco e a responsabilidade objetiva.

Valer notar que, devido à presença conceitos vagos, abertos e indeterminados, com certeza, várias correntes surgirão para interpretar os caminhos da nova responsabilidade no direito civil brasileiro.

Creio que a tendência será a aplicação temperada da teoria do risco-proveito e da responsabilidade objetiva, sem o abandono da responsabilidade subjetiva, sendo inconcebível a aplicação da teoria do risco integral à luz da legislação vigente.

O Código ainda está em plena discussão e, por outro lado, já buscam sua reformulação, assim, devem ser estudados, desde logo, os Projetos de Lei n o. 7070 (Modifica os Artigos 1.158, 1.160, 1.163, 1.165, 1.166, 1.167 e 1.168 da Lei nº 10.406 de 11 de janeiro de 2002, que “institui o Código Civil”); e, n o. 6960 de 2.002 (Dá nova redação aos artigos 2º, 11, 12, 43, 66, 151,224, 243, 244,246, 262, 273,281,283, 286, 294,299, 300, 302, 306,309,328, 338,369, 421, 422, 423, 425, 429, 450, 456, 471, 472, 473, 474, 475, 478, 479, 480,482, 496,502, 506, 533, 549, 557, 558, 559, 563, 574,576, 596, 599, 602, 603, 607, 623, 624, 625, 633, 637, 642, 655, 765, 788, 790, 872, 927, 928,931, 944, 947, 949,950, 953, 954,966, 977,999, 1053, 1060, 1086, 1094, 1099, 1158, 1160, 1163, 1165, 1166, 1168, 1196, 1197, 1204, 1210, 1228, 1273, 1274, 1276, 1316, 1341, 1347, 1352, 1354, 1361, 1362, 1365, 1369, 1371, 1374, 1378, 1379, 1434, 1436, 1456, 1457,1473, 1479, 1481, 1512, 1515, 1516,1521, 1526, 1561, 1563, 1573, 1574, 1575, 1576, 1581, 1583, 1586, 1589, 1597, 1601, 1605, 1606, 1609, 1614, 1615, 1618, 1623, 1625, 1626, 1628, 1629, 1641, 1642, 1660, 1665, 1668, 1694, 1700, 1701, 1707, 1709, 1717, 1719, 1721, 1722, 1723, 1725, 1726, 1727, 1729, 1731, 1736, 1768, 1788, 1790, 1800, 1801, 1815, 1829, 1831, 1834, 1835, 1848, 1859, 1860, 1864, 1881, 1909, 1963, 1965, 2002, 2038 e 2045 da Lei nº. 10.406 de 10 de janeiro de 2002, que “Institui o Código Civil”, acrescenta dispositivos e dá outras providências).

Anoto que o norte da interpretação do Novo Código Civil já foi dado inicialmente pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal sob a coordenação científica do Ministro Ruy Rosado, do STJ, cabendo, aos advogados, representantes do Ministério Público, procuradores, defensores e demais integrantes das carreias jurídicas provocarem o Judiciário (no caso concreto) e os Doutrinadores para que as dúvidas possam ser dirimidas ou amenizadas.

Notas do texto:

(1) A teoria do risco criado dispensa a caracterização da finalidade lucrativa ou pecuniária da atividade desenvolvida.

(2) “EMENTA: ESPONSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE DO TRABALHO. INDENIZAÇÃO PELO DIREITO COMUM. “DOLO OU CULPA GRAVE” DO EMPREGADOR. INEXIGÊNCIA. CONCORRÊNCIA DE CULPAS. MATÉRIA DE PROVA. CORREÇÃO MONETÁRIA. TERMO INICIAL.
Acórdão que afasta a incidência da Súmula nº 229-STF, invocando fundamento constitucional. Aplicação da Súmula nº 126-STJ.
Entendimento, ademais, desta Corte, segundo o qual, a partir da edição da Lei nº 6.367/76, não mais prevalece o enunciado da Súmula nº 229-STF, bastando a culpa leve do empregador.
Alegação de ausência de culpa do empregador a depender do reexame do quadro probatório (Súmula nº 7-STJ).
“Incide a correção monetária sobre dívida por ato ilícito a partir da data do efetivo prejuízo.” (Súmula nº 43-STJ).
Recurso especial não conhecido(RESP89261/SP; RECURSO ESPECIAL
1996/0012015-3, DJ DATA:20/05/2002 PG:00142, Min. BARROS MONTEIRO).

Bahia, em agosto de 2.003.

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